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16/10/2017 às 05h31min - Atualizada em 16/10/2017 às 05h31min

Jovens reacionários

ALEXANDRE HENRY ALVES* | COLUNISTA

Escrevi outro dia em uma rede social que ando assustado com a quantidade de gente da minha geração, agora na casa dos 40 anos de idade, que tem se mostrado não apenas conservadora, mas reacionária. Os comentários à minha postagem me mostraram uma situação pior, com comentários de jovens na casa dos vinte anos que abraçaram essas mesmas ideias, algo incompreensível para mim. A juventude é o tempo da contestação, do questionamento, é a fase da vida em que as ideias revolucionárias brotam na cabeça todos os dias. Como alguém pode ser jovem e reacionário?

Fiquei pensando na resposta a essa última questão. A única explicação é a junção de desesperança e falta de criatividade para pensar em novas soluções. A desilusão com a realidade é algo inerente à juventude, que sempre deseja um muito diferente do que os pais têm a oferecer. Já a falta de criatividade e energia é uma marca da juventude atual, a meu ver, acostumada a ter tudo de bandeja, a ser servida, a pensar com a profundidade de uma timeline. Essa fragilidade intelectual vira, então, campo fértil para discursos antigos e pegajosos, como o religioso e o militarista. 

Como estamos vindo de quase duas décadas em que as ideias da esquerda se mostraram muito em evidência, a juventude atual busca rejeitar o que ela encontrou ao deixar de ser criança, ou seja, as ideias dessa corrente política. E qual é a síntese que se pode fazer desses pensamentos agora rejeitados pela juventude? No campo do comportamento humano, a esquerda sempre pregou mais liberdade, mais diversidade e menos controle social. No campo econômico, ao contrário, sempre buscou um controle estatal forte. É isso o que os jovens encontraram e é isso o que boa parte deles rejeita. O problema, na linha do que eu disse, é que temos uma geração intelectualmente despreparada, pois as suas leituras se concentram basicamente nas postagens de redes sociais, e ainda com pouca energia para mudar o mundo. Qual é a solução que encontram? Aquela dada por líderes religiosos ou ultraconservadores armamentistas.

Ocorre que as soluções ofertadas por esses dois segmentos (religiosos e ultraconservadores) não representam uma solução nova e buscam, basicamente, arregimentar votos entre uma juventude sem bússola. Muitos dos valores defendidos por esses “pensadores” que guiam os jovens de hoje são bastante questionáveis.

Falemos da família, primeiro. Eu acho a família algo absolutamente importante, tanto que sempre coloco a minha em primeiro lugar. Mas, eu enxergo a família, basicamente, como um núcleo formado por laços afetivos marcados por um amor incondicional. Acredito na família tradicional, exatamente como a minha (homem + mulher + filhos). Mas, acredito também nas famílias não convencionais, formadas por avós que criam os netos, mulheres que fazem o papel de pai e mãe, homens que se separam e tomam para si a tarefa de criar os filhos sem uma mulher ao lado e, sim, pessoas do mesmo gênero que, ligadas pelo tal amor incondicional, decidem viver em harmonia dentro de um lar. Já a família defendida pelos “guias morais” da atualidade se resume ao papai + mamãe + filhos, ignorando todo o resto, como se somente houvesse uma forma possível de felicidade. Forma, aliás, que foi marcada em muitos lares por uma felicidade apenas parcial, a do homem chefe da família, enquanto a mulher vivia em estado de submissão absoluta, tentando encontrar cacos de felicidade aqui e ali. Os homens, grandes paladinos da moralidade, enchiam os bordeis e acumulavam amantes sem o menor pudor. Por isso, fico muito desconfiado quando vejo defesas apaixonadas da “família tradicional”.

E as soluções militaristas? Bom, esse é outro assunto espinhoso e marcado por irracionalidades. Eu entendo a desilusão da juventude atual e da turma da minha geração, mas achar que os militares são a solução, sinceramente, é comprar uma ideia fácil que já se mostrou equivocada. Primeiro, é preciso ressaltar que boa parte da geração corrupta de políticos de hoje em dia, que tem entre 55 e 70 anos de idade, aprendeu os ossos do ofício durante o regime militar. É gente que cantava o hino nacional na hora do recreio, que vivia em uma família tradicional e religiosa, mas ainda assim viraram isso aí que a gente está vendo. Já a geração que está enfrentando esses corruptos é formada por gente mais nova, que cresceu junto com a redemocratização. Fora isso, é de se perguntar: qual é a nação desenvolvida no mundo que evoluiu a partir de um governo militar? Qual? Procure e depois me conte.

Por falta de espaço, termino este texto por aqui. Mas, vou voltar ao assunto, pois ele é extremamente importante. Aliás, só vou voltar ao assunto porque vivemos em uma democracia. 

(*) Juiz Federal e Escritor - www.dedodeprosa.com

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