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17/11/2020 às 09h00min - Atualizada em 17/11/2020 às 09h00min

Henfil

CHICO DE ASSIS

Henrique de Souza Filho, nascido em 1944, em Ribeirão das Neves (MG), passou a adotar o nome Henfil com a fusão de sílabas do nome e sobrenome, à moda dos cartunistas franceses, por sugestão do escritor Roberto Drummond, seu primeiro editor, que o “obrigava” a fazer ilustrações para a Revista Alterosa, de Belo Horizonte, com a qual colaborou a partir de 1964. Henfil não tardou a partir para o Rio de Janeiro de onde seu trabalho alcançou dezenas de publicações em jornais e revistas da época, como o Jornal dos Esportes, Cruzeiro, Realidade.

Mas seu nome é realmente indissociável do semanário Pasquim, Jornal satírico de resistência política e cultural ao regime militar, com nomes como Jaguar, Ziraldo e Millôr Fernandes, a publicação foi um sucesso estrondoso, tão inesperado quanto bem-vindo. Aqui, os “Fradim”, personagens de Henfil, alcançaram reconhecimento nacional vindo a se tornar uma publicação autônoma em revistas em quadrinhos, distribuídas pela própria editora do Pasquim.

No início dos anos setenta, Henfil parte para os Estados Unidos e se instala em Nova York. Queria mergulhar nas entranhas do imperialismo, conhecer a estrutura de dominação cultural que tentava se impor ao mundo. E também pela possibilidade de tratamento da hemofilia, doença hereditária da qual era portador. A experiência na área de saúde foi trágica, mas como cartunista conseguiu o feito quase impossível para um estrangeiro, trabalhar com um syndicate (nome dado às distribuidoras de conteúdo nos EUA), a discussão para a assinatura do contrato foi longa, porque ele não aceitava que seus personagens fossem usados em material publicitário ou mesmo transformados em filmes de animação.

Suas tiras com os “Fradim”, que ali foram chamados de “Mad Monks”, começaram a ser publicadas em jornais de forma promissora para um artista desconhecido no país, mas em menos de dois meses as redações começaram a receber cartas de leitores, em grande número, o acusando de “ateísta”, “comunista”, anticlerical”, “escatológico”, entre outros elogios. O contrato acaba sendo rescindido em um acordo entre as partes, e embora houvessem vários convites para trabalho em revistas alternativas e outros veículos fora do mainstream, Henfil decide que é hora de retornar ao Brasil. Essas aventuras são contadas no livro “Diário de um Cucaracha”, compilação de cartas que enviou durante dois anos a familiares e amigos.

Além de quadrinhos e cartuns, fez programa de televisão, um filme longa-metragem, “Tanga (deu no new York times?)”, crônicas, livro reportagem, literatura infantil, produção de teatro, tudo isso sempre com um posicionamento político muito enérgico e certeiro. Foi figura chave no movimento pelas diretas já, e sua posição radical nesse momento lhe renderam muitas críticas, alguns achavam que o tipo de humor que ele fazia estava ultrapassado depois da “abertura política”. Se definia sobretudo como um jornalista, mas em várias ocasiões onde seu trabalho nos quadrinhos foi criticado, demonstrou uma imensa consciência artística defendendo sua obra. Falecido muito jovem, em 1988, mesmo ano da promulgação da constituição ainda vigente, estaria agora com 75 anos. Henfil faz grande falta à alma brasileira, e seu trabalho é muito menos visto e divulgado do que deveria, sobretudo em momento de tamanha fragilidade da democracia.

*Este conteúdo é de responsabilidade do autor e não representa, necessariamente, a opinião do Diário de Uberlândia.
 

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