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30/12/2019 às 09h45min - Atualizada em 30/12/2019 às 09h45min

Especialistas apontam falta de estrutura para suportar chuvas intensas em Uberlândia

Tempestades ocasionando enchentes e danos materiais são comuns nesta época; veja soluções apontadas para adequações urbanas

GIOVANNA TEDESCHI
Buraco aberto em via de Uberlândia como consequência das chuvas registradas neste mês | Foto: Arquivo/Diário de Uberlândia
Em agosto e setembro, a aridez e a baixíssima umidade do ar. Em novembro e dezembro, o calor e as chuvas fortíssimas. Uberlândia teve um ano marcado por secas e enchentes, mas, apesar da ameaça das mudanças climáticas, estas variações são consideradas normais na região. O que falta, segundo especialistas, é que a cidade se adapte a estes eventos para evitar episódios mais drásticos, como os registrados no começo deste mês, com casas danificadas e as principais vias urbanas alagadas.

De acordo com a professora Ângela Maria Soares, do curso de Geografia da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), a maior parte dos córregos de Uberlândia provém dos rios Uberabinha e Araguari. As bacias hidrográficas têm enfrentado grandes problemas, já que falta um plano diretor de drenagem urbana. “Essa seria uma atitude de planejamento, uma coisa muito urgente a ser feita. Toda a área urbanizada, as águas dos loteamentos, dos bairros, são todas lançadas nos córregos. Esses lançamentos provocaram muita erosão e degradação destes córregos”, explica.

A chegada desta água acaba danificando as veredas, formações vegetais bastante frágeis que cercam as nascentes dos córregos. Isso pode fazer com que a água pare de nascer naquele local. “Para recuperar essas áreas, o primeiro passo é achar uma forma de fazer a gestão da drenagem. A água não pode chegar ao córrego como ela tem chegado, de uma hora para a outra, de uma vez. Não tem nada que nós possamos fazer se não resolvermos o problema da drenagem”, diz Soares.

 

As voçorocas (ou erosões) são um problema na cidade desde a década de 1980. Na época, elas foram tampadas com entulho da construção civil, o que apenas adiou as complicações. “Só que a erosão retoma essas áreas e começa a retirar esses materiais. Então nós temos muitas voçorocas antigas que são áreas entulhadas, cobertas por resíduos. E isso vai sendo levado pelo córrego e vai ocupando e assoreando essas falhas pluviais”, relembra.

Nas avenidas Rondon Pacheco, Anselmo Alves dos Santos, Professora Minervina Cândida Oliveira e Getúlio Vargas há córregos canalizados. As galerias pluviais não conseguem comportar a quantidade de água que chega e as enchentes acabam acontecendo. “Cada vez mais, vai se impermeabilizando o solo. E cada vez mais, o escoamento superficial aumenta”, afirma a professora. Ela menciona também a existência do esgoto clandestino e entulho nas ruas e nas margens dos rios.

Para o biólogo e ambientalista Gustavo Malacco, é necessário criar infraestrutura adequada tanto para as chuvas intensas, quanto para as ondas de calor, seja por meio de obras ou preservação ambiental. “Eu acho que Uberlândia e outras cidades, em diversos governos, seja nos passados ou no atual, não têm se preocupado com isso. Acha que é chegar, colocar a Defesa Civil na rua e resolveu o problema. Só que nós temos que agir preventivamente. Com sorte, a última chuva aqui não vitimou pessoas, mas teve todo um prejuízo para a população”, diz.

 

O ambientalista também crê na inserção deste tipo de ação no plano diretor da cidade. “Uberlândia é tida como muito bem planejada, mas não é o que nós temos assistido no cenário local. Estamos vendo tudo que está acontecendo há tempos, as áreas verdes sendo cortadas, destruídas, as áreas de mananciais, recargas na cidade”, cita.

Por meio de nota, o Departamento Municipal de Água e Esgoto (Dmae) informou que já elaborou o Plano Municipal de Saneamento Básico, no qual apresenta uma série de diretrizes para o aprimoramento da drenagem pluvial do município, tais como projetos, objetivos, necessidades e ações.

“O plano está disponível na página do Cresan na internet e está aberto para consulta pública. O documento está em fase final de análise para ser decretado em 2020. Após isso, o próximo passo será o início de uma avaliação para a elaboração do Plano Diretor de Drenagem”, conclui a nota.

Também por meio de nota, o Município afirmou que o Plano Diretor em vigor no já estabelece uma série de ações de sustentabilidade e de proteção ambiental. Também acrescenta que a proposta de Plano Diretor do Município enviada pelo Executivo à Câmara Municipal em 2017 apresentava um estudo ainda mais amplo para o desenvolvimento do setor, mas o documento foi rejeitado em votação pelo Legislativo.
 
SOLUÇÕES
Vista aérea do Parque Linear do Rio Uberabinha; especialistas apontam para deterioração de área verde na zona urbana | Foto: Divulgação


Para diminuir o calor, seria necessária a criação de mais áreas verdes na cidade. O biólogo Gustavo Malacco dá um exemplo que já existe na Alemanha: telhados ocupados por vegetação. “As prefeituras alemãs incentivaram que os prédios, que as casas passassem a ter telhados verdes. Você diminui as ilhas de calor. Agora uma cidade que poda, corta árvores e não tem uma política municipal de arborização urbana… Basta ver a temperatura quando você chega no rio Uberabinha e quando você chega um pouquinho para o centro, vai ver a diferença de 4 ou 5 graus”, afirma.

Na opinião da professora Ângela Soares, para reduzir as enchentes, seria necessário reduzir a repentina chegada das águas aos córregos. Ela precisaria ser retida em algum local e soltada lentamente nos canais pluviais. Para isso, ela sugere a criação de bolsões de infiltração e trincheiras na cidade. Em alguns lugares eles já existem. “No Novo Mundo, no Jardim Sucupira são bairros que já têm bolsões. Então, quando chove, a água fica retida lá um tempo”, diz.  A avenida Anselmo tem uma trincheira que também auxilia no escoamento.

A pesquisadora ainda recomenda outras medidas, como a conscientização da população. Seria possível utilizar a água das chuvas para realizar diversas atividades, como lavar calçadas e carros. Além de economizar, auxiliaria no escoamento. “Podemos criar praças alternativas, que num primeiro momento essas áreas gramadas receberiam a drenagem das chuvas e depois iriam liberando essa água e filtrando lentamente. E no período em que não chove, essa área poderia ser usada pela população para recreação, atividades esportivas”. Ainda assim, é preciso pensar em quem mais utiliza a água: o setor agrícola. Para Soares, seria necessário que quem trabalha nesta área também fosse conscientizado.
 
CLIMA
De acordo com a Estação Meteorológica da UFU, pertencente ao Instituto Nacional de Meteorologia (INMET), em Uberlândia, entre os dias 1º e 20 de dezembro já havia chovido 251,2 milímetros. O número é alto, mas parecido com mês de dezembro dos outros anos: em 2016, foram 250,6 mm; em 2017, 261,8 mm; e em 2018, 412,8 mm. Apesar de o mês ainda não ter acabado, é possível perceber que o valor ainda não aumentou em relação ao ano passado.

Os meses mais secos também são uma constante. De 2016 a 2018, julho se mantém com 0 mm de precipitação. Em 2019, o mês com menos precipitação foi junho, com 0 mm. Julho teve 0,2 mm. Os meses em que houve mais chuva costumam ser no verão ou próximos ao verão. Em 2016, choveu mais em novembro; em 2017, em março; em 2018, em dezembro; e em 2019, também em dezembro.

 
Nota-se que, apesar de mudanças climáticas como o aquecimento global, as chuvas intensas e o período de secas não são novidade em Uberlândia. “Isso está dentro do padrão histórico que ocorre na região. Nós temos anos em que chove mais, em que chove menos, mas isso não foge daquilo que chamamos de normal climático”, diz o climatologista Paulo Cezar Mendes, da UFU.

O professor explica que os únicos meses em 2019 que apresentaram mudanças foram janeiro, quando a precipitação ficou em 85 mm (geralmente, o valor chega a 200 mm) e março, quando ficou em 100 mm (costuma ser acima de 170 mm).









 

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