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10/09/2017 às 05h43min - Atualizada em 10/09/2017 às 05h43min

Sob pressão

ALEXANDRE HENRY | COLUNISTA

Olho para o relógio ao começar a digitar este texto e ele marca 17h57. O prazo final para o envio é às 18h00. Não vai dar, é claro, para digitar 4.500 caracteres em três minutos. Mas, eu sei que tenho ainda quinze minutos de atraso permitidos, não mais do que isso. O pensamento sobre o assunto da coluna desta semana não me levou a nenhum tema específico, só a pressa. O dia foi corrido, muito corrido. [Pausa – Tive que calçar a sandália na minha filha e buscar um pacote no carro. Menos cinco minutos do meu tempo. O relógio já marca 18h06]. Eu precisava produzir um texto mais cedo que, no final das contas, acabou tendo 98 páginas. Sim, 98 páginas em um só dia, sendo poucas delas produzidas por outra pessoa. No começo da tarde, a cabeça começou a dar sinais de que iria doer daquele jeito que bem conheço, a dor que começa em um dia e só acaba no outro. Corri e tomei logo dois comprimidos de analgésico para me antecipar. Parece que funcionou.

Eu não sou de deixar as tarefas para a última hora. Aliás, quase nunca deixo. Essa história de ficar protelando sempre me pareceu uma atitude insana, pois você sofre mais com o pensamento de que tem algo a fazer do que com a tarefa em si. Melhor acabar logo com aquilo e ficar com a cabeça tranquila. Era assim na escola, com os trabalhos. Continuou durante a faculdade e me acompanhou pela vida profissional. Última hora? Não, não é comigo. Com tempo, a gente sempre faz as coisas de maneira mais completa, mais detalhada e sem os erros comuns que a pressa sempre traz. Sem contar o risco dos imprevistos. Pode ser até o velho pneu furado, mas, em tempos digitais e de tarefas no computador, é mais comum que seja uma queda de energia, a internet que falhou ou o seu computador que resolveu instalar aquela atualização de duas horas sozinho, do nada, bem no momento em que você mais precisava dele.

Acontece que nem sempre a gente consegue escapar de uma atividade de última hora ou mesmo de algo que, ainda que não tenha sido postergado, ficou para os instantes derradeiros simplesmente porque você tinha coisas demais a fazer e não pode cuidar daquilo antes. Como este texto agora. Advogados e jornalistas sabem muito bem o que é isso. O relógio está ali do lado, no seu tic-tac cruel, apontando os ponteiros para o seu rosto e dizendo que você vai se ferrar se não andar logo. Prazo! Essa palavra cruel para muito profissional e para muitos estudantes.

Mas, a vida é feita de prazos. Mesmo que você se programe, como eu disse, é possível que você tenha que agir sob pressão. E é nessas horas que você percebe que o ser humano traz em seu código genético alguns genes dedicados justamente a fazer com que você consiga se salvar em uma emergência, seja ela de que tipo for. Mesmo com o relógio te torturando, você vai dando sequência àquela tarefa em um processo de imersão que parece te levar a outra dimensão, na qual só existem você e o que você está fazendo. Claro, tem o relógio também, mas deixemos os ponteiros de lado. Sua adrenalina sobe, o coração se acelera e você sente a respiração ganhar um ritmo mais rápido. Concentração! Isso! Ela é a chave para você conseguir finalizar algo contra o tempo. E todas essas mudanças no seu corpo, especialmente na sua circulação sanguínea, são propositais, servindo para que você se concentre naquilo que tem que fazer para salvar a sua pele.

Às vezes, a pressão faz bem. Essas pequenas situações de estresse ajudam na nossa evolução, por mais que não pareça. No mínimo, fazem você repensar depois, quando tiver uma nova tarefa e bater aquela vontade de postergar o que você já deveria ter feito há muito tempo. No geral, perceber que você dá conta de fazer algo mesmo que o tempo corra contra você traz uma sensação de capacidade muito grande quando você consegue vencer o relógio e, finalmente, aperta o botão de enviar ou entrega pessoalmente o que estava preparando na correria. Há sensações melhores, sim, mas essa mistura de dever cumprido, alívio e capacidade é muito boa.

O grande perigo é justamente você se acostumar com a ideia de que pode deixar as coisas para depois que, perto do prazo limite, você vai dar conta de resolver tudo. Às vezes, isso não acontece e o seu prejuízo é imenso. O melhor que você faz é se preparar sempre com antecedência, cuidar das tarefas enquanto o prazo não está te apertando e sempre trabalhar com calma. Caso contrário, mesmo que você não tenha um prejuízo muito grande, é certo de que a sua tarefa não vai ficar tão bem produzida quanto poderia ficar caso você não tivesse feito tudo de última hora. Agora que você acabou de ler este texto, você tem uma prova exata disso: ele ficou ou não ficou pior do que meus escritos de costume? Abraços e, ufa, acabei!

(*) Juiz Federal e Escritor - www.dedodeprosa.com

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