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23/04/2022 às 08h00min - Atualizada em 23/04/2022 às 08h00min

Sapiens

EDMAR PAZ JUNIOR
Foto: Reprodução/Internet
Constantemente me detenho para analisar o nosso cotidiano e refletir sobre como somos tão pequenos em relação ao mundo. E não digo apenas em comparação com o tamanho, ou seja, em medidas e números exatos, (Por exemplo, tenho 1,84m de altura e a extensão da rua é de 100 metros) mas sim diante do tempo. Nossa vida é menos que um sopro nesse incessante rodar do cronômetro e, gota a gota, a ampulheta do tempo vai nos deixando, cada vez mais com menos.
 
Quase tudo o que acontece na sociedade, discorrendo de uma maneira mais macro, é fruto de situações que na maioria das vezes demandam certo tempo para acontecer. Para entendermos o que vivemos hoje, é necessário sempre olhar para o passado e para um contexto maior, pois as mudanças quase nunca acontecem de repente. Por que, por exemplo, nossos ancestrais se reuniram para criar cidades, reinos e impérios? Certamente não foi uma ideia que “brotou do nada”. Foram necessários milhares de anos para que Homem entendesse que era muito mais seguro, saudável e propício para a continuação da espécie que eles convivessem em pequenos grupos. Contudo, com o passar do tempo estes grupos se tornaram cada vez maiores, até o momento em que desembocaram e se viram amontoados nas grandes metrópoles que existem atualmente.
 
Harari apresenta a história do desenvolvimento da humanidade, em um apanhado geral, mostrando que as maiores mudanças foram construídas em cima de bases edificadas durante o tempo. Entretanto, perceptivelmente esse “tempo” entre mudanças vem se encurtando. Ele disserta sobre as três principais revoluções que a humanidade passou, mas revoluções reais, que implicaram em desenvolvimento de fato, e não algumas que são proferidas a torto e a direito pelas redes sociais. As Revoluções Cognitiva, Agrícola e a mais recente, a Industrial, não são saltos evolutivos efetivamente, mas o autor as descreve como sendo “marcos temporais”, basicamente de uma maneira que as coloca como sinalizadores de que as mudanças que aconteciam paulatinamente durante o tempo, “de repente” resultaram em algo melhor.
 
Ao escrever sobra a primeira grande revolução, a Cognitiva, Harari conta um pouco sobre o gênero humano. Às vezes pouco falado, nós, os Homo Sapiens, somos uma espécie dentre outras de humanos. Há cerca de 70 mil anos, eram ao todo seis espécies, entre elas os Neanderthalenses e o Homo Erectus. É interessante como são descritas as características de cada uma, como a força dos Neanderthais e a inteligência de nós, os Sapiens. Enquanto os primeiros literalmente lutavam contra suas presas e suas caças, que eram geralmente mais fortes, pois caçavam animais grandes como os mamutes, fazendo com que sofressem claras desvantagens, os segundos começaram a utilizar a “previsão”, ou seja, aprenderam a observar e tentar prever, ou imaginar, os passos que suas presas iriam tomar, facilitando em muito a fabricação de armadilhas para sua captura. Aqui, o homem literalmente começou a Pensar. Isso entre 30 e 70 mil anos atrás.  
 
A Revolução Agrícola, que ocorreu por volta de 12 mil anos atrás, demonstrou que os homens, além de preverem os movimentos de suas caças, passaram a tentar entender a dinâmica do próprio planeta e, com isso, realizar previsões mais eficientes sobre o clima, permitindo assim que escolhessem as melhores estações do ano para cultivar plantas e lavouras. Foi quando o homem começou também a domesticar os animais, utilizando-os tanto para realizar trabalhos pesados quanto para o próprio sustento alimentício.
 
Entre a segunda e a primeira revolução, passaram-se quase 12 mil anos. Não é pouco tempo e Harari também entra nesse meio de fases para demonstrar como e o porquê se deu a Revolução Industrial. Como dito antes, não é de uma hora para outra que acontecem desenvolvimentos significativos. Desde os primeiros feudos, as construções das pirâmides, até os anos precedentes ao terceiro “giro” da humanidade, o mundo foi dominado pelo dinheiro, por imperadores destemidos e também pela religião. O poder nem sempre significa exclusivamente força.
 
Uma situação interessante que é narrada na obra demonstra muito bem como impérios duradouros são construídos e também quais são os legados que podem deixar. Ao narrar a história de como China e Inglaterra conquistavam terras, ampliavam seus domínios e colonizavam os povos, o autor tenta explicar a parte intrínseca dessas conquistas, e tentando esmiuçar as entranhas das expedições, ele desvenda as intenções dos colonizadores: enquanto os chineses buscavam apenas “terras” para cada vez mais ampliar seu domínio, sem tentar entender os povos que colonizavam, os ingleses estudavam a aprendiam o que suas colônias podiam oferecer de benefícios para o reino. Essa “troca” de experiências permitia uma interação mais profunda entre os povos, indiretamente fazendo com que os colonizadores não fossem vistos como invasores, facilitando e aumentando suas forças e domínios territoriais.
 
A terceira e talvez mais importante revolução, foi a Industrial, que ocorreu cerca de 250 anos atrás. Muito têm se falado que desse momento em diante a humanidade passou a “perecer” por conta, entre tantos outros fatores, da submissão das pessoas aos regimes de trabalho massacrantes. Porém, os mesmos que falam sobre esses “problemas” se esquecem de analisar os benefícios que tal revolução proporcionou. A partir do século XVIII, com a sistematização e mecanização dos processos de produção, o Homem começou a produzir em maior quantidade, tanto alimentos, quanto utensílios que facilitaram a vida das pessoas, o que consequentemente permitiu que houvesse uma expansão da população. A população das cidades, e também dos campos, passaram a comer melhor, viver melhor e com isso, viver mais tempo.
 
O livro ajuda a entender um pouco o quão irrelevantes somos diante da imensidão de possibilidades que nos cercam, além de descobrirmos mais sobre os seres humanos: fantásticos e ao mesmo tempo tenebrosos. É uma ótima leitura que apresenta uma forma de entender a história bem diferente do que nos é apresentado pelos livros didáticos.
 
Sapiens, Yuval Noah Harari.


*Este conteúdo é de responsabilidade do autor e não representa, necessariamente, a opinião do Diário de Uberlândia.
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