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30/07/2022 às 08h00min - Atualizada em 30/07/2022 às 08h00min

Um duro golpe na suplementação de vitamina D!

JOÃO LUCAS O'CONNELL
A dosagem e a suplementação da vitamina D vêm sendo bastante estimulados nos últimos anos. Praticamente todos os tecidos do corpo têm receptores de vitamina D, uma descoberta que gerou um interesse considerável nos benefícios potenciais da vitamina D para várias condições de saúde. Vários estudos científicos menores já sugeriram possíveis benefícios do uso continuado da suplementação para a prevenção de eventos cardiovasculares, para melhora da imunidade, da disposição mental e outros. 

De todos os possíveis benefícios da suplementação de vitamina D, um que era dado como certo, pelo menos até esta semana, era a melhora da condição óssea dos idosos. Como a vitamina D é importante no processo de absorção intestinal do cálcio e no processo de calcificação óssea, o raciocínio lógico que predominou na Medicina ao longo dos últimos anos era o de que a suplementação de vitamina D poderia melhorar a condição óssea. Desta forma, idosos que estivessem em uso constante da vitamina D teriam menos fraturas ósseas espontâneas e outras fraturas após quedas (como as fraturas de quadril, por exemplo). 

No entanto, apesar da crença geral de que esta suplementação traga benefícios, a controvérsia sobre os reais ganhos gerais da suplementação de vitamina D continua muito presente dentro do debate científico internacional. Durante a pandemia da COVID, por exemplo, muitos médicos defenderam o uso de altas doses de vitamina D para um suposto reforço da imunidade contra o vírus. Entretanto, todos os estudos realizados até aqui, não conseguiram demonstrar um real benefício desta conduta nem para a prevenção e nem para o tratamento da COVID. 

Esta semana, a publicação de um grande estudo americano, numa das principais revistas científicas do mundo, colocou ainda mais lenha nesta fogueira relacionada ao real benefício da vitamina D. Neste estudo (chamado “VITAL”) os autores atribuíram aleatoriamente 25.871 homens americanos, com 50 anos de idade ou mais, e mulheres, com 55 anos de idade ou mais, para um dos quatro grupos: suplementação de vitamina D3 mais ômega-3, vitamina D3 mais placebo, ômega-3 mais placebo ou placebo duplo. VITAL foi o maior e mais bem conduzido estudo sobre os benefícios da vitamina D para o sistema ósseo realizado no mundo até hoje. A conclusão deste estudo gigante foi que os suplementos vitamínicos testados (vitamina D e/ou ômega-3) não tiveram benefícios importantes para a saúde na população geral de idosos, mesmo naqueles com baixos níveis séricos de vitamina D. É um duríssimo golpe para os defensores do uso da suplementação de vitamina D.

Em outro estudo publicado na mesma revista, ao contrário das expectativas, a vitamina D3 não foi capaz de reduzir o risco de fraturas, mesmo nos 20% dos participantes que tomaram cálcio suplementar. Além disso, os resultados das análises do VITAL publicados em outras revistas também mostraram que a suplementação de vitamina D não foi capaz de prevenir câncer ou doenças cardiovasculares, quedas, de melhorar a função cognitiva, reduzir a incidência de arritmias (como a fibrilação atrial), reduzir a frequência de enxaqueca, de diminuir o AVC, ou reduziu a dor no joelho.

Por fim, quais são as implicações do VITAL? O fato de a vitamina D não ter efeito sobre as fraturas questiona fortemente a noção médica geral, prevalente nas últimas décadas, de um suposto benefício importante da vitamina D isolada para prevenir fraturas na população adulta. Ao acrescentarmos esses achados a estudos anteriores do VITAL e estudos anteriores ao VITAL, evidencia-se também a falta de um efeito na prevenção de inúmeras condições clínicas e sugere que os profissionais de saúde devem parar de rastrear os níveis de vitamina D ou recomendar suplementos de vitamina D com o objetivo de evitar doenças importantes ou prolongar a vida.

Estudos científicos bem conduzidos são essenciais para nortearem a atuação do médico. Nem sempre, o que parece lógico a partir de dados observacionais, se mostra benéfico no mundo real. Nem sempre, o que se mostra útil dentro de um tubo de ensaio, se mostra eficiente no corpo humano. O estudo VITAL, provavelmente, modificará a prática médica de prescrição sistemática de vitamina D e de ômega-3 indiscriminadamente, em especial entre adultos jovens.  


*Este conteúdo é de responsabilidade do autor e não representa, necessariamente, a opinião do Diário de Uberlândia.
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