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17/04/2021 às 09h55min - Atualizada em 17/04/2021 às 09h55min

A culpa é do brasileiro

ALEXANDRE HENRY
Há pouco tempo, fui a uma movimentada farmácia perto da minha casa. Os números da pandemia em Uberlândia estavam em seu auge e eu pensei no quanto era arriscado trabalhar em um lugar daqueles, com um vaivém incessante de gente, muitas delas claramente doentes. Perguntei então à farmacêutica que me atendia sobre os casos entre os empregados de lá e, para a minha surpresa, ela me disse que nenhum deles havia contraído ainda a COVID-19. Sorte? Não. Ninguém entrava ali sem máscara e nenhum empregado ficava, em momento algum, com nariz ou boca sem proteção.

Definitivamente, a máscara é o meio mais simples e barato para se evitar transmissões do vírus. Usada corretamente e em tempo integral quando se tem contato com outras pessoas, ela fornece um nível de proteção já comprovado cientificamente. Aliás, aparatos semelhantes já eram utilizados antes de Cristo, sendo que o pessoal da área de saúde há muito tempo sabe que se trata de um equipamento de proteção individual indispensável.

Mas, mesmo sendo algo simples, barato e eficaz, mesmo estando no meio de uma pandemia, parte gigantesca da população brasileira simplesmente não usa máscara ou não o faz da forma como deveria. Na semana que se passou, depois da minha filha ficar a tarde inteira fazendo aula diante do computador, decidi levá-la à Praça Sérgio Pacheco para tomar um pouco de ar fresco. Descemos os dois do carro já usando nossas máscaras, mas tivemos que permanecer no centro da praça, em um local em que o mato estava até um pouquinho alto. A razão? Quem conhece a pista de caminhada daquela praça sabe o quanto ela é estreita. Pois havia dezenas, talvez centenas de pessoas caminhando ou correndo, a maior parte sem máscara ou com ela sem cobrir o nariz. Na quadra de basquete, cerca de trinta jovens se revezavam jogando, todos sem máscara, todos com o contato direto e constante que esse esporte exige. Em outro canto, três dezenas de pessoas, mais ou menos, faziam musculação ao ar livre, metade delas sem máscara.

Fiquei pouco tempo ali, tentando evitar essa insanidade, até que decidi voltar para a minha casa. No caminho, passei de carro perto de uma pequena praça no meu bairro. Eu sempre me espanto com a quantidade de pessoas por lá, mas nesse dia estava pior. Acho que havia pelo menos umas cem pessoas naquele espaço tão reduzido, quase todas sem máscara. Para piorar, uma rodinha de vizinhos tinha se formado e um senhor, lá pela casa dos seus sessenta anos, tocava violão para todos na maior altura.

No dia seguinte, pouco antes do sol ir embora, fui dar uma volta de bicicleta. Era hora do fechamento de muitas empresas. Por isso, havia muitos empregados em portas de lojas, oficinas e coisas do gênero. Como regra quase absoluta, eram rodinhas de três ou quatro pessoas sem máscaras.

Isso explica, ao menos em parte, o desastre da pandemia no Brasil. Se todo mundo tivesse feito um pacto de só ficar sem máscara diante das pessoas que moram em suas próprias casas, poucas restrições provavelmente teriam que ter sido adotadas. Mas, o sujeito fica sem máscara quando está do lado de fora da empresa, conversando com os amigos. Aí, esses amigos também ficam sem máscara quando vão praticar esportes ou mesmo em um momento de lazer em praças movimentadas. As pessoas que estão na praça ficam sem máscara não só perto de quem mora na casa delas, mas também de alguns familiares próximos. De galho em galho, o vírus vai pulando em uma velocidade macabra.

O sociólogo Max Weber há muito já apontava os caminhos pelos quais as pessoas acolhem ordens. Há o caminho da lei. Nós temos isso em relação às máscaras durante a pandemia, mas leis dependem de fiscalização e punição, que praticamente não existem no Brasil. Weber também dizia que as pessoas seguem ordens por conta da tradição, algo bem ligado à moral. Ora, não temos a tradição de usar máscaras e, pior do que isso, o brasileiro tem a tradição de não seguir regras. Por fim, Weber falava também no carisma das pessoas de destaque, o que faria com que o comportamento dessas pessoas fosse replicado pelo povo. Nesse aspecto, quem deveria dar o exemplo de uso de máscara no nosso país faz justamente o contrário.

Em síntese, se Max Weber analisasse a situação do Brasil nessa pandemia, no tocante ao uso de máscaras, ele diria que não temos solução, pois tudo conspira para que mergulhemos mais e mais nessa tragédia chamada COVID-19, especialmente naquilo que seria mais simples e banal para diminuir o horror que estamos vivendo desde o ano passado.
 



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