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18/06/2019 às 08h35min - Atualizada em 18/06/2019 às 08h35min

Ramos e rumos da economia da cultura

ENZO BANZO
Certa vez encontrei, depois de algum tempo sem o ver, o motorista da van que levava minha banda para tocar em shows pelo interior de Minas e por nossa capital há alguns anos. Ele me perguntou: "e aí, rapaz, aquelas viagens, não tem mais? Tempo bom, levava vocês e outras bandas, nunca imaginei ganhar dinheiro com isso..." Só então me dei conta de que aquele motorista era um pequeno exemplo claro do que costumamos chamar de economia da cultura. Não é artista, não trabalha com arte (a princípio), mas vê seu negócio ganhar um impulso decorrente da movimentação econômica propiciada pela cultura.

O motorista da van é só um entre os inúmeros profissionais acionados pelo giro da roda cultural. Já trabalhei, por exemplo, na gestão de alguns festivais, e ali sempre me chamou a atenção o fato de os artistas serem, no fim das contas, minoria na quantidade de pessoas (físicas e jurídicas) envolvidas. O trabalho de um festival começa muito antes do evento, entre a equipe organizadora que precisa, antes de tudo, levantar recursos financeiros. E partem para as contratações de artistas, que não vêm sozinhos, mas com suas equipes técnicas e de produção. Lá atrás tem gente trabalhando em tarefas administrativas, jurídicas e contábeis que envolvem essas contratações, e uma outra equipe ralando na divulgação, produzindo materiais gráficos, virtuais, audiovisuais.

Agências de viagens, hotéis e restaurantes ganham movimento não só com os artistas e suas equipes, mas também com a população das cidades vizinhas que está vindo para o evento. Alguns dias antes, o local está cheio de carregadores, montadores, técnicos de som e luz. Surgem banheiros químicos, tendas, ambulâncias, seguranças, bilheteiros, gente no bar, que nos valham as planilhas. E, como nos casos em que trabalhei, se a atividade recebe apoio de um edital de lei de incentivo à cultura, haja cuidado e organização, pois tudo deve ser feito como planejado e aprovado, entre atividades e orçamento, passando depois por um minucioso processo de prestação de contas. Ufa!

É preciso, não só pra quem trabalha com cultura, mas para qualquer cidadão, a busca de compreensão desta dinâmica. Para quem é artista ou amante da cultura, os atributos estéticos, subjetivos, humanizantes, críticos e transcendentes da arte são mais que suficientes para garantir-lhe a máxima importância. Isso sem falar em seu potencial educativo e de inclusão social. Mas para dialogar com uma sociedade em que nem todos se colocam neste lugar, é preciso deixar claro que a cultura vai adiante, posicionando-se como relevante espaço gerador de trabalho para muito além da figura do artista. Tudo isso ao mesmo tempo em que dá vida aos tais atributos essenciais e subjetivos, sem os quais a arte deixaria de fazer sentido.

Se precisamos falar sobre a dimensão econômica da cultura, a hora é essa a oportunidade está dada. Está acontecendo na cidade um interessantíssimo evento voltado para o tema, o 4º Seminário de Economia da Cultura, iniciativa do Balaio do Cerrado, braço de produção do Grupontapé de Teatro, que, exemplarmente, está aí há mais de duas décadas (devo abrir um parêntese para contar que uma das minhas primeiras experiências artísticas foi um curso que fiz com eles nos anos 90, fundamental para o início de meu trabalho). A programação é extremamente qualificada, envolvendo artistas e grupos culturais da cidade e do Estado, e ainda representantes de empresas e dos governos municipal e estadual. Momento importante de conversa olho no olho, para além do vaivém de publicações nas redes sociais. O tema não poderia ser mais propício: "o futuro, o emprego e a cultura". Para encontrar o nosso rumo, precisamos compreender o nosso ramo.



*O conteúdo desta coluna é de responsabilidade do autor e não representa, necessariamente, a opinião do Diário de Uberlândia.
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