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10/09/2022 às 08h00min - Atualizada em 10/09/2022 às 08h00min

Como novos fármacos são descobertos?

JOÃO LUCAS O'CONNELL

A maneira como é feita a descoberta de novas substâncias e moléculas que possam ser utilizadas na Medicina é bastante fascinante e curiosa! Existem várias formas diferentes utilizadas para o desenvolvimento de novos medicamentos. Em geral, a descoberta destes novos fármacos parte do entendimento do mecanismo fisiopatológico da doença e da tentativa de criação de uma molécula que seja capaz de interferir no processo causador da doença. Assim, os estudos começam pela tentativa de entendimento do processo de instalação e desenvolvimento da doença dentro de um laboratório, analisando as alterações histológicas e celulares envolvidas na agressão sofrida pelo organismo. De maneira similar, o desenvolvimento da molécula destinada a barrar o processo que iniciará ou perpetuará a doença também é feita dentro do laboratório. A partir da obtenção do fármaco potencialmente útil, parte-se então para a realização de estudos pré-clínicos (aplicação do novo medicamento em animais de laboratório) e, depois, em estudos clínicos (estudos em humanos), realizados em diferentes etapas. Todas estas fases de estudo são fundamentais para que se possa avaliar se a molécula desenvolvida é realmente segura e eficaz para o uso contra aquela doença. Mais recentemente, com a pandemia da COVID, todos presenciamos um enorme debate e desgaste que pode acontecer quando um grupo quer aprovar o tratamento para uma doença sem que estas fases de testes sejam realizadas. Sem estas etapas, fica muito difícil definir que um novo tratamento seja mais útil do que danoso. 

 

A grande maioria das drogas atualmente disponíveis para o tratamento das principais doenças existentes foi desenvolvida assim. Por exemplo: desde o início da sociedade moderna até o início do século passado, a maior causa de morte no mundo era por infecção. Assim, muitos indivíduos apresentavam um quadro infeccioso caracterizado principalmente por febre, fraqueza e queda do estado geral que antecedia um quadro de choque, falência de múltiplos órgãos e, consequentemente morte, após alguns dias. Essa era a evolução comum de muitos pacientes que eram diagnosticados com pneumonia, erisipela, infecções de pós-operatório ou pós ferimentos e outros. Apesar de que hoje o entendimento da instalação e progressão da doença infecciosa é muito óbvio para a comunidade científica hoje, não foi sempre assim... Um melhor entendimento da fisiopatologia das agressões ao organismo causadas pelas infecções, aconteceu somente após o desenvolvimento do microscópio óptico. Somente com a visualização e entendimento sobre os mecanismos de multiplicação dos microrganismos é que a ciência conseguiu entender boa parte dos mecanismos fisiopatológicos envolvidos com a agressão ao corpo provocado por microrganismos (vírus, bactérias, fungos). Somente após este entendimento é que foram desenvolvidas substâncias para a tentativa de inibir a replicação do microrganismo (foram desenvolvidos vários antivirais, antibióticos, antifúngicos nas últimas décadas). De maneira semelhante, também foram desenvolvidas substâncias para tentar diminuir ou amenizar a reação inflamatória do organismo provocada pela infecção (foram desenvolvidos anti-inflamatórios, corticoides, imunossupressores e outros). 

 

Assim, para se tentar descobrir medicamentos potencialmente úteis, pequenas doses do antibiótico (recém-criado) eram pingados em placas destinadas ao cultivo de bactérias. Se a substância testada fosse capaz de impedir o crescimento da colônia de bactéria ou, melhor ainda, capaz de reduzir a quantidade de bactérias nas placas de cultiva: Bingo! Uma nova substância promissora havia sido descoberta! O próximo passo, então, era administrar a droga descoberta a ratos infectados com a bactéria. Estes ratos doentes tratados com o novo antibiótico eram comparados com ratos doentes não tratados e, se o grupo de ratos tratados evoluísse de maneira mais adequada do que aqueles que não receberam a droga, a droga continuava a ser testada. O próximo passo então, era o desenvolvimento de estudos clínicos com poucas pessoas que receberiam a nova droga (para se testar a segurança de administração da medicação e para tentar achar uma dose que fosse apropriada para a maioria das pessoas). A partir da obtenção destas informações com os estudos clínicos iniciais, estudos maiores eram conduzidos para comparar a evolução de humanos que fossem receber a droga com outros que não recebiam. Se o grupo que recebeu a droga evoluísse com melhores resultados do que aquele grupo que não recebeu o tratamento: Bingo! Uma nova droga eficaz e segura para aquele tratamento havia sido descoberta. 

 

Para muitas outras áreas da Medicina, também foi assim! A maioria das descobertas foi feita a partir de observações clínicas ou observações feitas em laboratório sobre o mecanismo fisiopatológico da doença e, a partir daí, buscava-se novos fármacos que pudesse agir de modo a impedir ou dificultar a agressão provocada pela doença ao organismo. No artigo da semana que vem, vamos continuar revendo alguns exemplos de medicamentos também descobertos  assim e de como também existem outras maneiras de medicamentos eficazes serem descobertos. 

 

*Este conteúdo é de responsabilidade do autor e não representa, necessariamente, a opinião do Diário de Uberlândia.

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