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04/12/2018 às 11h02min - Atualizada em 04/12/2018 às 11h02min

Uma viagem maluca

ANTÔNIO PEREIRA DA SILVA | JORNALISTA E PROFESSOR
João Cândido Pereira foi líder inconteste dos profissionais urbanos do volante por muitos e muitos anos. Comunista declarado numa terra que já foi chamada de “Moscou Brasileira”, João, dinâmico dirigente da Associação Profissional dos Condutores de Veículos de Uberlândia, ombreou com os líderes mais destacados do Município em prol do enriquecimento rodoviário da região. Era motorista de táxi numa época em que as rodovias eram precárias em todos os sentidos e, por isso, conhecia, segundo sua própria afirmação, as estradas de fazendas por uns quinhentos quilômetros em torno de Uberlândia.

Quando o Presidente Juscelino resolveu transferir a capital para Brasília, um dos grandes problemas que enfrentou foi a deficiência de rodovias. Assim que se começou a construir o Catetinho, o trajeto usado era Uberlândia, Itumbiara, Goiânia, Brasília. João Cândido achava que a volta era muito grande. Conhecia toda a região em torno da nova capital e achava possível um caminho mais curto. José de Lima, conhecido por Petico, diretor do Sindicato, irmão do presidente Argemiro Lima, levava óleo para Brasília. João propôs-lhe viajarem juntos e voltarem “por dentro”, ou seja, cortando caminho e saindo em Catalão. Só que não havia qualquer estrada de rodagem entre Brasília e Catalão.

Descarregado o óleo, saíram os dois nessa aventura maluca só comparável às investidas intimoratas do velho Nego Amâncio, desbravador comercial dos sertões mato-grossenses há oito décadas passadas. Vinham pelas trilhas de carros de bois, aos solavancos, até chegarem a uma fazenda. Paravam. Perguntavam onde pegar outro caminho para ir mais adiante. E assim vieram de fazenda em fazenda, por trilheiros e caminhos de carros de bois, cerrados, chapadões, marcando mais ou menos a direção. Perguntavam sempre qual o rumo para Catalão. E assim chegaram, mas, de Catalão para Minas Gerais, tinha o rio Paranaíba, mas não havia ponte. Foram para Goiandira e daí para Anhanguera atravessando o Paranaíba pela ponte da Estrada de Ferro. João Cândido veio anotando tudo.

Aqui, marcaram reunião na Associação. João Jorge Coury, aproveitando as anotações do João Cândido, fez um croqui - o traçado de uma possível estrada. Convidaram Prefeito, Juiz de Direito, Presidente da Câmara, políticos influentes, todas as entidades de classe, jornais e emissoras de rádio. Foi apresentado o rascunho do Coury que entusiasmou todo mundo. Moacir Lopes de Carvalho, da UDN, sugeriu que se enviasse comissão sigilosa ao Rio de Janeiro para convencer JK a incluir essa possível estrada no Plano Rodoviário, porque não constava nada semelhante.

O sigilo era por medo de que os políticos goianos bloqueassem a sugestão. O senador goiano Coimbra Bueno estava interessadíssimo em que o movimento para a Capital continuasse passando por Goiânia. Como consequência das providências tomadas após essa reunião, Israel Pinheiro, a mando de JK, visitou Uberlândia e conheceu os pormenores do plano.

A Associação Comercial e a Sociedade dos Engenheiros (SEQAU) foram entidades importantes no convencimento das autoridades para a planificação dessa estrada. Não foi fácil. Só muitos e muitos anos depois, o saudoso jornalista Argemiro Evangelista Ferreira conseguiu ganhar o interesse do general Riograndino Kruel ao lembrá-lo de que essa estrada era o caminho que colocava mais rapidamente em Brasília os soldados dos quartéis de Uberlândia e Ipameri, no caso de qualquer risco. Foi a justificativa para sair a obra. Era uma época em que a “segurança” era muito importante...
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