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23/02/2023 às 08h00min - Atualizada em 23/02/2023 às 08h00min

Paus e pedras que restarão

IVONE ASSIS
Hoje, 23/02/2023, a Ucrânia completará o ciclo de 365 dias de defesa em prol da soberania daquela nação, cujo ataque foi iniciado pela Rússia aos 24/02/2022. Embora essa invasão militar some um ano de ofensiva, podemos considerar o início desta guerra como sendo 2014, quando a Rússia invadiu e anexou a Crimeia a si, alheio ao reconhecimento internacional. Voltemos na história, de início, a Crimeia pertencia aos antigos povos gregos, após muitas invasões, o Império Russo, em 1783, assumiu o seu poder, mas em 1954, o soviético Nikita Khrushchov, para estampilhar uma indissolúvel união amigável entre russos e ucranianos, transferiu a Crimeia para a Ucrânia (soberana em 1991). De lá para cá, é a discórdia que o mundo contemporâneo assiste.
Na obra “Vidas provisórias” (2013, p. 129), Edney Silvestre traz uma frase que diz: “Não quero mais viver uma vida provisória”, penso que a resistência da Ucrânia pode ser comparada a essa afirmação, afinal, todo projeto pede conclusão, porque o provisório gera insegurança e descontentamento.

Como escreveu João Guimarães Rosa, em Grande Sertão Veredas (1994, p. 140), “Medo maior que se tem, é de vir canoando num ribeirãozinho, e dar, sem espera, no corpo dum rio grande”. Foi mais ou menos o que aconteceu, a Ucrânia veio canoando num ribeirãozinho durante toda a Guerra Fria, mas, quando menos se esperava, deu num rio grande. Ainda amparada a Rosa (1994, p. 448), “O correr da vida embrulha tudo, a vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem”. Então, caindo no rio grande, o canoeiro da Ucrânia continuou a enfrentar as ondas bravias, formadas pelos ventos assoprados pela Rússia, na esperança de que uma hora o vento pare de assoprar, e que a canoa não se rompa em rochedos.

Afinal, a região da Bacia do Rio Donets, Donetsk e a região de Luhansk, é o que garante o acesso ao Mediterrâneo pelo Mar Negro, e isso é condição sine qua non para que a Rússia tenha alcance para além do seu entorno regional, no firme propósito de êxito militar em ofensivas e outras atividades. Esse acesso fortalece a resistência russa, todavia é possível atuar também por meio dos mares Cáspio, Vermelho e Mediterrâneo, nesse e outros acessos. O fato é que quanto mais curta a pernada, mais rápida e menos cansativa é a jornada, mas, neste caso, esse encurtamento tem enlameado de sangue muitas barbas, e sutiãs, e brinquedos... E onde está a glória nisso?

A resistência e a insistência dessa guerra têm criado desrazões humanas onde somente o poder político impera. Ainda há que se avaliar o quesito psicológico dessas nações, para os anos vindouros. Quanto mais se ganha tempo em uma guerra, mais se perde tempo na vida. Não há dúvidas sobre o aprendizado que essa ofensiva trouxe para as nações, em que se pese o poder político e o valor humano; e temo que o mar vermelho se torne ainda mais vermelho até que os lírios voltem a florir nos vales.

A Ucrânia já removeu cerca de 20 milhões de livros russos de suas bibliotecas, mas seria o livro a arma mais letal neste momento? Se for verdade a fala de Yevheniya Kravchuk, de que são autores apoiadores da Rússia contra a Ucrânia, onde estava esse mesmo Ministério da Cultura que não viu isso antes que tais livro entrassem em circulação?

Existe uma fala atribuída a Albert Einstein que diz: “Não sei como será a Terceira Guerra Mundial, mas poderei vos dizer como será a Quarta: com paus e pedras”, e quando observamos a atuação da Indústria 4.0 nessa “intriga” Rússia x Ucrânia, seja nos campos da guerra digital e da propaganda e comunicação, seja na ofensiva em campo, por meio de drones e outros, seja ainda nos bastidores daqueles que assistem e opinam, formando os grupos de apoio, com as promessas de envios de armas e com as ameaças de “não entre que fica pior”, e ainda tendo em mente a certeza da fragilidade e da ignorância humana, só nos resta acreditar nos paus e pedras que restarão.


*Este conteúdo é de responsabilidade do autor e não representa, necessariamente, a opinião do Diário de Uberlândia.
 
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