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18/06/2019 às 07h48min - Atualizada em 18/06/2019 às 07h48min

Bailarinos negros têm mais chances fora do Brasil

Dança ainda é considerada como um produto cultural elitizado

FOLHAPRESS
A bailarina gaúcha Rejane Duarte vive há 20 anos nos Estados Unidos | Foto: Arquivo Pessoal
Antes uma atração mais ligada à nobreza, o balé ainda hoje é considerado por muitos como um produto cultural elitizado, mesmo séculos depois do seu surgimento. Isso é reforçado pelo fato de bailarinos serem majoritariamente brancos, inclusive no Brasil, um país onde 55% da população se declara preta ou parda, segundo dados de 2016 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

"O balé é uma arte aristocrática, começou assim e se manteve dessa forma. Sempre existiu a ideia de que as negras não tinham o corpo ideal de uma bailarina, que não tinham a mesma aptidão para os movimentos de precisão e leveza. São visões descabidas, mas que continuam se perpetuando", disse Rejane Duarte, 45.

A bailarina brasileira vive nos Estados Unidos há 20 anos. Lá integrou o Dance Theatre of Harlem, em Nova York, a primeira companhia negra de balé clássico do mundo. Em 2009, dez anos depois de Duarte, outra brasileira ingressou na companhia, a carioca Ingrid Silva. O grupo surgiu em 1969 por iniciativa de Arthur Mitchell, o primeiro bailarino negro do New York City Ballet, promovido mais tarde a dançarino principal pelo russo George Balanchine.

Rejane Duarte, que trabalhou com Mitchel, que morreu em 2018, voltou à cidade natal para selecionar bailarinos para bolsas de estudo no Dance Theatre of Harlem durante a segunda edição do Festival Internacional de Dança de Porto Alegre, que terminou no sábado (15). O evento serve de vitrine para disputa de bolsas em países como França, Alemanha e China.

O festival é promovido pelo Ballet Vera Bublitz, que completou 40 anos, onde Duarte se formou bailarina e teve o primeiro trabalho como professora de balé até se mudar para Nova York. Na época de aluna, era a única negra. Por isso acredita que se tivesse ficado no Brasil, não teria tido as mesmas oportunidades.

"O preconceito racial é velado. É uma mentalidade antiga e preconceituosa, que as pessoas não gostam de admitir. Os bailarinos negros conseguem mais trabalho fora do país do que no Brasil. Tem algo errado aqui", afirma Duarte.

Quando chegou ao Harlem, bairro negro nova-iorquino, ela diz ter se sentido à vontade. Ali não era a única negra a dançar balé. Ela trocou a meia-calça e as sapatilhas cor-de-rosa por acessórios pintados manualmente de marrom. Os itens são tradicionalmente claros para se assemelhar com a pele branca da maioria das bailarinas.

"Até hoje tenho que pintar porque a marca que uso não fabrica de outra cor. Alegam que a demanda é pequena, mas isso só reflete a realidade de negros como minoria no balé. "É triste quando falo que sou bailarina e as pessoas dizem 'que legal, você dança samba!'. Só porque sou negra. Isso não vai mudar da noite para o dia, são mais de 400 anos de balé branco", afirmou.

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