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29/02/2020 às 08h00min - Atualizada em 29/02/2020 às 08h00min

Você vai entender...

IARA BERNARDES

“Quando você tiver filhos, você vai entender”. Quem nunca ouviu essa expressão na infância? Acredito que se não foi todo mundo, a maioria esmagadora se encaixa na resposta afirmativa. Confesso que quando era criança e ouvia essa frase, até arrepiava de raiva, pois para mim era apenas uma desculpa para os nãos e meu ego se quebrava em mil, fazendo brotar uma frustração enorme. Mal sabia eu que essas 6 palavras ecoariam na minha mente absolutamente todos os dias depois que me tornei mãe.

Vira e mexe me pego pensando: bem que minha mãe me avisou, agora eu entendo. Com isso penso o quanto os filhos podem ser ingratos, seja na infância, juventude ou vida adulta. Quantos de nós repudiamos o que nos foi ensinado e apenas apontamos o dedo para o que julgamos termos sofrido pelos “caprichos” nossos pais? Ou pensamos nos momentos de negativa parental como algo desnecessário que nos foi tirado? Até mesmo o contrário, a liberdade exagerada que colhemos os frutos nas vivências atuais? O que quero dizer é que, muitas vezes, estamos prontos a julgar e condenar nossos pais pelas frustrações que passamos no passado, sem refletir em tudo o que eles fizeram e fazem para o nosso bem estar.

Essa semana a Maria, minha filha mais velha, chamou sua melhor amiguinha para um grito de carnaval na escola de ballet. Tudo certo, presença confirmada, empolgação total por passar momentos alegres com a amiga, até que uma hora antes do evento, recebo uma mensagem da mãe informando que não poderia levar a menina. Já sabia que ela ficaria triste, mas fui lá dar a notícia enquanto ela tomava banho para sairmos. Ao anunciar que houve um imprevisto e a colega não iria mais, o rosto dela já se encheu de tristeza, os olhos lacrimejaram e em meio às gotas do chuveiro a primeira lágrima escorreu. Rapidamente falei que a vida é assim mesmo, que imprevistos acontecem e que ela poderia ir para brincar com as colegas da turma. Ela pensou um pouco, segurou o choro e disse: “mas todo mundo vai levar uma amiga, eu não tenho quem levar, não dá mais tempo de chamar ninguém.” Suspirei e pedi para ela terminar o banho, assim tentava ganhar tempo para pensar com calma. O que não esperava é que logo em seguida eu ouviria aquele choro abafado pelo barulho do chuveiro, um choro doído de frustração e decepção, um choro que doeu na minha alma como nenhum outro já havia doído. Não costumo passar a mão na cabeça dos meninos, pois sei que a vida não poupa, imprevistos realmente acontecem e nem sempre as coisas sairão com esperamos, mas confesso que aquele choro doeu demais.

Não dava mais tempo de chamar ninguém, correu uma lista na minha cabeça, mas o tempo passara depressa e nos restava apenas meia hora, até que veio uma solução para melhorarmos a situação. Tirei ela do banho e perguntei se eu poderia ser a amiga dela, se poderíamos dançar ballet juntas naquele dia – fazemos aula de dança na mesma academia e no mesmo horário, mas, obviamente, em turmas diferentes. Os olhos dela se iluminaram, ela enxugou as lágrimas e fomos nos arrumar para partilhar desse momento juntas. Dançamos, brincamos, nos abraçamos e fizemos de um imprevisto triste uma lembrança maravilhosa para ambas.
Com essa experiência comecei a refletir sobre todas as vezes que briguei com meus pais ou não concordei com as decisões que eles tomavam em relação a mim e aos meus irmãos. Então percebi quanto injusta fui, pois junto desses pensamentos, vieram as reflexões acerca de vários momentos que eles tiveram que disfarçar suas tristezas, medos e incertezas e se fantasiaram de pierrô e arlequina para fazer dos episódios difíceis verdadeiros carnavais alegres para mim e meus irmãos. E você, já parou para pensar o quanto seus pais se sacrificaram por você para transformar momentos de dor em lampejos de felicidade enquanto você estava ali a julgar como eles eram capazes de fazer seu ego se rebaixar um pouco?

A maternidade muitas vezes nos obriga a viver no stress, mas compete a nós amadurecer e tentar vestir a camisa NO STRESS para prosseguir com tranquilidade e transformar momentos que nos parecem desastrosos em lembranças simples e significativas.

*O conteúdo desta coluna é de responsabilidade do autor e não representa, necessariamente, a opinião do Diário de Uberlândia.













 

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