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22/10/2022 às 08h00min - Atualizada em 22/10/2022 às 08h00min

Um Brasil intolerante e dividido faz mal à saúde!

JOÃO LUCAS O'CONNELL
Nas últimas décadas, a população brasileira tem, a cada quatro anos, se dividido na hora de escolher o seu presidente. Desde as eleições presidenciais de 1989, esta polarização entre a escolha de dois candidatos principais vem se tornando rotina. Desde esta época, a polarização tem ficado sempre entre um candidato representante de uma linha mais ligada à intervenção estatal na economia (denominada de esquerda pelas mídias sociais) e um candidato mais favorável à liberdade econômica e menor grau de intervenção estatal (denominada direita). Foi assim nas últimas 8 eleições ocorridas desde então! Entretanto, esta divisão nunca foi tão gritante e evidente como a eleição deste ano, agendada para o próximo dia 30.

É muito certo que a Internet e o grande grau de penetração das mídias sociais no Brasil nas últimas décadas colaboraram, em muito, para o acirramento desta polarização. O debate diário sobre as duas principais candidaturas têm dominado a maioria das rodas de conversas na rua, no trabalho, nos lares, no rádio e televisão e, principalmente, nos diversos tipos de redes sociais. O grau de polarização este ano atingiu um extremo de rivalidade que não era tão exacerbado nas outras eleições. Para a infelicidade da nação, a disputa na escolha da melhor opção para governar o país não envolve mais o debate de ideias e propostas, mas sim ataques enfurecidos dos dois lados. São, em geral, ataques à honra, capacidade intelectual e questionamentos quanto à competência mental e física dos candidatos a presidente. 

A campanha deste ano intensificou o uso do ódio, das “fake news”, da divulgação de falas retiradas de contexto e de exploração das graves falhas de comunicação e frases infelizes ocorridas por parte dos dois candidatos. Palavras mal colocadas pelos candidatos em uma entrevista ou num debate foram extremamente utilizadas e exploradas pelos apoiadores do adversário. Para piorar, o que antes era papel de um grupo pequeno de apoiadores, passou a ser tarefa de milhões e milhões de brasileiros. Com um vasto material disponível na internet e um editor de vídeo na mão, milhões de brasileiros se sentiram na obrigação de tentar favorecer o seu candidato. Na grande maioria das vezes, a “ajuda” veio através da criação de conteúdo odioso e do ataque sistemático à honra e caráter do candidato oposto. 

Para muitos, o debate político não é mais sobre duas linhas diferentes de conduzir as principais políticas do governo, mas sim, transformado numa verdadeira luta entre entre o bem e a virtude (o meu candidato) e o mal e diabólico (o candidato adversário).  Não houve espaço para a moderação. As discussões sobre propostas foram sempre rapidamente encerradas pela aversão, antipatia e intolerância da maioria das pessoas pelo candidato do outro. Muitos desenvolveram um medo exacerbado pela possibilidade do candidato adversário vencer as eleições e governar o país. Alguns já pensam, inclusive, em mudar de vida ou desistir de projetos pelo simples fato do candidato da oposição vencer o pleito. 

A intenção de voto do Brasil está, hoje, dividida exatamente ao meio! Metade da população deseja um candidato e a outra metade, o outro. A divisão não é tão milimétrica quando se analisa subgrupos. Entre os mais ricos e produtivos (agropecuaristas, industriários, empresários), prevalece o candidato mais liberal. Entre os mais pobres e que se usufruem das instituições e serviços públicos (universitários, usuários do SUS, beneficiários de programas de auxílio governamental), o outro candidato parece melhor... A divisão também não é tão exata entre os gêneros, com os homens preferindo claramente um e as mulheres e homossexuais o outro candidato. Os idosos preferem um e os mais jovens o outro. Entre diferentes regiões do país, a diferença também existe, com a maioria das regiões preferindo o candidato à reeleição e o Nordeste preferindo o ex-presidente. 

A discussão de propostas para a economia, saúde, educação, meio ambiente e segurança pública ficou em segundo plano. Infelizmente, o teor e a intenção da maioria das propostas dos candidatos foram rapidamente transformados pelo radicalismo do observador. Prevaleceu o debate ideológico. Mais do que isso, prevaleceu a escolha por qual seria a pauta mais importante para cada um. Para metade da população, prevaleceu a escolha pela pauta anticorrupção; fortalecimento da segurança pública (e pelo direito individual ao acesso facilitado a armas de fogo); da eficiência administrativa, em especial, das empresas estatais; de uma menor intervenção do Estado na economia; da desburocratização da máquina pública; do fortalecimento dos valores cristãos; da diminuição dos impostos e outras... Para outros, a necessidade do fortalecimento de outras pautas prevaleceu: de uma maior ênfase e participação do governo no controle da economia, da necessidade de um fortalecimento das instituições públicas (SUS, Universidades...) que, logicamente, demandarão aumento de impostos que permitam a expansão dos serviços e benefícios prestados; uma maior tolerância quanto à questões culturais polêmicas como a ideologia de gênero e o aborto; uma maior tolerância quanto à diversidade cultural e religiosa; uma defesa mais contundente do meio ambiente, dentre várias outras questões igualmente polêmicas e divergentes. 

Independente de quem vai vencer as eleições, sairemos do debate fragilizados. A campanha presidencial expôs nossas diferenças ideológicas, nossas diferentes maneiras de ver o mundo e de enxergar o que acontece no país. Mas, muito mais do que isso, expôs nossa dificuldade de tentar entender a visão do outro e a intolerância de querer impor ao outro, a nossa maneira de pensar e de enxergar o mundo. Independentemente de quem vença o pleito, nós perdemos enquanto nação. Nos tornamos menos civilizados e muito menos tolerantes nos últimos meses. E, o que isso tudo tem a ver com saúde? É que esse modo intolerante de ver a vida e o desrespeito à opinião do outro faz muito mal ao corpo e a alma... 



*Este conteúdo é de responsabilidade do autor e não representa, necessariamente, a opinião do Diário de Uberlândia.
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