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12/11/2022 às 14h00min - Atualizada em 12/11/2022 às 14h00min

Câmara completa 130 anos sem eleger mulheres à presidência do Legislativo

Desde a primeira legislatura, em 1892, Legislativo Municipal nunca registrou sequer uma candidatura feminina à condução da Mesa Diretora

SÍLVIO AZEVEDO | DIÁRIO DE UBERLÂNDIA
Em mais de 100 anos de história, Legislativo teve mais de 50 homens na presidência | Foto: PMU/Divulgação
A Câmara Municipal de Uberlândia elegeu nesta semana o seu 54º presidente, o vereador Zezinho Mendonça (PP). Nestes 130 anos de história, iniciada em 7 de março de 1892, com a posse dos primeiros 12 representantes e a instalação da primeira sede, o Legislativo teve sob o comando da Mesa Diretora 53 homens e nenhuma mulher à frente da presidência da Casa. 

O primeiro presidente da casa de leis foi Augusto César Ferreira e Souza (1892-1894). De lá para cá, a representatividade feminina obteve destaque somente em 2020, com a eleição de oito vereadoras, considerada a maior bancada da história. No entanto, com a morte da parlamentar Drika Protetora (PL), que faleceu em decorrência da covid-19, em março do ano passado, o cargo deixou de ser ocupado por uma mulher e passou para as mãos de Cristiano Caporezzo (PL), na época suplente. 

Já neste ano, outra vereadora assumiu, mas de forma temporária. Simone Braga (União Brasil) ocupou por um mês o lugar de Anderson Lima (DC), que solicitou afastamento em outubro. Em comparação com o biênio 2021/2022, onde apenas uma mulher ocupou um cargo na Mesa Diretora, Gláucia da Saúde (PSDB), a 1ª vice-presidente, nos próximos dois anos essa representatividade deve melhorar. A partir de 2023, duas parlamentares vão compor a direção da Casa, sendo elas: Thais Andrade (PV), como 3ª vice-presidente, e Liza Prado (Patriota), que terá a função de segunda secretária.

Para a vereadora Amanda Gondim (PDT), uma das oito eleitas em 2020, a Câmara Municipal nunca teve um foco no protagonismo das mulheres, nem mesmo ao eleger a maior bancada feminina há dois anos.  

“Percebemos que a forma de se fazer política ainda é conservadora e enraizada em um padrão de homens brancos de certa idade que disputam o poder dentro da base do prefeito. Uma base que é maioria e que não se articula para a formação de uma mesa diversa que contemple os campos políticos que temos na Câmara. A oposição está em menor número e essa limitação da base em aceitar dividir espaços de trabalho para um funcionamento equilibrado do Poder Legislativo é uma dificuldade histórica para que tenhamos alternância e equilíbrio nas gestões da mesa”, disse.

A participação feminina no Legislativo teve início em 1954, 60 anos após a formação da Câmara, com a eleição de Maria Dirce Ribeiro, do Partido Social Progressista (PSP). Já em 1983, e depois em 1988, Uberlândia elegeu sua segunda vereadora e a primeira negra no cargo, com a professora Olga Helena da Costa, pelo Movimento Democrático Brasileiro (MDB). Desde então, pouco mais de 20 vereadoras, incluindo suplentes, ocuparam uma cadeira no parlamento.  Atualmente, o Legislativo tem 27 representantes, sendo sete mulheres e 20 homens. 

Em entrevista ao Diário, a doutora em História e também vereadora, Cláudia Guerra (PDT), destacou que essa quantidade tão reduzida de mulheres eleitas em 130 anos é resultado de uma sobrecarga de dupla ou tripla jornada, já que muitas delas ainda precisam escolher entre ser mãe, esposa, dona de casa ou profissional. “É uma escolha não colocada para homens. Outro aspecto, por mais que haja a política de cotas, as pesquisas revelam maior investimento dos partidos nas candidaturas masculinas”. 

Ainda segundo Cláudia, o fato de nenhuma mulher ter sido eleita presidente da Casa revela o sexismo ainda existente e contradições. “Mesmo as mulheres sendo a maior parte da população, as mais escolarizadas e qualificadas, maior parte das eleitoras, elas ainda estão sub-representadas na política”, argumentou. 

Em mais de 100 anos de Legislativo, a Câmara sequer teve uma candidata na disputa às eleições da Mesa Diretora. Para a vereadora Amanda Gondim, a formação de uma chapa feminina esbarra em questões ideológicas e métodos de trabalho. “As mulheres da Casa não estão todas dentro de uma mesma perspectiva sobre a importância da nossa atuação organizada como mulheres. Existem os interesses dos campos e agrupamentos políticos que superam esta questão internamente”, afirmou.


BARREIRA INSTITUCIONAL
O cenário de Uberlândia reflete uma realidade nacional. Assim como no Legislativo Municipal, Senado, Câmara dos Deputados e Assembleia Legislativa de Minas também nunca elegeram mulheres para a presidência. 

De acordo com a cientista social Alecilda Oliveira, é preciso estabelecer uma retrospectiva, entendendo que as mulheres começaram a atuar tardiamente na política institucional, inclusive como eleitoras, tendo direito ao voto somente a partir de 1932. Ainda segundo a especialista, ainda hoje, apesar de o número de representantes femininas nas Casas Legislativas ter aumentado, há uma sub-representação de mulheres nesses espaços como um fenômeno. 

“O que nos ajuda a entender o fenômeno? O espaço da política institucional ainda é muito hostil à participação das mulheres, o que é fruto de um machismo que estrutura nas relações de poder e se torna um prejuízo também para que se tenha correlação de forças que possibilitem às mulheres a ocuparem espaço de destaque, de condução e de tomada de decisão”, afirmou.

A cientista ainda reforça que o caso do aumento da representatividade em Uberlândia não é único. “No último período tivemos uma mudança que deu espaço para a eleição de algumas mulheres para o Executivo, mas a regra ainda é a eleição de homens em sua a maioria como representantes, seja para o Executivo ou Legislativo. Muitas mulheres, para serem eleitas e respeitadas na vida pública precisam mostrar uma postura dura, um estereótipo do que se aproxima daquilo que é visto como característica dos homens”.  

A analista lembrou ainda do caso das cassações de vereadores em 2020, por causa das operações policiais envolvendo um esquema de corrupção com desvio de verbas indenizatórias, um dos maiores escândalos institucionais da cidade. "Penso que o escândalo institucional foi um prejuízo para a democracia uberlandense e que eleger parlamentares que representam um mesmo grupo que se mantém há anos na condução política seja o prejuízo. Mas temos que tomar cuidado para não ‘essencializar’ tratando como transformação apenas por serem mulheres. Há mulheres que eleitas não defendem as necessidades da população, não buscam dialogar com os interesses do povo e, também, das demais mulheres”, pontuou.

Ela ainda relembrou a questão da violência política sobre as mulheres. “Por ser um espaço hostil à participação feminina, a Política institucional também é de muita violência simbólica, emocional e às vezes até mesmo de agressões e ameaças graves. Se reproduz a lógica das relações entre homens e mulheres em outras esferas da vida social. E em relação às mulheres, buscam nos desqualificar a todo momento”, finalizou. 


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MESA DIRETORA 2023/2024
Nesta semana, os vereadores de Uberlândia elegeram Zezinho Mendonça (PP) como novo presidente da Câmara Municipal de Uberlândia no biênio 2023/2024. Mendonça é o 54º parlamentar a assumir o cargo. 

Presidente: Zezinho Mendonça (PP)
Primeiro-vice: Sérgio do Bom Preço (PP)
Segundo-vice: Neemias Miqueias (PSD)
Terceiro-vice: Thaís Andrade (PV)
1º secretário e ordenador de despesas: Eduardo Moraes (PSC)
2ª secretária ordenadora de despesas: Liza Prado (Patriota)

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