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07/01/2023 às 08h00min - Atualizada em 07/01/2023 às 08h00min

A nova Previdência Municipal

Por Adir Claudio Campos, advogado e mestre em Direito Público

A Câmara Municipal de Uberlândia aprovou na terça-feira (3/1), um pacote de medidas instituindo novas regras de aposentadoria para os servidores públicos atuais e futuros. A principal justificativa para aprovar a reforma da previdência seria o risco de, em um futuro próximo, ocorrer uma diminuição da receita do IPREMU que impeça a autarquia de pagar os benefícios. 

 

A primeira pergunta que qualquer pessoa curiosa com a realidade econômica poderia fazer é a seguinte: como se explica que, em meio à crescente riqueza da cidade e do país, os servidores e os trabalhadores em geral estejam perdendo direitos em vez de, ao menos, conservá-los? Como é possível que direitos tão duramente conquistados ao longo dos séculos XIX e XX sejam suprimidos, como o de se aposentar em tempo razoável e com proventos em valores correspondentes ao recebido em atividade após décadas de dedicação ao trabalho?

 

São enganosas as justificativas usadas para a aprovação das novas regras, como o suposto déficit atuarial. Trata-se de uma manipulação de dados e números para destruir direitos dessa categoria, que já vem sofrendo desde o final dos anos 90 uma progressiva perda de direitos. 

 

Como é sabido, a receita do IPREMU é composta de contribuições dos servidores (que era de 11% e agora passou para 14%) e do Município (que era e se manterá em 22%). Somados, os antigos percentuais formavam um montante suficiente para manter os benefícios previdenciários e o perfeito equilíbrio das contas. Tanto é verdade, que o IPREMU nunca teve déficit, ao contrário, suas receitas não param de crescer, segundo declarações da própria superintendência. 

 

Da mesma forma, o Município também não registra queda de arrecadação, conforme a Lei Orçamentária Anual, onde se verifica expressivo aumento da receita e equilíbrio com as despesas todos os anos. Ademais, nunca houve risco de faltar dinheiro que justificasse a brutal perda de direitos que os servidores municipais irão sofrer com a aprovação da reforma previdenciária. 

 

Algumas das novas medidas são verdadeiramente malvadas, como a de exigir que o servidor municipal que exerça atividades perigosas à saúde seja obrigado a trabalhar até atingir os 60 anos para se aposentar, além de pagar as contribuições ao IPREMU por 25 anos – uma dramática alteração nas regras atuais definida pelo Supremo Tribunal Federal (Súmula Vinculante 33), que garantia esse direito aos 25 anos de contribuição independentemente de idade mínima, por analogia ao art. 57 do Regime Geral do INSS. Um jovem de 18 anos, por exemplo, terá que trabalhar 42 anos para se aposentar por insalubridade.

 

Uma professora que antes tinha o direito de se aposentar com 50 anos de idade e 25 anos de contribuição, terá agora que trabalhar pelo menos 40 anos para receber 100% da remuneração. O servidor que falecer em serviço, mesmo tendo contribuído ao longo de quase todo o período necessário para se aposentar, deixará uma pensão para seu cônjuge de apenas 60% de sua remuneração, além de outras limitações ainda mais severas quanto à limitação do período de recebimento da pensão para alguns casos.

 

Acredito que, diante do teor altamente abusivo de algumas das novas regras, o Judiciário poderá anular parte delas, como já se vê em algumas decisões da Justiça Federal, como a do juiz da 5ª Vara Federal de Brasília, que asseverou que o servidor público “não pode viver em estado de insegurança continuada, pois previdência é exatamente o oposto: um serviço que exige proteção qualificada da confiança, destinado a oferecer um horizonte de futuro previsível e programado” (processo 1060075-70.2021.4.01.3400). Igualmente, o juiz da 2ª Vara Federal de Florianópolis se valeu de fundamento análogo (processo 5014981-30.2020.4.04.7200). Diante desses abusos inconstitucionais, veremos o que irá dizer o Supremo Tribunal Federal. 

 

Outras reformas em nível federal também afetaram direitos, mas nenhuma delas se equipara à Emenda Constitucional 103, aprovada em 2019, que ignora direitos básicos daqueles que ingressaram no serviço público sob a justa expectativa de que seriam respeitados pela Administração Pública. A isso, a doutrina e a jurisprudência denomina de “proteção da confiança”, que impede o Estado de frustrar as expectativas legítimas que ele mesmo criou ao longo do tempo, e que violam direitos fundamentais dos cidadãos, como são os direitos previdenciários e outros previstos no art. 6º da Constituição Federal. 


*Este conteúdo é de responsabilidade do autor e não representa, necessariamente, a opinião do Diário de Uberlândia.

 
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