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18/06/2017 às 05h37min - Atualizada em 18/06/2017 às 05h37min

O custo da inação

ALEXANDRE HENRY ALVES* | COLUNISTA

É possível que você já tenha ouvido falar do TED, uma organização sem fins lucrativos que promove palestras para difundir ideias interessantes, das mais variadas áreas. Se você não conhece, acesse o site e seu acervo de milhares de palestras muito legais, tudo de graça e boa parte com legenda em português. É como se você tivesse à sua disposição conselhos das pessoas mais interessantes de todo o mundo, sobre quase todas as áreas de conhecimento. Enfim, é um acervo fabuloso. Quase sempre que eu paro para ver alguma palestra, o saldo é bastante positivo.

Isso aconteceu na semana passada. Assisti a uma palestra de um sujeito chamado Tim Ferriss, cujo título é por si só provocativo: "Por que você deveria definir seus medos ao invés de seus objetivos?". Dentre as várias coisas que ele falou em sua rápida exposição, duas me fizeram refletir bastante.

A primeira delas foi uma frase do filósofo Sêneca, segundo o qual "nós sofremos mais em nossa imaginação do que na realidade". Em resumo, o bicho é mais feio na nossa cabeça do que ao vivo. É por isso que a gente não entende como muita gente que está em uma situação aparentemente trágica, como o tratamento de um câncer, parece muito mais tranquila do que seria de se supor.

O problema de sofrermos mais em pensamento do que realmente sofreríamos de verdade é que tal comportamento leva à inação, outro ponto trabalhado por Ferriss em sua palestra. O medo é o grande muro à nossa frente. Quem nunca deixou de fazer algo por medo? Quase sempre, a gente coloca na balança qual é o preço (negativo) caso escolha um caminho diferente do atual. E se eu pedir demissão para procurar outro emprego, será que não vou ficar desempregado muito tempo e vou passar fome? E se eu terminar esse relacionamento, será que a dor da separação não vai me deixar maluco? E se eu comprar esse pacote de viagens, o que isso vai atrapalhar no meu orçamento? Em resumo, a gente vai colocando na balança os pontos negativos da mudança, tudo embalado pelos nossos medos e, em muitos casos, o lado negativo da balança fica tão pesado que a única escolha racional parece ser a de deixar tudo como está. Mais uma vez, eu pergunto: quem nunca passou por uma reflexão assim e acabou deixando de lado uma ideia que teve, só por medo dos pontos negativos que a mudança poderia proporcionar?

Volto à palestra de Ferriss. Ele fala de algo bem interessante, o segundo ponto que me fez refletir, que é o preço de não se promover aquela mudança. Esse preço, a gente quase nunca coloca na balança, até porque ele nem sempre é tão claro. Mas, é preciso sopesar, sim, o custo da inação, que nada mais é do que o conjunto de coisas boas que a gente perde simplesmente para tentar manter o status quo. Há alguns anos, eu e a minha esposa largamos o conforto de estar perto da família e dos amigos para ir morar no Norte do país, após ela ser aprovada em um concurso. Teve gente que nos criticou por isso, dizendo que o custo daquela mudança não compensava. Arriscamos. Na balança, pensei eu na época, caberia pesar o custo de deixar tudo como estava e ele era muito grande, pois significava a continuidade da minha esposa em uma situação de instabilidade profissional e financeira. Só isso nos bastou para considerar que os medos em relação à mudança não seriam maiores do que as perdas que teríamos se continuássemos no conforto do Triângulo Mineiro. Hoje, olhando para trás, eu vejo que o custo da inação seria muito maior. Além da estabilidade profissional e financeira, teríamos perdido também uma experiência fantástica de morar na região amazônica, teríamos perdido as novas amizades que fizemos por lá, os passeios, o crescimento cultural e interior, enfim, perdas muito maiores do que aquelas provocadas pela mudança em si, que praticamente não trouxe nada de negativo.

Nessa mesma linha, a palestra me fez pensar da maior canoa furada em que já embarquei profissionalmente, que foi a abertura de uma escola de línguas há vinte anos, a qual me deu um prejuízo financeiro gigantesco. Até hoje, guardo certo arrependimento daquela decisão. Mas, após as palavras de Ferriss, comecei a pensar na experiência e na maturidade que eu ganhei com aquela empresa que quase me levou à falência. Até que ponto isso não compensou o lado financeiro?

Enfim, avaliar o custo de deixar tudo como está é essencial quando se vai tomar uma decisão. Uma lição simples, mas que a gente quase nunca dá a ela a importância devida.

(*) Juiz Federal e Escritor - www.dedodeprosa.com

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