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27/02/2021 às 08h32min - Atualizada em 27/02/2021 às 08h32min

COVID-19: Por que entramos nesse caos?

JOÃO LUCAS O'OCONNELL
Os números da pandemia no país continuam aumentando. Já são mais de 10 milhões de casos confirmados e mais de 250.000 óbitos. Em nossa região, observamos um aumento muito expressivo do número de casos nas últimas três semanas. Nesta coluna e em nossas redes sociais, já vínhamos chamando a atenção dos leitores e seguidores para um aumento progressivo do número de casos de COVID desde o início de Janeiro.
 
No fim de Janeiro, alertamos para os riscos de saturação dos sistemas público e privado de saúde e o risco de transposição da capacidade de internação de pacientes, tanto no cenário dos hospitais da rede pública quanto o da rede privada.
 
Entretanto, por mais pessimista que pudesse ser minha previsão, nunca imaginei que viveríamos um cenário tão negativo e tão caótico como o que vivemos nas últimas duas semanas. Falta de vagas em Unidades de Terapia Intensiva (UTI)... Pacientes que necessitariam de UTI sendo tratados em leitos de enfermarias... Pacientes que necessitariam de internação em Enfermaria sendo mantidos em poltronas nos corredores de hospitais e UAIs... E pacientes que precisariam ficar dentro de uma unidade de saúde sendo despachados para casa por falta de acomodação.
 
A segunda onda do COVID nos atingiu em cheio! O número de novos casos diários, de novas internações e de óbitos foi muito superior aos números observados durante a primeira onda da doença (entre julho e agosto de 2020). Como se já não bastasse, os hospitais e UAIs já estavam sobrecarregados com pacientes tratando de outras doenças e em pré e pós-operatório de cirurgias eletivas. Esta chegada de inúmeros casos novos necessitando de internação em hospitais, já cheios de pacientes portadores de outras patologias, causou transtornos de superlotação nunca experimentados antes em nossa cidade, especialmente nos hospitais privados.
 
Vários hospitais da cidade modificaram sua estrutura e seu fluxo interno, adaptaram novos espaços, compraram mais equipamentos, materiais e medicamentos, contrataram funcionários, criaram Unidades semi-intensivas e UTIs dedicadas ao cuidado do paciente COVID moderado e grave. O Hospital de Clínicas de Uberlândia disponibilizou 122 leitos para tratamento exclusivo de pacientes COVID, o fluxo de atendimento municipal foi redirecionado para algumas UAIs e o Hospital Municipal pretende abrir pelo menos mais 20 vagas em uma “Unidade de Campanha”, que receberá pacientes não COVID, abrindo mais espaço nas UAIS para pacientes COVID.
 
Mas, enfim, por que experimentamos este aumento absurdo do número de casos e óbitos de COVID-19 nas últimas semanas? Um dos motivos do aceleramento no ritmo de aumento de casos se deve ao afrouxamento das medidas de distanciamento social e ao descuido da população, em geral, para com as medidas de higiene manual e respiratória. Mas, infelizmente, só este aumento no número de aglomerações de fim de ano não consegue explicar um salto tão expressivo. Muito provavelmente, este aumento esteja também relacionado ao surgimento e disseminação de uma nova cepa variante do novo coronavírus.
Mas, como determinar se há realmente uma nova cepa do SARS-COV2 circulando entre nós? A única maneira comprovada de se fazer isso é através da análise da estrutura genética do vírus, que pode ser obtida através da coleta de material da orofaringe ou da secreção nasal de pacientes doentes.
 
Enquanto isto não for feito, podemos apenas inferir que exista alguma cepa mais transmissível entre nós. Esta inferência é baseada em: 1) uma aceleração muito importante no ritmo de contágio observada nas últimas 3 semanas; 2) uma mudança no perfil de agressividade do vírus, verificada pelo acometimento mais grave de pacientes mais jovens; 3) um aumento do número de reinfecções; 4) um aumento do número de mortes entre pacientes mais jovens.
 
Outros fatores que também sugerem esta possibilidade são: 1) o acolhimento de pacientes portadores de COVID-19 secundária à variante P1 (variante de Manaus) em hospitais de nossa região; 2) o grande número de cidades do interior de São Paulo que já identificaram a circulação da nova variante; 3) o perfil clínico e epidemiológico da doença (muito parecido com o perfil da variante P1 em Manaus).
 
Enfrentamos, nas últimas semanas, um agravamento da situação da COVID-19 na nossa região que, infelizmente, justificou a necessidade de retrocesso das medidas protetivas. Elas serão fundamentais para que possamos cuidar dos doentes e salvar mais destas vidas que necessitam de tratamento hospitalar. A população também tem que continuar fazendo a sua parte! Por mais desgastante que isto seja, é novamente necessário reforçarmos nossos cuidados de isolamento e intensificarmos as medidas de higiene manual e respiratória.
 
Estamos mesmo diante de um ataque viral sem precedentes na história recente do país. A situação ainda vai ficar caótica por algumas semanas. Vamos melhorar nossa situação por aqui ao longo do mês de Março. Porém, vamos assistir a um caos sem precedentes nos sistemas de saúde público e privado de várias outras cidades e regiões do país! O Brasil vai atravessar um dos piores meses de sua história. Vamos pagar o preço pelo negacionismo e desobediência à ciência. Nem toda Cloroquina do mundo vai nos salvar desse período de caos!
 
 
Este conteúdo é de responsabilidade do autor e não representa, necessariamente, a opinião do Diário de Uberlândia.
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