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03/09/2019 às 08h17min - Atualizada em 03/09/2019 às 08h17min

Romance uberlandense quase vira filme

ANTONIO PEREIRA

Nos primeiros dias de dezembro de 1953, o conhecido cineasta brasileiro, já falecido, Alex Viany, visitou Uberlândia para um contato com o escritor e mestre professor Nelson Cupertino, autor do romance histórico “M’Boitatá”. Nelson era professor de grande cultura que encaminhou várias gerações uberlandenses pelos rumos da educação. Seu romance contava a epopeia dos motoristas de Uberlândia na conquista comercial do Centro Oeste para os atacadistas locais. Abriam estradas nas rodas dos velhos caminhões. Abordava também a construção da primeira estrada de automóveis da região pela empresa Companhia Mineira Autoviação Intermunicipal, do Fernando Vilela, cujo engenheiro era o dr. Ignácio Penha Paes Leme.

Alex Viany era um dos diretores da empresa “Maristella” e já tinha dirigido alguns filmes de sucesso. Quando professor de História do Cinema no Museu de Arte de São Paulo, veio-lhe a ideia de fazer um filme sobre caminhoneiros. A Maristella já concordara, mas não aparecia a história. Foi quando Miguel Juliano lhe disse que em Uberlândia havia sido escrito um romance sobre o tema. Conseguiu o livro, leu, gostou e entrou em contato com o professor Nelson.

Alex Viany expôs ao professor sua ideia que era a de aproveitar o romance em dois lances. No primeiro, contaria a história dos destemidos caminhoneiros da estrada do Fernando Vilela, no segundo, adaptaria o tema romanesco do livro para a época atual. Além de combinar com o professor o desdobramento do filme, expôs alguns pormenores interessantes: os artistas seriam Vanja Orico e Milton Ribeiro que haviam sido protagonistas do maior sucesso nacional até então, “O cangaceiro”. Mais Dóris Monteiro, estrela de “Agulha no Palheiro”, premiada pela Prefeitura do Rio de Janeiro como Atriz Revelação de 1953. E ainda Jackson de Souza e os novatos Glauce Rocha (irmã de Glauber Rocha) e Pablo Montel. Secundários e extras seriam recrutados na região. O cenário seria Uberlândia e cidades goianas. A música seria do maestro Henrique Gandelman que viria conhecer a região e o romance para compor. Em abril de 1954, Alex voltaria para organizar o roteiro com o professor. Viriam também Gandelman e Dóris Monteiro que faria dois espetáculos na cidade.

Abril passou e ninguém apareceu. A 29 de maio, chegou Dóris. Vinha participar de um baile do Colégio Brasil Central. Foi recebida no aeroporto pelo prefeito Tubal Vilela que lhe entregou uma placa de prata. Deixou-se fotografar ao lado do professor Nelson e, à noite, foi entrevistada pela Rádio Educadora onde falou de sua satisfação em participar do filme. E foi para o baile. Depois disso, os contatos foram esfriando, as notícias escasseando e, de repente, esqueceu-se de tudo. É de se acreditar que faltou capital para a produção.

“M’Boitatá”, no entanto foi representado por artistas locais, transformado em peça teatral, em três atos e oito quadros, pelo autor. Vários jovens atores participaram sob a direção de Silva Ramos. Recebeu a inclusão de músicas feitas pelo Alyrio França e pelo próprio autor.

Logo após a morte do professor, o ator Tarcísio Meira entrou em contato com a família, querendo conhecer a obra e possivelmente filmá-la. Foi-lhe enviado um exemplar do “M’Boitatá”, mas não houve prosseguimento nas conversações. Há poucos anos, esteve aqui uma equipe de TV dizendo-se produtora de uma série de filmes sob o título “Táxi-Brasil”, um dos quais se passaria na região. Procuraram-me atrás de argumento. Lembrei-me do “M’Boitatá” e mostrei-lhes. Gostaram, tiraram cópia, foram-se embora e nunca mais voltaram.

O belo romance do professor Nelson Cupertino, história da maior epopeia da nossa cidade, esquecido num escaninho de biblioteca, aguarda, pelo menos, uma reedição pelos Poderes Públicos. Merece. Vale.

*O conteúdo desta coluna é de responsabilidade do autor e não representa, necessariamente, a opinião do Diário de Uberlândia.

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