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24/11/2021 às 18h00min - Atualizada em 24/11/2021 às 18h00min

Nova denúncia por crime de moeda falsa será representada contra Pâmela Volp, afirma promotor do Gaeco

Notas falsas foram encontradas na residência da ex-vereadora durante Operação Libertas; Diário conversou com vítimas que contaram sobre a exploração cometida pela ex-vereadora

GABRIELE LEÃO
Pâmela Volp é acusada de chefiar grupo de exploração sexual de travestis em Uberlândia | Foto: Divulgação

Uma nova denúncia contra a ex-vereadora de Uberlândia, Pâmela Volp, será representada pelo Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco) à Justiça. Segundo o promotor Thiago Ferraz, durante o desdobramento da Operação Libertas, foram encontradas duas notas falsas de R$ 100 na casa da ex-parlamentar, o que caracteriza crime de moeda falsa. O Diário de Uberlândia conversou com travestis que trabalhavam para Volp e relataram episódios de exploração, ameaças e agressões. 

Pâmela Volp está presa desde o dia 8 de novembro após a ação da Gaeco. A Operação Libertas apura os crimes de associação criminosa, exploração sexual, manutenção de casa de prostituição, roubo, lesão corporal, homicídio, constrangimento ilegal, ameaça, posse e porte de arma de fogo. As investigações apontam a ex-vereadora Pâmela Volp como mandante dos crimes cometidos por um grupo criminoso. 

Pâmela Volp também será denunciada por três homicídios e está sendo investigada por chefiar uma rede de prostituição de travestis na cidade de Monza, na Itália. A Justiça vai investigar se há ligações com o crime de tráfico de pessoas. O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) conseguiu estender as prisões preventivas de Pâmela Volp e de Paula Volp por mais 90 dias para apuração das denúncias do processo.

O promotor informou ainda que, desde que a operação foi deflagrada, diversas travestis e transexuais que eram exploradas pelo grupo criminoso fizeram denúncias contra as suspeitas.

“Ainda não conseguimos contabilizar a quantidade de depoimentos apresentados, pois, a todo momento diversas meninas que eram exploradas pelo grupo trazem novas evidências que incrementam a investigação. O processo ainda corre em segredo de Justiça, mas logo teremos novas denúncias a serem apresentadas”, comentou. 

Ferraz disse também que, na última segunda-feira (21), Lamar Bionda, que está solta desde o dia 17 de novembro, foi ouvida pelo MPMG e confirmou algumas das acusações. O promotor informou ainda que Raquel Rosa, presa no dia 17 de novembro também por suspeita de envolvimento nos crimes, portava munições de arma de fogo. 

DENÚNCIAS
Uma transexual, que não quer ser identificada, contou detalhes ao Diário de Uberlândia dos anos em que viveu sendo explorada pelo grupo comandado por Pâmela Volp. Livre desde 2003, a entrevistada trabalhou como garota de programa de 1999 a 2002. Após conseguir fugir de Uberlândia, passou quase 19 anos na Europa para fugir das ameaças da ex-vereadora. 

“Quando fui para a casa da Pâmela, tínhamos que pagar diárias para poder trabalhar. O valor era cerca de R$ 30 reais para quem trabalhava na rua e R$ 50 para trabalhar em casa. A rotina de trabalho começava às 18h e podia se estender até 6h da manhã. Esse horário tinha que ser cumprido com rigor, pois tínhamos que estar acordadas às 9h para o café da manhã e fazer os serviços domésticos. Dependendo do valor arrecadado na noite anterior, Pâmela pedia para que durante a tarde as meninas fossem até outros pontos de prostituição para trabalhar. Quem não trabalhava ficava sem água e comida”, disse.

Na casa onde vivia, havia seis quartos com beliches para cerca de 40 travestis. Ela contou que as que mais faturavam podiam dormir nos beliches. Já as que tinham o menor rendimento, deviam dormir amontoadas no chão. 

AGRESSÕES
A entrevistada contou ainda que quando alguma regra da casa de Volp era quebrada havia diversas maneiras de punição, entre multas que podiam chegar a R$10 mil e até agressões. Ela ainda disse que sofria com ameaças de morte. 

“Para demonstrar respeito, ela fazia uma roda com as travestis e a menina que seria agredida ficava no meio. A Pâmela batia, com chutes, socos, usava barras de ferro e ainda pedia para que outras travestis participassem da agressão, com tapas, empurrões e xingamentos. Por mais feminino que fosse nosso corpo, a gente apanhava como homens. Ela não tinha um pingo de dó, parece que sentia prazer em fazer isso”, completou.

Ao tentar fugir da exploração abusiva, a vítima chegou a voltar para a casa da família, mas Volp foi atrás dela. “Eu já vivi diversos episódios de agressão e em um deles quando não quis colocar o silicone industrial. Voltei para a casa da minha família, mas ela foi atrás de mim acompanhada de outras travestis. Pâmela estava armada, invadiu a casa da minha família e me levou de volta. Nunca vou esquecer essa cena”, contou emocionada.  

Ainda de acordo com ela, as garotas eram forçadas a colocar silicone industrial. Segundo as apurações do Gaeco, os procedimentos eram feitos de maneira clandestina e podiam variar de R$4 mil a R$ 15 mil. Todo o dinheiro era repassado à chefe da organização. 

Durante os anos de prostituição, a entrevistada chegou a fazer 11 programas por dia. Ela contou à reportagem que Pâmela repassava orientações para fazer o serviço, como roubar e extorquir os clientes para conseguir dinheiro extra. “Ela dizia que, se o cliente estiver com anel, pulseira ou colar de ouro, era pra gente roubar. Uma outra maneira que conseguíamos tirar dinheiro dos clientes era tirar fotos deles no motel ou dentro do carro. Naquela época, nenhum homem de família ou autoridade de Uberlândia podia ser associado a prostituição, principalmente com travesti”, afirmou.

CRIMES
Quando perguntada pela reportagem sobre os crimes que tem conhecimento, ela informou que chegou a ouvir diversas conversas de Pâmela com outras pessoas sobre agressões às meninas que trabalhavam como garotas de programa na cidade, além de ouvir a chefe do grupo pedir a morte de uma delas. 

“Eu estava limpando a casa quando ouvi ela dizer que uma menina estava dando muito trabalho e que ela precisava ‘subir’, termo que ela usava para falar sobre assassinato. Tenho certeza que ela está envolvida em diversos casos de homicídio contra travestis e transexuais em Uberlândia e em outras cidades do Triângulo Mineiro e do país, já que ela também tinha meninas em Araguari, Tupaciguara, São Paulo e no sul do país”, desabafou. 

A entrevistada ainda disse para o Diário que chegou a ficar seis meses em Ribeirão Preto em um intercâmbio de travestis. Segundo ela, essa troca de estado acontecia sempre que uma das garotas ficavam “batidas”, ou seja, já eram muito conhecidas e ganhavam menos dinheiro na região. Assim, elas eram enviadas para outro estado para tentar atrair novos clientes. 

Depois de três anos de luta, a transexual conseguiu fugir e voltar para a casa dos familiares e se mudou para a Europa. Contudo, chegando lá, a perseguição de Pâmela continuou. “As meninas que trabalhavam para ela em Monza, na Itália, começaram a me perseguir, mas como as leis lá são mais rigorosas, procurei a polícia até que elas me deixassem em paz. Mudei de cidade, fui para Roma, mas ela continuava a ligar no meu telefone”, contou. 

De volta ao Brasil para cuidar de uma parente, ela relatou que sentiu medo e temeu sofrer alguma ameaça da ex-parlamentar. “Ela é perigosa e cumpre todas as ameaças. Quando a encontrei em um mercado, ela me agrediu com xingamentos e tentou jogar o carro em cima de mim. Temo pela minha família, mas sei que essa é a oportunidade que temos de desmascarar essa organização criminosa e acabar com a exploração sexual de travestis e transexuais. Naquela época estávamos desamparadas, ninguém iria acreditar, mas com todas essas denúncias, sei que podemos mudar essa história”, finalizou.

MAIS RELATOS
Uma outra vítima, que também não quer se identificar, relatou ao Diário outras situações das quais precisou se submeter para viver com a renda da prostituição em Uberlândia. 

A travesti contou que pagou diárias exuberantes a Volp e também sofreu episódios de agressão. “Vim de outro estado do Brasil, sem dinheiro e sem trabalho, tive que me render às condições de trabalho dela. O pagamento do ponto era obrigatório e todas tinham medo dela e isso se estende até hoje. Se eu não pagasse, onde iria viver? Só tinha a opção de morar na rua”, contou.

Para fugir do Brasil, a entrevistada disse que se escondeu na casa de uma amiga, pois sofria ameaças frequentes. “Ela me perseguia e saia na rua me procurando de carro achando que eu estava fazendo programa sem pagar o ponto. Me escondi na casa de uma amiga e fui embora para a Itália. Quando cheguei para trabalhar lá, Pâmela tentou me assustar e me perseguiu para que eu não conseguisse trabalhar”.

Uma outra travesti, que mora na Bahia, relatou que viveu durante quatro anos na pensão chefiada pela ex-vereadora. Ainda aos 17 anos, o primeiro destino dela foi Criciúma, em Santa Catarina. Um mês após a chegada na cidade catarinense, ela veio para Uberlândia, acompanhada de Pâmela. 

“Ela tinha ido até o sul para resolver um problema na pensão da Paula Coco e acabei vindo com ela pra Minas Gerais. No começo era tudo flores, era fácil o trabalho, mas logo a realidade bateu na porta. Eu chegava a fazer seis programas por dia e não conseguia mais que R$ 300. Além disso, toda sexta-feira precisava ajudar a pagar a comida e a pensão”, contou.

A vítima informou ainda que chegou a colocar o silicone industrial em São Paulo com outras seis meninas. “A gente fazia o procedimento e pagava para ela [Pâmela]. Mas, se alguém não pagava, ela agredia. Havia uma menina, do Acre, que teve os seios cortados e o cabelo raspado porque queria sair da casa da Pâmela e da prostituição, mas ela não deixou”, relatou. 

Depois de muitas agressões e ameaças, a travesti resolveu fugir. “Sai no meio da noite, peguei as minhas coisas e voltei para minha cidade. Mesmo longe, ela fazia ameaças contra minha vida, mas bloqueei tudo dela. Hoje tenho medo de fazer programas e tento reconstruir minha vida”, contou. 

ESCLARECIMENTOS
O Diário procurou o advogado de Pâmela Volp, Rogério Inácio de Oliveira, e solicitou um posicionamento sobre as notas falsas e as denúncias das travestis que foram exploradas pela ex-vereadora. Em nota, ele informou:

“Cabe esclarecer que Pâmela declarou corretamente o patrimônio construído ao longo de 35 anos de trabalho. Fez patrimônio no exterior e no Brasil com o investimento do que lá ganhou. Comprou imóveis aproveitando leilões e a valorização natural de suas localizações. A casa em que mora, foi iniciada em 1990 e nela trabalhou como pedreiro. Os carros de luxo, frutos de financiamento regular. As travestis pagam por seus aposentos, tal qual qualquer pessoa em um hotel”.

“Se nota falsa for real, nada há nada de errado nisto. As meninas guardam dinheiro com ela. Seguramente é de alguma que recebeu nas ruas. Isso é comum e não deveria causar nenhuma especulação contra qualquer uma delas”, encerrou.


 
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