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15/04/2023 às 08h00min - Atualizada em 15/04/2023 às 08h00min

O medo da violência nas escolas e suas consequências

JOÃO LUCAS O'CONNELL
Nas últimas semanas, presenciamos episódios lastimáveis de atos de extrema violência praticados por adolescentes contra colegas, professores e funcionários em diferentes escolas primárias e secundárias pelo Brasil. Este tipo de ataque (em massa), que já foi comum em outros países do mundo, não era uma preocupação para nós, brasileiros, até poucas semanas atrás.

Agora, estudantes estão com medo de ir à aula, pais temem levar os filhos à escola, professores têm receio de permanecer nas salas. A sensação de insegurança no ambiente escolar é exacerbada e amplificada por publicações que têm circulado nas redes sociais anunciando novos ataques às instituições de ensino. Os recentes episódios de violência nas escolas e a propagação de boatos sobre falsos ataques podem ter desdobramentos ainda mais sérios para pessoas que já têm alguma forma de ansiedade ou para aqueles com maior propensão a desenvolver transtornos de ansiedade.

Embora os indícios apontem que esses conteúdos de ameaças sejam falsos, eles têm contribuído para gerar pânico. Sentir medo após os ataques recentes é natural, mas é preciso ficar atento às repercussões que a situação pode causar a longo prazo na saúde mental de crianças e adolescentes.

Estudos indicam que aproximadamente 20% das crianças e adolescentes brasileiros se sentem ansiosos pelo simples fato de irem à escola. Dificuldades de aprendizado, falta de interesse e, especialmente, dificuldades de relacionamento e medo de sofrerem “bullying” e violência física por outros colegas são os principais motivos alegados por aqueles que não se sentem confortáveis de irem à aula. Além do prejuízo a curto e médio prazo causados por esta ansiedade (menor capacidade de aprendizado e aproveitamento das aulas, aumento do número de faltas provocadas pelo medo), este transtorno também pode levar a traumas psíquicos e emocionais a longo prazo.

Crianças que sofrem vivências traumáticas gerais, como a que passam por desastres naturais ou presenciam violência, podem desenvolver transtorno de estresse pós-traumático quando adultos. Quando alguém passa por traumas durante a infância ou adolescência, a pessoa passa a entender que o ambiente onde vive é inseguro e se torna mais reativo a ele. Isso pode contribuir para um estado de hipervigilância e ansiedade.

É importante salientar que as recentes notícias sobre ameaças de ataques em escolas podem gerar ansiedade em todos. É uma sensação normal e considerada até benéfica. Quando estamos ansiosos tendemos a redobrar os cuidados contra outros males que também podem nos agredir.

Assim, a ansiedade contra a possibilidade de novos ataques deve trazer preocupações às autoridades sobre o planejamento de estratégias para aumentar a segurança nas escolas. Algumas escolas americanas, por exemplo, tiveram que implantar portarias com tecnologia para a detecção de metal (como é feita nos aeroportos) a fim de garantir a segurança de todos na escola. Outras tiveram que disponibilizar agentes de segurança para inibirem atos de violência. São exemplos de como a ansiedade pode trazer antecipação e uma forma de cuidado extra para nos protegermos.

Portanto, é normal que todos nós soframos com a ansiedade, mas quando ela interfere na qualidade de vida, no desempenho e na rotina do dia a dia e traz dificuldades familiares, interpessoais, redução de desempenho na escola ou no trabalho, vira um transtorno e precisa ser tratada. Pais que se negam a levar seus filhos para a escola também seria um exemplo de repercussão exagerada desencadeada por dois fatores: o fato concreto, que são os episódios de violência com morte dentro das escolas que aconteceram recentemente, e os boatos, que geraram ansiedade em excesso.

Os especialistas indicam que a abordagem do filho que está ansioso em ir à escola deve variar de acordo com o grau de desenvolvimento que ela está na vida. Mas uma conduta básica que se deve ter com qualquer criança  ou adolescente é você o diálogo. Informar os acontecimentos e ameaças virtuais até onde vai a curiosidade delas. Ou seja, se ela te pergunta por que tal coisa aconteceu, você não precisa contar todos os detalhes da história para a criança, mas, sim, falar sobre os dados da realidade. Os detalhes dos crimes bárbaros e as diversas ameaças recebidas em grupos de conversas virtuais também não devem ser compartilhadas com os filhos. Se os filhos receberem as mensagens de ameaça, a discussão sobre fake news e probabilidade real de novas tragédias deve ser discutida com os filhos.

É importante falar sobre o assunto, mas sempre baseado no que a criança ou adolescente já sabem sobre ele. Para crianças menores de quatro anos, por exemplo, que não têm a devida dimensão dos fatos e que não recebem ameaças virtuais compartilhadas em grupos de conversa, não vale a pena abordar o assunto.

Se você ou principalmente o seu filho apresentam medo ou dificuldade importante a ponto de prejudicar a assiduidade ou performance da criança na escola, procure ajuda especializada. Um acompanhamento de perto por profissionais especialistas pode ser muito benéfico. O acompanhamento psicológico, em especial, busca favorecer ao paciente a elaboração dos traumas e visa minimizar seus impactos na vida adulta. A psicoterapia também auxilia o paciente na identificação de outros estímulos de ansiedade e estresse, reduzindo o estado de ansiedade.



*Este conteúdo é de responsabilidade do autor e não representa, necessariamente, a opinião do Diário de Uberlândia.
 
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