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29/10/2022 às 08h00min - Atualizada em 29/10/2022 às 08h00min

Tolos, Fraudes e Militantes

EDMAR PAZ JUNIOR
Há um detalhe, que talvez mais alguém tenha percebido – na verdade são muitos “detalhes” – que diz respeito ao pensamento propagado pela intelligentsia esquerda. Acredito que não se sustenta, não apenas por conta da minha visão de mundo, que considero, nas palavras de Sowell, uma visão trágica, mas porque em certa medida, quando analisamos um pouco mais minuciosamente suas ideias, elas mesmas caem em contradição. Muito embora alguns de seus ideais possam até serem dotados de boas intenções, a maneira de se executar, ou melhor, os mecanismos que são empregados para se chegar a um fim, nunca são eficazes, não por conta de serem ineficientes, mas tão somente porque não há possibilidade de se conseguir atingir fins utópicos. No papel é maravilhoso a ideia de uma paz mundial e absoluta; na vida real é outra história.

Trazendo um exemplo de Ortega y Gasset, sobre essa paz, que os “pacifistas” propagam dizendo ser necessário apenas que cessem as guerras, ele diz: “A outra opção é um erro puro. A outra opção é interpretar a paz como o simples buraco que a guerra deixaria se desaparecesse; portanto, ignorar que, se a guerra é uma coisa que se faz, também a paz é uma coisa que tem de ser feita, que tem de ser fabricada, pondo a trabalhar todas as potências humanas. A paz não ‘está aí’, simplesmente, pronta para que o homem simplesmente goze dela. A paz não é fruto espontâneo de uma árvore. Nada importante é dado ao homem de presente; e sim, ele tem que fazê-lo, que construí-lo."

Perceba que, fazendo um paralelo, intrinsecamente nas situações que nos acontecem diariamente passamos por dilemas parecidos, em que muitas vezes temos de decidir por um mal menor diante de um maior. A guerra não é desejável, mas sem ela não há paz; ninguém quer prisões cheias, mas sem elas não há segurança pública. Nessa mesma esteira vem uma velha máxima da esquerda de dizer que “prefere livros a armas”, o que seria mais ou menos dizer que prefere chave de fenda a dipirona. Não faz sentido tratar como melhor ou pior coisas com serventias tão distintas. Se quero apertar um parafuso, convém usar a chave de fenda; se estou com dor de cabeça, administro um dipirona. O mesmo vale para livros e armas: se o objetivo é ler, recomenda-se o livro, este que é inútil para a autoproteção, caso em que é preferível uma arma. 

Esses tipos de raciocínios foram disseminados nas últimas décadas de forma consciente por um grupo de pensadores. O esvaziamento do imaginário humano e o incentivo à relativização de quase tudo, fez com que a forma como avaliamos, interpretamos e analisamos o que acontece conosco todos os dias, fosse deteriorada sensivelmente. Nossa capacidade de entender a realidade foi completamente deturpada e é preciso um esforço gigantesco para retomá-la. 

No livro do filósofo britânico Roger Scruton, o que ele demonstra não é apenas uma teoria, mas a desconstrução desses grandes “pensadores” da esquerda que tornaram suas ideologias possíveis apenas porque conseguiram diminuir nossa inteligência. A magistralidade com que o autor faz esse exercício mental é fascinante. Ele nos joga dentro dos pensamentos e das teorias de escritores como Lacan, Deleuze, Zizek, Adorno, Habermas, Derrida, Lukacs, entre outros; nos faz “acreditar” no que eles dizem, mas depois dá dois passos para trás e aponta os erros que contém tais pensamentos. 

O escritor mostra ainda sobre como a esquerda se reformulou e saiu do seu lugar comum da luta de classes de operários versus patrões, para várias outras frentes – num verdadeiro “dividir o oponente (no caso a sociedade) para conquistar” – dando-lhe uma nova roupagem que lhe permita impor sua bandeira de uma nova ordem social firmada numa suposta “justiça social”, como nas questões relacionadas ao meio ambiente, às causas LGBT e aos negros. Incentivam sempre um “nós contra eles”, fomentando uma verdadeira política espiral de ressentimentos. Tiram a caridade e o amor ao próximo do centro da vida e colocam o próprio ser, deslocando o eixo elementar da vida em sociedade, o servir, para um ressentido ser servido.

É lindo defender as pautas que a esquerda defende, mas experimente discordar da maneira como é feito e sinta o ódio por não aceitar sua verdade como absoluta: exigem uma cegueira intelectual total, e se você pensar e criticar, é descartado pois não serve mais para a causa ideológica.  

No atual contexto social, entender como se disfarçam os verdadeiros agressores intelectuais, é fundamental para entender que por trás de um discurso bonitinho da esquerda, sempre há um radicalismo velado: o cavalo de troia da antiguidade se transformou no bolo com gilete contemporâneo, em que te vendem uma coisa agradável aos olhos, mas mortal por dentro. Ninguém melhor que Scruton, com sua paciência e inteligência fora do comum, para nos guiar nesse aprendizado.

Tolos, Fraudes e Militantes, Roger Scruton. 


*Este conteúdo é de responsabilidade do autor e não representa, necessariamente, a opinião do Diário de Uberlândia.


 
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