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18/11/2018 às 07h50min - Atualizada em 18/11/2018 às 07h50min

Jogadores de clubes pequenos sofrem com falta de calendário

Somente 6% dos atletas terminam a temporada trabalhando todos os meses do ano

EDER SOARES
O meia Mário Cézar defendeu as cores do Patrocinense no campeonato mineiro | Foto: Divulgação
Grande parte das crianças brasileiras sonham em um dia se tornarem jogadores de futebol profissional, vestir a camisa de grandes clubes do Brasil e da Europa, da Seleção Brasileira e ganhar muito dinheiro para ajudar a família. Mas sucesso e fortuna, na verdade, é para a minoria dentro do futebol atual. Números levantados pela Federação Nacional dos Atletas Profissionais de Futebol (Fenapaf) mostra uma triste realidade e que pode servir como reflexão para quem deseja entrar no mundo do futebol. A Fenapaf representa atletas profissionais do futebol brasileiro, atualmente cerca de 18 mil.  Segundo levantamento da instituição, 70% dos atletas profissionais chegam ao meio do ano sem calendário, e para o fim da temporada este índice sobe para 94%, com somente 6% por cento de jogadores terminando o ano trabalhando, atletas a maior parte em clubes das Séries A e B do Brasileiro.
 
A Fenapaf, que tem sede no Rio de Janeiro, foi fundada em 1990 com o objetivo de aumentar a representatividade e a defesa sobre os direitos dos atletas profissionais de futebol em nível nacional.  “Nosso foco é buscar melhorias nas condições de trabalho dos atletas. Temos lutado muito por um calendário mais equilibrado no nosso futebol, não pode um atleta fazer 70, 80 jogos por ano, enquanto outros chegam em abril sem partidas mais para serem realizadas. A relação dos clubes também precisa ser mais respeitosa, os compromissos precisam ser profissionais e precisam honrados. Os atletas necessitam dos salários em dia, do 13º, do devido descanso assim como qualquer outro trabalhador”, disse o presidente da Fenapaf, Felipe Augusto Leite.
 
As condições precárias de trabalho, falta de apoio médico, a instabilidade financeira, o desrespeito com os compromissos profissionais previamente acordados contribuem muito para o desemprego no futebol brasileiro, segundo estudos da Fenapaf, que segue sugerindo mudanças pontuais nos regulamentos esportivos e sempre procurando um diálogo com a Confederação Brasileira de Futebol (CBF), Federações estaduais e tribunais de justiça em busca de melhores condições de trabalho para os atletas brasileiros.

HISTÓRIAS
 
O meia Mário Cézar tem 37 anos. Natural do Rio do Janeiro, o jogador mora atualmente em Patrocínio, onde trabalha como coordenador de esportes na prefeitura local e onde também defendeu as cores da Patrocinense no Campeonato Mineiro. Devido à falta de espaço em clubes profissionais no segundo semestre, aos finais de semana, para complementar a renda, o jogador vem disputando o Campeonato Amador de Uberlândia, onde defende o Voluntários.
 
Mário iniciou a carreira no CFZ (RJ), passou por 22 equipes, como Paraná Clube, Guarani de Campinas (SP), Sampaio Correa (MA), Volta Redonda (RJ). O Uberaba foi seu último clube na disputa da Terceira Divisão Minera neste ano.
 
“O histórico do jogador brasileiro é de grande dificuldade, até pela quantidade de atletas que existem e pela forma com que o futebol é conduzido. Isso faz com que você tenha muitos jogadores operários, que sobrevivem do futebol. Eu, mesmo apesar de ter jogado por 22 clubes, hoje, dou continuidade na minha vida de uma forma diferente para sustentar a minha família”, disse Mário que finalizou falando sobre os não pagamentos.
 
“Você ainda passa por clubes que não te pagam, que firmam compromissos com você e você acaba não recebendo o que estava programado. Hoje estou com três clubes na justiça e talvez isso possa me servir como uma aposentadoria, entre aspas, mas até que a justiça bata o martelo e obrigue a te pagar, agente continua na mesma situação. Mas não tenho muito a reclamar do futebol, pois ele me proporcionou em mais prós do que contras”, afirmou.
 
Outro rodado pelo futebol brasileiro é o centroavante Marcelo Régis, artilheiro do Uberlândia Esporte Clube no acesso à primeira divisão de 2015. Aos 35 anos ele faz um balanço da vida do jogador de clubes de menores expressão. Depois de disputar o Mineiro pelo Patrocinense, o jogador não conseguiu se empregar no segundo semestre.
 
“Esse negócio no Brasil é bem complicado, pois querendo ou não você só tem segurança em duas ocasiões, que são as Séries A e B do Brasileiro. O resto, a própria Série C, que tem até um calendário legal, já acabou a mais de um mês. Eu já tive esse problema de calendário. Trabalhei até maio e fiquei até dezembro desempregado. É bem complicado”, disse Régis.

“Muitas das vezes o atleta joga, não recebe do time, mas acaba permanecendo assim mesmo porque ele precisa apresentar um material para se empregar mais tarde. O futebol brasileiro é muito injusto. Se você pegar um  jogador de série A ele ganha salário, ele ganha bicho, ele ganha direitos de imagem e ele ganha patrocínio, e várias rendas que o futebol proporciona para ele, enquanto a maioria mal tem o salário no final do mês e bem curto. O Brasil é muito grande, e pelo tamanho que tem deveria ter uma organização maior, com pelo menos seis divisões”, completou o centroavante.
 
Com apenas 21 anos, o atacante Saulo é uma das promessas formadas na base do Uberlândia Esporte. Apesar de estar há dois anos como atleta profissional do UEC ele já rodou por clubes do interior de São Paulo e chegou a desistir da carreira, quando foi visto pelo clube atuando no futebol amador e receber mais uma oportunidade. No ano passado, foi emprestado ao América Mineiro e acabou retornando ao Verdão.
 
No segundo semestre deste ano, depois de jogar o Campeonato Mineiro e Serie D pelo Uberlândia, o jogador foi emprestado para o Araxá, onde disputou a Tereirona Mineira. Em quatro meses no Ganso, não recebeu um mês sequer de salário do Ganso, que mesmo sem pagamentos chegou a disputar uma vaga de acesso para o Módulo II contra o Coimbra, sendo eliminado na decisão por pênaltis.
 
“Desde pequeno queria ser em ser jogador de futebol, o que acontece com todas as crianças. Creio que é a primeira coisa que vem na cabeça é dar uma segurança para a sua família e ter sucesso na carreira. Eu já joguei em times de maiores e de menores expressão, em base. Graças a Deus tenho um contrato com o Uberlândia, caso contrário eu estaria parado”, disse Saulo que falou sobre o que sabe de muitos amigos boleiros.
 
“Muitos amigos meus jogam o primeiro semestre e ficam o segundo parado. São muitos jogadores no Brasil para poucos times, principalmente no segundo semestre, onde diminuem as competições. No segundo semestre, o jogador que tem casa, filhos e esposa precisa se virar. Se você não fizer um primeiro semestre bom irá ficar desempregado o resto do ano. É uma grande dificuldade, pois terá que fazer bico, se fichar em alguma empresa ou em aplicativos de táxi”.
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