Diário de Uberlândia | jornal impresso e online Publicidade 1140x90
21/03/2023 às 08h00min - Atualizada em 21/03/2023 às 08h00min

O tricampeonato do interior

ANTÔNIO PEREIRA
Na década de 1930, organizou-se em Uberlândia uma entidade esportiva chamada Associação Atlética Uberlândia com a finalidade de praticar basquete que, na época, chamava-se Bola ao Cesto. A sede da AAU era na rua Santos Dumont no espaço hoje ocupado pelo Uberlândia Clube. Havia uma quadra de basquete rodeada por pequena arquibancada e muitas mangueiras. O treinador da equipe era o incansável esportista Boulanger Fonseca, irmão do primeiro prefeito, pós-Getúlio, José Fonseca. O orador do time (antigamente tinha disso) era o jovem Rondon Pacheco que foi, também, orador do Uberabinha Esporte Clube.

Em 1936, Baby Bariani (leia-se Babí e não Beibi) promoveu um campeonato de basquete do interior. Na verdade, um interior que se restringia ao estado de São Paulo e, não sei por quê, mais uma cidade mineira, a nossa.

A rapaziada começou a treinar diariamente. Eram: Geraldão, Zico, Byron, Braerson, Hélio, Zé Hubaide, Ubirajara (Bira), Cleanto e Peti (Chico Bunda). Treinavam até debaixo de chuva. Boulanger convidava grandes equipes do interior e até de capitais para jogos treinos. Passaram por aqui, e apanharam, o Minas Tênis, a Francana, o SPR, de São Paulo. A disputa foi centrada em Monte Alto, SP. Seis equipes disputaram as finais. O jogo final foi entre Uberlândia e Piracicaba. Ganhamos. A rapaziada quase endoidou de emoção. Suas idades variavam de 17 a 20 anos. A cidade os recebeu como heróis com desfile pela avenida Afonso Pena, banda de música e discursos.

Em 1937, Baby Bariani resolveu repetir os jogos abertos do interior, desta vez com sede em Uberlândia. Novamente a rapaziada entrou em tempo de intensos treinamentos e novos jogos amistosos com grandes equipes foram feitos. Outros rapazes reforçaram a equipe: Zenon, Adjardes, Paulo Carneiro,  João Maia, Breno e alguns outros. A base, entretanto, continuava sendo os campeões de Monte Alto. Bariani veio morar em Uberlândia e começou a acompanhar os treinamentos e ajudar o técnico Boulanger.

Eduardo Segadães preparou a quadra, ampliou vestiários e arquibancadas. Desta vez vieram mais representações. Nos dias de jogos, arquibancadas e galhos das mangueiras ficaram apinhados. As disputas se seguiram dia a dia até chegar a final: novamente Uberlândia e Piracicaba e o resultado repetiu-se: ganhamos. Chegou 1938 e o terceiro Jogos Aberto do Interior, agora realizados em Piracicaba, a que sempre apanhava de nós na final. As equipes do interior de São Paulo enciumadas, buscaram atletas nas grandes equipes paulistanas, semiprofissionais. Uberlândia, com sua jovem rapaziada foi vencendo, vencendo até chegar à final. Com quem? Piracicaba, de novo – agora a anfitriã do certame. Na noite da final, a quadra estava regurgitando, soltando gente pelo ladrão. Nos vestiários, o massagista de Uberlândia (quem, meu Deus?), passou nas pernas dos atletas um unguento que os deixaria mais espertos. Despencou violenta chuva e todo mundo ficou uns vinte minutos trancados. O tal de unguento danou a coçar que ninguém aguentava.  Mas a chuva acabou, secou-se a quadra, a final começou com a AAU enfiando bolas no “misto” de Piracicaba (“misto” porque enxertado com semiprofissionais). Nos últimos segundos, Uberlândia tinha um lance livre a realizar, após o qual, acabaria o jogo. A torcida invadiu o campo, antes do lance e virou um quebra-pau. Zé Hubaide, um árabe deste tamanho, invadiu o campo, abraçou o pequenino Bira (que era o menorzinho do time, tinha só 17 anos, mas era o cestinha!) com um braço e o foi arrastando do meio do povo. Com o outro braço defendia-se. Os atletas dos dois times refugiaram-se nos vestiários sob a proteção da polícia. Os locais não se cansavam de pedir desculpas. O jogo acabou antes da hora, mas ganhamos.

Essa é a história do tricampeonato vencido pela AAU. Tricampeonato autêntico, com valores de casa. Para não se esquecer.

Fonte: Ubirajara Zacharias (Bira)


 
*Este conteúdo é de responsabilidade do autor e não representa, necessariamente, a opinião do Diário de Uberlândia.
 
Leia Também »
Comentários »
Diário de Uberlândia | jornal impresso e online Publicidade 1140x90