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19/02/2018 às 05h19min - Atualizada em 19/02/2018 às 05h19min

Luciano Huck e a política

ALEXANDRE HENRY ALVES* | COLUNISTA

Antes de mais nada, vamos deixar algo bem claro: este texto não tem o objetivo de defender que Luciano Huck seria um bom presidente para o Brasil ou que ele é uma boa pessoa, apesar de passar essa impressão. Feita a ressalva, vamos lá.

Luciano Huck desistiu de ser candidato à presidência – acho que agora todos já devem saber disso. Sua candidatura não seria inédita no mundo, bastando lembrar que Ronald Reagan, presidente americano na década de 1980, era ator de Hollywood. Há vários casos assim, como o de Arnold Schwarzenegger, que foi governador da Califórnia, e até Donald Trump, atual presidente americano, que era apresentador de TV, além de empresário. Enfim, alguém sair das telas para se sentar na cadeira de dirigente estatal não é novidade. Aliás, ao contrário das muitas críticas que ouvi sobre a candidatura de Huck, o fato de um artista ou pessoa famosa se tornar político não significa que certamente será um político ruim. O citado Ronald Reagan, por exemplo, é visto como um grande presidente. Claro, tem o Trump também, mas isso a gente deixa para outra hora, até porque só o tempo é capaz de dizer se alguém foi bom ou ruim na direção de um país.

Voltando ao Luciano Huck, ele tinha chances razoáveis de ser eleito, dado o vácuo de nomes fortes à direita e à esquerda, bem como o fato dele ser nacionalmente conhecido e, ao menos pelo que se saber, não estar envolvido em escândalos de corrupção.

Huck, porém, desistiu, mesmo tendo muita vontade de concorrer e sabendo que poderia ganhar. Pesaram contra a sua candidatura vários fatores, sendo o maior deles a perda da remuneração na Globo, que atingiria a sua esposa também. Tudo bem que um cargo eleitoral não é o caminho para ganhar muito dinheiro, embora parte considerável dos políticos consigam essa façanha, mas o fato é que a remuneração realmente não é das mais chamativas para quem realmente é capaz e bem sucedido profissionalmente, destacando-se da multidão. Você pode até dizer que minha fala é um absurdo em um país no qual o salário-mínimo não chega a 1/30 da remuneração do presidente. Ocorre que as melhores cabeças do país não ganham R$ 954,00 por mês. As pessoas que são líderes na iniciativa privada recebem, em geral, valores muito acima do que um presidente brasileiro ganha. Enfim, se for pela remuneração apenas, de forma honesta, ninguém de grande sucesso no mundo profissional anima ser presidente do Brasil.

Mas, deixemos o salário de lado, já que é quase unanimidade a ideia de que um cargo público não deve ser ocupado por quem quer ganhar muito dinheiro. Eu falava que vários fatores haviam influenciado na desistência de Huck. Entre eles, a questão do fim da privacidade. Uai, mas artista já não passa por isso? – você me pergunta. Sim, passa. Só que não no nível de um político candidato a presidente. Aqui, quando falo do fim da privacidade, falo do lado ruim desse fato. Falo de escancararem a sua vida em busca, quase somente, dos podres que você pode ter. E, se não há algo que seja realmente podre, vão fazer parecer que é. A questão do jatinho que o Huck comprou, por exemplo. Foi financiado por um programa do BNDES, na época do governo de Dilma, que buscava estimular a indústria nacional. Não foi Huck que criou esse financiamento a juros baixíssimos. Mas, o fato dele ter comprado um avião com essa linha de crédito já serviu de bombardeio dias atrás, dando a entender que ele tinha feito coisa errada.

Vamos além. Amigos próximos ou conhecidos distantes falaram publicamente que Huck não deveria se candidatar. Alguns disseram que não acreditavam que ele era capaz, mas muitos deixaram claro que ele, um cara bom (na visão dos amigos – eu não dei minha opinião sobre ele), não deveria se meter com esse negócio sujo de política. Quem é do bem e já pensou em entrar na política certamente ouviu a mesma coisa de amigos: é tanta sujeira nesse meio que ninguém quer que alguém de boa índole se envolva.

Dito tudo isso, e não ditos outros pontos por falta de espaço, a conclusão é que a política brasileira, infelizmente, só faz afastar as pessoas boas. Não sei se Huck era uma dessas, mas sei que muita gente extremamente capacitada nem chega a pensar na hipótese de se candidatar a um cargo público porque vai perder renda, vai ser alvo de notícias sujas e vai acabar sendo visto como apenas mais um dos bandidos da política nacional. Enquanto isso, os bandidos de verdade encontram espaço fácil nas urnas, já que para eles não interessa a remuneração direta do cargo (e, sim, a indireta), nem preocupam as notícias falsas ou as opiniões contrárias dos amigos. Conquistar o poder e suas benesses é tudo o que importa. Triste para o Brasil, triste para a democracia.
(*) Juiz Federal e Escritor - www.dedodeprosa.com
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