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06/02/2021 às 08h15min - Atualizada em 06/02/2021 às 08h15min

Vamos conversar mais um pouco

IARA BERNARDES
Semana passada houve um rebuliço com o texto sobre o retorno às aulas e como o assunto rendeu, quero propor um pouco mais de diálogo acerca desse tema. Continuo com meu posicionamento a favor do retorno das aulas, no entanto, ao me reunir com a equipe da minha escola, na qual desempenho a função de professora de educação infantil, algumas preocupações me acometeram acerca do protocolo de retorno para esse público de 0 a 3 anos.

Não é sobre virar a casaca, voltar atrás e querer fazer média, mesmo porque quem me conhece sabe que não sou dessas, falo o que penso e para chegar ao ponto de publicar é sinal de que acredito mesmo no que estou comunicando aos meus leitores e mais uma vez eu grito: precisamos voltar! Por todos os motivos explanados semana passada. Mas, ainda assim é necessário repensarmos algumas coisas.

Por isso, quero apresentar alguns pontos, referentes à Educação Infantil, que achei um tanto vagos na Cartilha de Retorno às Aulas apresentadas pelo comitê de enfrentamento ao Covid-19 de nossa cidade:

Na página 3 da Cartilha a instrução é que haja distanciamento mínimo de 1 metro entre cada pessoa. Porém, estamos falando de crianças de colo, que precisam de cuidados próximos, como acolhimento em forma de contato físico, trocas de fraldas, banho e higienização de maneira geral.

Consultando a página 4, o escalonamento prevê 50% da turma, podendo reduzir a menos que isso. Essa parte eu entendi, porém, caso façamos o escalonamento semanal proposto pela SME (secretaria Municipal de Educação) e ainda considerarmos esse percentual, algumas turmas deverão fazer rodízio com número bem menor que 50%, já que várias unidades escolares possuem salas bem pequenas. Acredito que esse item precise ser revisto e mais bem orientado nas reuniões previstas para as primeiras semanas de fevereiro.

Na página 10, item 6, referente especificamente à educação infantil está “Reestruturar a organização das salas de aula de forma a minimizar os riscos de contaminação”. Concordo que a reestruturação das salas seja algo necessário, no entanto, nos referimos a crianças que engatinham e estão aprendendo a andar, além dos que já concluíram a etapa de aprendizagem da marcha e saem correndo por aí a fim de descobrir e explorar o mundo.

Itens 7, 8 e 9 respectivamente apresentados na página 10 da Cartilha: Utilizar recursos lúdicos para sinalizar o distanciamento; Utilizar recursos artísticos e lúdicos para ensinar sobre higiene pessoal e etiqueta respiratória; Realizar brincadeiras como mímica, corrida de obstáculos, entre outras, sempre mantendo o distanciamento. Mais uma vez eu digo, são crianças muito pequenas que não entendem sinalização de distanciamento, além de precisarem de cuidados próximos, tanto acolhimento emocional com a separação dos seus cuidadores, quanto à sua segurança e bem-estar. Me parece surreal falar em recursos “lúdicos para higiene pessoal e etiqueta respiratória” para crianças que babam sem parar, usam chupeta, mamadeira e não se limpam sozinhas. Talvez nos agrupamentos de 2 e 3 anos seja mais realista esse cenário, mas para as crianças menores é algo impossível de ser seguido.

Item 13: Organizar colchonetes observando o distanciamento mínimo e de forma invertida – pés e cabeças alternadamente. Aqui mais uma vez temos que considerar a possibilidade de escalonamento menor que 50% por turma, devido ao tamanho de algumas salas, por isso é necessário olhar a realidade de cada unidade escolar.

Não permitir que a criança traga brinquedos de casa para a escola. Esse é o item 15 da página 10, no qual eu me pergunto a respeito dos objetos de apego que crianças dessa idade costumam ter. Para quem não sabe, algumas crianças carregam consigo objetos de segurança, dos quais elas transferem emoções e se sentem mais protegidos ao os terem perto de si, muito comum em caso de separação de seus cuidadores. Esses objetos costumam ser grandes aliados no período de adaptação escolar, logo, devemos pensar em soluções para que esses brinquedos, fraldinhas, ursinhos, ou qualquer item de apego possa ser deixado com a criança.
 
E por fim, a Cartilha pede que a escola envolva as famílias na preparação do retorno. Nesse caso, não vejo essa possibilidade com tanta facilidade, pois as famílias não foram preparadas para esse momento, tanto como os profissionais. Estamos todos inseguros e essa preparação pode levar um tempo, apesar de saber que o envolvimento familiar é importante em QUALQUER circunstância quando se trata da educação.

Encerrando, novamente quero me colocar a favor do retorno às atividades escolares, mas é necessário pensarmos em todos os aspectos inerentes a esse contexto, principalmente em casos como a educação infantil que exige tanta proximidade entre profissionais e crianças. Falei muito sobre o cuidado com a saúde mental dos pequenos e é inevitável levantar a bola novamente. O retorno precisa acontecer, mas de maneira saudável, principalmente para que mais traumas não ocorram nessa faixa etária. Carinho, atenção e acolhimento são os fatores mais importantes nesse momento e negar um abraço e colo aos pequenos, que nada entendem do que há de errado no mundo, pode ser decisivo entre termos crianças emocionalmente saudáveis ou não.

Sendo assim, gostaria de sugerir que os protocolos sejam revistos, quem sabe o retorno gradativo, atendendo inicialmente crianças maiores, que já entendem o risco do Corona vírus e à medida que as vacinas forem disponibilizadas, haja o retorno dos menores. Ou quem sabe, um escalonamento diário para essa faixa etária, visando reduzir ainda mais a quantidade de alunos em sala, mas ainda assim atendendo algumas demandas sociais. Outra solução poderia ser a antecipação da vacinação aos profissionais da educação. Enfim, não cabe a mim estabelecer protocolos, mas a propor reflexões que nos incentive a pensar pela visão do outro e pelas dores que muitas vezes não são as nossas.


Esta coluna é de responsabilidade do autor e não representa, necessariamente, a opinião do Diário de Uberlândia.
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