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05/12/2018 às 08h01min - Atualizada em 05/12/2018 às 08h01min

“O que é a resistência para quem sempre resistiu?”

JÚLIA CAROLINA CUSTÓDIO | ESTUDANTE DE JORNALISMO E PORTADORA DE DEFICIÊNCIA
“Resistência”, esse ato ou efeito de resistir inerente a condição humana, no qual brasileiros conheceram ainda mais a fundo, e não raras vezes, “na pele” em 2018. Em um ano caracterizado pela instabilidade política e conflitos sociais, a resistência se fez presente, não sendo mero sinônimo de força, e persistência, mas sobretudo um posicionamento político, ou seja, uma bandeira hasteada no país inteiro. Mas, ainda que mediante ao fogo cruzado, novamente as minorias resistiram.

É inegável que dentre parte das minorias sociais que resistem no Brasil, como mulheres, LGBTQIs, pessoas negras, indígenas, dentre outras, a pessoa portadora de deficiência física e/ou intelectual está inserida no grupo que mais entende esse significado, e sente, e chora as consequências da invisibilidade social ainda que este seja, sobretudo, uma parcela significativa da população brasileira.

Com relação a isso, os dados mais recentes divulgados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), ainda no ano de 2010, apontam que as pessoas portadoras de deficiência compõem uma parcela relevante, chegando a quase 24% da população nacional. Já os dados da ONU (Organização das Nações Unidas) apresentados em 2011 apontam que 1 a cada 7 pessoas no mundo é portadora de alguma deficiência, mas apesar desse número expressivo, onde estão estas pessoas?

A superproteção familiar, a dificuldade de um diagnóstico precoce, as barreiras de inclusão dessa pessoa no meio educacional ou social em razão das falhas inclusivas existentes, a falta de acessibilidade, como também de representatividade nos meios de comunicação, fazem com que a invisibilidade deste grupo inquestionavelmente se consolide, não permitindo avanços mais rápidos. Assim, direitos básicos, como estudar, trabalhar ou ter liberdade sexual são conquistas muito recentes se comparadas a outras minorias.

A pessoa portadora de deficiência não está na escola, - a ONU afirma, que concluir a etapa primária para crianças portadoras de deficiência é um desafio em países em desenvolvimento, visto que somente 45% dos meninos e 35% das meninas concluem essa fase. Já nas universidades a notícia não é melhor: somente em 2015 que o Projeto de Lei Suplementar 46/2015 foi aprovado - o texto apenas altera a lei de cotas no ensino superior federal (Lei 12.711/2012), que dá o direito a essa parcela também ao ensino superior.

Tratando-se de mercado de trabalho, a conquista tem apenas vinte e sete anos, chegando apenas em julho de 1991 que através da lei de cotas (Nº 8.213/91) estipulou a inclusão de pessoas portadoras de deficiência neste espaço, com reserva de 2% a 5% das vagas destinadas.
Mas por que demora-se tanto? Uma das explicações possíveis está na conscientização e nos preconceitos, além de estigmas existentes em cima desse indivíduo, reforçados fortemente ainda hoje com a ideia de que pessoas portadoras de alguma limitação física ou cognitiva “vieram ao mundo para ser exemplo de superação” persistente. Todavia o que há de equivocado neste pensamento?

A grande problemática existente neste conceito não está na admiração natural existente à pessoa portadora de limitações, mas sim na idealização exacerbada que de modo generalizado faz dela puramente um rótulo social, abrindo mão assim de uma perspectiva ampliada como seres de identidades e personalidade singular. O sentido contrário dessa ideia também ocorre, a vitimização se faz uma barreira, e se desenvolve quando a empatia comum ao próximo modifica-se para um sentimento de pena.

A questão é que não existe um meio termo: ou tornam-se as “vítimas” mesmo sem se colocarem nesta posição, ou os heróis, não existe outra opção. É importante refletir se a pessoa se coloca neste lugar, ou se o sistema falho é quem reproduz essa ideia, colocando esse indivíduo automaticamente nesta posição.
Se faz necessário que as políticas públicas se efetivem, e que esse grupo prossiga cobrando mudanças, e fazendo de sua existência, resistência!

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