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31/07/2023 às 19h56min - Atualizada em 31/07/2023 às 19h56min

“Ele sempre era o primeiro a prestar auxílio”, afirma filha de paciente que morreu à espera de atendimento no HC-UFU

Ministério Público Federal abriu procedimento para averiguar possível caso de negligência do Hospital

IGOR MARTINS E KAUÊ ALTRÃO | DIÁRIO DE UBERLÂNDIA
Filha de Eurípedes disse que o pai era um homem alegre, prestativo e trabalhador | Foto: Arquivo Pessoal
O Ministério Público Federal (MPF), em Uberlândia, abriu nesta segunda (31) um procedimento para apurar a morte de Eurípedes Roberto Faria, de 74 anos, que morreu em uma ambulância, no último sábado (29), após permanecer por quase quatro horas aguardando atendimento no Hospital de Clínicas da Universidade Federal de Uberlândia (HC-UFU). O objetivo é investigar as circunstâncias do ocorrido e identificar os responsáveis. 

Em entrevista ao Diário, o procurador Cléber Eustáquio Neves informou que relatos recebidos pelo MPF apontam uma possível negligência por parte de funcionários do HC-UFU. “O que chegou aqui é que alguns funcionários não atenderam esse paciente que estava em estado grave e que ele ficou cerca de 4 horas em uma ambulância, vindo a morrer”, adiantou. 

Segundo o procurador, levantamentos estão sendo realizados, inclusive com a própria Universidade Federal de Uberlândia (UFU), sobre o ocorrido. A finalidade é tentar identificar quais servidores estavam presentes, quais eram as equipes de plantão e de quem era a responsabilidade de atender o paciente. O ofício será encaminhado à Polícia Federal para proceder com a investigação, por conta do envolvimento de servidores públicos federais.


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CASO ERA DE URGÊNCIA
Após um quadro de infarto, Eurípedes Faria saiu da UAI São Jorge às 2h22 do último sábado (29), sendo encaminhado por uma ambulância do Sistema Integrado de Atendimento a Trauma e Emergência (Siate) ao HC-UFU por conta da gravidade do estado de saúde dele. 

O caso foi classificado com o critério de “vaga zero”, que indica que o paciente deve ter prioridade no atendimento por conta de risco de morte. No entanto, ao chegar à unidade hospitalar, Eurípedes ficou aguardando por quase 4 horas dentro da ambulância e veio a óbito por volta das 6h da manhã, após uma parada cardiorrespiratória.  

PREFEITURA QUESTIONA 
Em entrevista ao Diário, o secretário Municipal de Saúde, Clauber Lourenço, esclareceu que a gestão do HC-UFU estava ciente das condições e que também foi acionada previamente pelo médico de plantão que acompanhava o paciente, alertando a urgência do caso ao hospital. "O médico da UTI móvel quando chegou, ele por algumas vezes, não uma apenas, tentou comunicar a equipe de plantão que se tratava de um infarto com supra”, informou Clauber.

Ainda durante a entrevista, o secretário destacou que a Prefeitura e a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), responsável pela administração do HC-UFU, assinaram em dezembro do ano passado um convênio que prevê o atendimento de pacientes de alta complexidade encaminhados pelo Município. O contrato possui uma vigência de 60 meses. Entre os serviços que devem ser oferecidos pelo HC-UFU estão procedimentos cardiovasculares, incluindo urgência e emergência, casos como o de Eurípedes, que necessitava de um cateterismo.  

“O contrato reza que algumas patologias têm que ser aceitas de imediato devido a sua emergência e o contratado para fazer isso, não só para Uberlândia como também para outras cidades da região, é exatamente o HC da UFU. Então, foi encaminhado em vaga zero devido à gravidade do caso, a regulação solicitou uma UTI móvel, que era um caso grave, que o paciente tinha riscos no transporte também, para acelerar isso”, complementou o secretário.

Em fevereiro deste ano, o Ministério Público promoveu uma reunião com o HC-UFU e os gestores de saúde de Uberlândia para abordar a situação do hospital. Um dos assuntos discutidos foi o alto número de vagas zero e um acordo, válido até o final de julho de 2023, de que haveria uma fila única para todos os tipos de procedimentos, consultas e exames. 

Ainda segundo o documento, naquela data, o superintendente do HC disse que muitos casos de vaga zero não se enquadram neste conceito e que “todos se comprometiam a obedecer aos critérios definidos pela legislação e grade de urgência/emergência, para encaminhamento da vaga zero ao HC-UFU, encaminhando laudo devidamente fundamentado”. 

O QUE DIZ A UFU
O HC-UFU emitiu uma nota sobre o ocorrido. Segundo a Direção, a unidade estava com superlotação e atendendo com capacidade acima do que comporta. Informou ainda que faz informes diários à secretaria Municipal de Saúde sobre a situação. Ainda conforme o hospital, ainda no sábado, foi aberto um processo de investigação preliminar para apurar o ocorrido.

"O HC conta com 69 leitos no Pronto Socorro e, nessa sexta-feira (28), 156 pacientes estavam internados no local. Sobre o caso citado, a unidade abriu um processo apuratório interno visando esclarecer o fato. É importante destacar que o hospital faz informes diários sobre a atual situação à Secretaria Municipal de Saúde, responsável pela gestão da rede de atendimento. O HC-UFU e seus profissionais reforçam que não têm medido esforços para realizar o melhor atendimento possível à população", diz o comunicado.

CORAÇÃO GIGANTE
Em entrevista ao Diário, a filha de Eurípedes, Tamara Aparecida de Faria, lembrou que o pai era um homem alegre e íntegro, que prezava pela vida e estendia sempre a mão ao próximo, aos animais e a quem necessitava de sua ajuda. 

“Falar do meu pai é falar da pessoa mais íntegra que eu conheço. Meu pai podia estar em qualquer situação, no cansaço que fosse, mas se a campainha de casa tocasse, para quem fosse, meu pai estava a prontidão e solidário a qualquer situação que precisasse”, lembra.

Eurípedes se mudou para Uberlândia há quase 20 anos. De acordo com a filha, o torcedor frenético do São Paulo era um homem alegre e trabalhador.  “É uma pessoa de uma alegria imensurável, era o fim de festa, aquele que cantava ‘não vou embora’. Todas as mensagens que recebi foram justamente sobre essa alegria, carinho e amor dele com as pessoas. Meu pai amava a vida”, disse. 

Segundo Tamara, não só a família sente essa perda, mas também amigos de todo o Brasil e até de outros países que ele cultivou durante sua vida mandaram mensagens se lamentando ao ficarem sabendo do ocorrido. 

 
“O maior legado dele era de acreditar muito nas pessoas, esse coração enorme. O que dá mais dó de tudo que aconteceu é saber da pessoa que ele era, que merecia o atendimento, porque ele sempre era o primeiro a prestar auxílio, mas foi uma pessoa que ficou sem a prestação de socorro”, finalizou.

OUTROS POSICIONAMENTOS
Também por meio de nota, a UdiCor Gestão de Saúde, empresa responsável pela ambulância que realizou o transporte do paciente, relatou que Eurípedes foi encaminhado com urgência e critério de vaga zero, como acontece em casos similares de gravidade. 

“Após várias tentativas de desembarque para admissão do paciente, às 5h11 o mesmo evoluiu para uma parada cardiorrespiratória dentro da ambulância foram aplicadas todas as manobras de atendimento, após 40 minutos o mesmo veio a óbito constatado pelo médico socorrista às 5h56 da manhã”, informou a empresa.  

A Secretaria do Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG) também um comunicado sobre o caso e afirmou que “Uberlândia possui gestão plena de seus prestadores conforme a Portaria GM/MS nº 3.061, de 24 de junho de 1998” e que “o Hospital de Clínicas de Uberlândia faz jus aos repasses realizado pelo estado” para com a saúde e ainda que o HC-UFU realiza atendimentos de alta complexidade para demanda espontânea e referenciada. 

Confira a nota na íntegra: 

“A Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG) informa que o município de Uberlândia possui gestão plena de seus prestadores conforme a Portaria GM/MS nº 3.061, de 24 de junho de 1998. 

No âmbito da Política de Atenção Hospitalar de Minas Gerais - Valora Minas, o Hospital de Clínicas de Uberlândia é contemplado no módulo Valor em Saúde, conforme Resolução SES/MG nº 7.826, de 05 de novembro de 2021, fazendo jus ao valor anual de até R$ 21.856.131,83, dividido em 3 parcelas quadrimestrais de até R$ 7.285.377,27, de acordo com o cumprimento das metas pactuadas, conforme a RESOLUÇÃO SES/MG Nº 8405, 27 de Outubro de 2022.

A Instituição fez jus à repasses no montante de R$ 36.426.885,84 desde o início da política (de novembro de 2021 a maio de 2023). Em 2021, o montante recebido foi de R$ 3.035.573,87 das competências de novembro e dezembro de 2021. Em 2022, foi repassado o montante de R$ 18.820.557,97 do Módulos Valor em Saúde e CPN. No ano de 2023 foram pagas duas parcelas no valor total de R$ 14.570.754,00. 

O Hospital de Clínicas de Uberlândia também está no Plano de Ação Regional da Rede de Urgência e Emergência (PAR RUE) da macrorregião Triangulo do Norte, contemplada como Porta de Entrada Hospitalar Tipo II (aprovado pela Portaria Ministerial n º 505, de 24 de março de 2020 e Deliberação CIB-SUS/MG Nº 2.984, de 21 de agosto de 2019) com incentivo financeiro anual de R$ 3.600.000,00 advindos do Ministério da Saúde.  

O Hospital de Clínicas de Uberlândia (CNES: 2146355) é um hospital geral, de natureza jurídica Administração Pública – Autarquia Federal, com 480 leitos, sendo 472 deles disponíveis ao SUS (CNES, maio/2023). Realiza atendimentos de alta complexidade para demanda espontânea e referenciada. Quanto aos parâmetros assistenciais, no ano de 2022, o Hospital de Clínicas de Uberlândia apresentou taxa de ocupação de 85,41%, taxa de referência de 32,83%, tempo médio de permanência de 6,18 dias e a taxa de internações por condições sensíveis à atenção primária - ICSAP foi de 8,64%. Nesse período, a Instituição ofertou atendimentos a 100% dos municípios de sua microrregião.”



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