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26/02/2021 às 09h00min - Atualizada em 26/02/2021 às 09h00min

​Sexta-feira louca

WILLIAM STUTZ
Beleza. Seis e meia da manhã me levanto com ideia pronta, história montada em sonho. Parece que via o contar concluído. Sabe que horas são agora exatamente? Te conto. São 13:34 e só saíram 26 palavras. Para ser mais exato foram 27 palavras, ou melhor, cento e cinquenta e cinco caracteres com espaço, pois aqui cada toque conta e com razão imagina o trabalhão que dá editar uma página de jornal! Contudo, a história ainda estava bem viva na ideia, mas por pouco tempo. Culpa de quem? Da tecnologia que tanto prezo.

No tempo que se seguiu, a cada segundo sofrido que passava como por encanto, entendi com clareza absoluta a definição mais preciosa da diferença entre hardware e software.: Software é aquele que você xinga e hardware é aquele que você chuta”. Juro que me deu vontade de fazer os dois. Explico.

Pique total, ligo o notebook... Isso mesmo. Três pontinhos de espera, espera e espera. Resmungo, me ajeito na cadeira, tamborilo os dedos tentando manter a calma e fixando o pensamento já meio destorcido do original. Demora mil, sai o primeiro xingamento baixinho e pouco ofensivo. Mas que merda é essa?! Perdi o controle. Vem a mensagem na tela como resposta. Algo assim: “não foi possível concluir as atualizações desfazendo alterações que não foram feitas” Maledeto! Resmungo arrepiado. Princesa, até então em profundo sono, me olha sem levantar a cabeça, balança as orelhas. Penso que ela me disse sem falar: Calma...

Calma coisa nenhuma. A história já havia se desfeito em mil pedaços, letras espalhadas por todo canto da mesa e de minha cabeça. Poeta Vinicius, eu também pergunto: “Se foi pra desfazer porque é que fez?” Não tenho violão, meu Neruda (Confesso que vivi) foi “emprestado” e não voltou. Certo. Acha que acabou meu martírio cibernético? Pois vai pensando. Pelo celular busco ajuda no site da... não vou me dignar a falar o nome Microsoft e Windows aqui. Bom, aí começa a parte dois da manhã, que me vai escapando. Mandaram que eu apertasse a tecla Shift e o F8 ao mesmo tempo e, com outro dedo, pressionasse o botão “Ligar”, segurando-os até reiniciar. Já repararam que a tal shift é a única que não tem o nome escrito nela? Só pode ser proposital.

Meu palmo não pega uma oitava no teclado de um piano, então dá para imaginar a ginástica que tenho que fazer para apertar tanta coisa ao mesmo tempo. Penso comigo, ali parado em posição mais louca do que as do kama sutra, se mandar apertar outra coisa juro que perco a Brahma e parto pra briga. Questão de honra. Repito a ação contorcionista três vezes, por ordem do site. Sabe o que resolveu?  Nada!!!!

Irritado pego de canto de olho uma informação que tinha passado batida, tipo assim: Se nada disso resolver tente restaurar o trem todo de uma vez. Sigo excessivamente dócil para meu gosto as instruções. Após alguns malabarismos, teclas e acesso a locais que nunca nem pensava em entrar, cheguei lá. Agora pode restaurar, me avisa a máquina. Porém, também já me dá um alerta (acho que sacou que estava prestes atirá-la pela janela): “Olha, esse processo pode demorar um pouco...” Um pouco deles? Sei como é. Vamos nessa. Na tela mil palavras e um 1% seguido de três pontinhos...

Bom, saio da sala, tomo meu banho, nem mais tão matinal assim e desço. Marilinha já tinha feito café há muito tempo. Ao me ver escrever cortou volta, pois me conhecendo sabe que sou de zero prosa nessas horas. Nem “tchau vou treinar” me deu e nem me chamou para acompanhá-la. Sábia! A única que me atura nessas horas é Princesa. Em seu profundo sono de bicho noctívago, o mundo que se acabe em sonhos felinos, deve pensar.

Café tomado, subo a tela, que me mostra 5%... Em suspiro profundo e já sem história para contar resolvo cuidar da vida, com reclusão imposta por fase vermelha e nada de vacina nada me resta. Cuidar das plantas, fazer mudas de ora-pró-nobis com galhos da vizinha, pensar o almoço. Subo a ver tela, nisso já se foram horas e olha que minha internet é veloz, embora eu não acredite que receba todos os megas que contratei. Penso que muitos devem se perder ao longo do caminho das fibras óticas, mas míopes. Sei lá, não posso afirmar. Além do que, esses medidores de velocidade aos quais temos acesso não são lá confiáveis. Primeiro sorriso do dia. A mensagem me conta que o computador logo vai reiniciar. Alvíssaras, no árabe al-buxra!

Agora sento e espero. Gira, gira e gira. Consome mais meia hora quem sabe.  Tela principal se abre bela e iluminada, entrelaço dedos, abro palmas das mãos aberta para estalar todos os ossos possíveis da mão e tirar a sensação das posições quase eróticas que o teclado me forçou.

O dia não era para dar certo. Uma vez aberta a tal, uma janela surge como a nave USS Enterprise brotando do espaço profundo: Não foi possível restaurar o Windows e em seguida: Desfazendo as ações. Não, o espaço não é a fronteira final, a fronteira final é minha. Santa paciência! Desliguei tudo na bruta. Fechei tudo.

Busquei minha velha máquina de escrever Remington modelo Holiday, presente de mãe. Tirei o pó e agora peço licença, pois vou ver se encontro fita para ela no Amazon Shopping. O mais difícil será achar um mecanógrafo para colocá-la macia para trabalhar novamente com a vantagem de já imprimir enquanto se digita.

Tecnologia é muito bom, mas...

Ah e clamo a público “devolva o Neruda que você me tomou e nunca leu” Viva Chico!



Esta coluna é de responsabilidade do autor e não representa, necessariamente, a opinião do Diário de Uberlândia.
 
 
 
 
 
 
 
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