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25/02/2018 às 05h32min - Atualizada em 25/02/2018 às 05h32min

Argentina tem berçário selvagem

Praias da Península Valdés recebem grande número de baleias, pinguins e lobos-marinhos o ano todo

FELIPE MORTARA | FOLHAPRESS
Pinguins-de-magalhães em Península Valdés, na Argentina | Foto: Divulgação

A península Valdés, 1.330 quilômetros ao sul de Buenos Aires, é o grande berçário de vida selvagem do litoral argentino. Uma espécie de Galápagos do Atlântico Sul.

Declarada patrimônio mundial pela Unesco em 1999, a quase ilha plana e árida de 3,6 mil quilômetros quadrados justifica o status. É comum passar longas horas na estrada a partir da cidade de Puerto Madryn, cruzando pampas imensos com o horizonte infinito repleto de guanacos  – mamíferos nativos da família das lhamas.

O objetivo é alcançar as praias e pontas de pedra onde lobos-marinhos e elefantes-marinhos formam numerosas colônias. Isso sem falar nas pombas-antárticas e nas dezenas de milhares de pinguins-de-magalhães.

Privilegiado praticamente o ano inteiro por fartura de vida, entre julho e novembro o destino se torna ainda mais especial. Não por suas águas verdes e translúcidas, mas pelas imensas baleias-francas-austrais que vêm dar à luz e se reproduzir nas áreas mais abrigadas do golfo Nuevo. Na época certa, o visitante avistará pelo menos uma gigante num passeio de barco.

Mesmo não sendo um parque nacional, é uma área de preservação privada em meio a cerca de 50 fazendas. Isso porque o governo argentino distribuiu vastas porções de terra a imigrantes do País de Gales no fim do século 19 a fim de colonizar o território.

O turismo é levado a sério na península Valdés, com um cuidado insistente por parte dos guias. Principal museu da região, o caprichado Ecocentro (ecocentro.org.ar) é o símbolo do importante papel de educação ambiental que a visita ao lugar representa.

O aeroporto de Trelew, capital do Estado de Chubut e 60 quilômetros ao sul de Puerto Madryn, é a entrada da região. A cidade portuária de 104 mil habitantes é um dos centros industriais da região patagônica, dedicado principalmente à produção e exportação de alumínio.

ATRAÇÕES

O turismo ultrapassou a atividade pesqueira e assumiu o posto de segundo pilar econômico da cidade. O bem arrumado centro de Trelew, com um calçadão à beira do porto, fica a 60 quilômetros da entrada da reserva.

Os tours para explorar a península são vendidos por várias agências do centro e custam por volta de 1,8 mil pesos (R$ 350) por dia. Leve em consideração que os trechos de carro podem passar de seis horas entre ida e volta.

Em um desses passeios, o turista percorre 160 quilômetros que separam o centro de Puerto Madryn e a Punta Norte. Entre março e abril, somente ali e em mais nenhum canto do mundo o viajante pode testemunhar um fenômeno raro. Um grupo de cerca de 30 orcas aprendeu a caçar filhotes de lobos-marinhos atirando-se e encalhando nas areias. A única contrapartida é ter muita paciência.

VILA

Outra opção para descobrir mais a fundo a área de proteção é abrir mão do conforto dos melhores hotéis de Puerto Madryn, como o Território (hotelterritorio.com.ar) e o península Valdés (hotelpeninsula.com.ar), e ficar em Puerto Pirámides. Com apenas 700 moradores e a 92 quilômetros de Madryn, a vila rústica tem poucos restaurantes. Mas é o ponto de saída dos tours para ver as baleias.

A partir dali é possível explorar as deslumbrantes áreas do golfo San José e de Punta Delgada com carro alugado, tornando o roteiro mais contemplativo.

Dois a cinco dias são o ideal para desbravar com calma a região, avistar baleias e observar os imensos elefantes-marinhos dominando seus haréns na Caleta Valdés. Além da Antártida e de ilhas oceânicas, esse é o único lugar da América do Sul onde é possível avistá-los. Ou então deslumbrar-se com flamingos, garças, gaivotas e biguás na Isla de los Pájaros.

Ensolarada e seca, a região também recebe ventos fortes, que fazem a sensação térmica despencar.

Mesmo no verão, com temperatura que vai de 14ºC a 29ºC, recomenda-se que os visitantes se vistam em camadas, sendo a externa com tecido corta-vento. Óculos de sol, protetor solar, luvas e gorro são itens obrigatórios.

As poucas chuvas caem entre abril e junho, pouco antes da chegada das baleias. A melhor época para vê-las é de setembro a novembro.

Para além dos passeios de carro entre pontos distantes, separe um tempo para praticar atividades físicas. Algumas agências oferecem roteiros em mountain-bike ou caminhadas por encostas. Se descobrir novos ângulos em terra não for suficiente, saiba que Puerto Madryn é a capital argentina do mergulho, e ali se pratica até snorkel em meio a lobos-marinhos.

ÁGUAS TRANSPARENTES

Baleia-franca busca o lugar para dar à luz

A baleia-franca-austral é a rainha entre dezenas de espécies que tornam a península Valdés um lugar único. O mamífero fez desse o seu rincão favorito no mundo para dar à luz e se reproduzir.

De julho a novembro, os animais saem da Antártida e invadem as águas da região. Junto com eles vêm elefantes-marinhos, golfinhos e muitas aves – além de turistas do mundo inteiro.

A enorme concentração de baleias somada à transparência das águas tornou esse um destino sem igual para os visitantes.

Rodeada por falésias amareladas, Puerto Pirámides é o epicentro do turismo na temporada. Ficar perto dessas criaturas, que podem alcançar 18 metros de comprimento e pesar até 40 toneladas, é uma experiência transformadora.

É como estar dentro de um documentário de natureza da TV a cabo. É possível até escutar a respiração das baleias e por vezes se molhar com seus borrifos. Curiosas, elas podem se aproximar e chegam a encostar nas embarcações. Porém, é proibido tocá-las.

Os machos, mais exibidos, tentam seduzir as fêmeas com saltos acrobáticos imprevisíveis. Mães ensinam seus filhotes a mamar e a nadar com desenvoltura.

Outrora ameaçadas de extinção por conta da caça desenfreada no século 20, hoje as baleias são protegidas e louvadas como protagonistas. Seu nome em inglês, southern-right whale, veio do jargão baleeiro de que essa era a espécie certa para matar, porque boiava após ser arpoada.

Até o século passado foram abatidas centenas de milhares de baleias-francas. Atualmente existem cerca de 12 mil no mundo, boa parte delas passa o inverno e a primavera na península Valdés.

NO BRASIL

Quem quer ver baleias-francas, mas não pensa em visitar a Argentina tão cedo, pode fazer isso sem sair do Brasil. Uma parcela desses animais segue para o sul do país. Entre meados de agosto e setembro o litoral sul de Santa Catarina é o lugar mais fácil para ficar cara a cara com as gigantes.

Localizada ao longo de 130 quilômetros de costa entre nove municípios, incluindo Garopaba e Imbituba, a Área de Proteção Ambiental da Baleia-Franca é a melhor região para encontrar os cetáceos. Uma força tarefa de guias se espalha pelas praias procurando borrifos no horizonte. É bem comum os animais ficarem a poucos metros da areia e de costões.

Menos procurados, os tours por terra são uma opção mais econômica e boa para os dias de mar revolto.

Duas empresas operam saídas de barco de pelo menos uma hora e meia regularmente na temporada por valores entre R$ 90 e R$ 140. A Base Cangulo (basecangulo.com.br) e a Vida Sol e Mar (vidasolemar.com.br) são as principais operadoras do passeio.
 
CAPITAL DO MERGULHO

Temperatura da água é inferior a 10°C

A península Valdés parece ter vocação para surpreender. Ao desembarcar nessa parte da Patagônia, um vento frio e incessante dá as boas-vindas ao turista.

O mar tem um tom esverdeado bonito, mas não dá vontade de entrar. Mesmo assim, essa é a capital argentina do mergulho. Sim, apesar de a água ter temperaturas inferiores a 10°C, a atividade é um dos carros-chefes do turismo na região.

Esse é um dos únicos cantos do mundo onde é permitido mergulhar em meio a dezenas de lobos-marinhos. E o melhor: essa vivência pode ser experimentada usando apenas máscara, snorkel e nadadeiras.

Operadoras como a Master Divers (masterdivers.com.ar) oferecem a atividade por 2,5 mil pesos (R$ 500). Mergulhadores certificados podem utilizar cilindro (mais 800 pesos, ou R$ 130) e ter ainda mais interações com os animais.

O ponto de encontro é a lobería de Punta Loma, a 40 minutos de barco de Puerto Madryn. Ali, mais de 300 lobos-marinhos se espalham sobre platôs de pedra sedimentar amarelada.

Na maré cheia, partem em busca de peixes e moluscos. Ao dar de cara com humanos, arriscam um balé conjunto e investigam cada detalhe. Não se assuste se levar mordiscadas nas nadadeiras e na roupa grossa de neoprene com capuz.

Não bastasse a experiência de nadar com lobos, as águas de Puerto Madryn abrigam uma série de naufrágios. Em pelo menos cinco deles o mergulho é operado regularmente.

Um dos mais visitados é o Folias, com 60 metros de comprimento, que está parcialmente na superfície e aflora na maré baixa a cerca de 300 metros da Playa Paraná. É o lugar ideal para mergulhadores recém-certificados e não oferece dificuldades ou perigos.

Já o cargueiro Antonio Miralles foi à pique em 2004 a três quilômetros da costa, após passar alguns anos apreendido no cais de Puerto Madryn.

A associação de operadores locais conseguiu autorização para afundá-lo depois de a polícia flagrar grande quantidade de cocaína em seu interior. Com seus 60 metros, repousa a 26 metros de profundidade. Quem descer até lá pode percorrer seus porões e corredores e descer escadas segurando no corrimão.

Forrado por mariscos e corais moles, o navio não é abundante em vida selvagem, mas alguns grandes salmões do Atlântico se escondem sob o seu casco.

A visibilidade nem sempre é ideal, mas percorrer o naufrágio vale a pena. Cruzar trechos estreitos e escuros pode exigir um pouco dos nervos, mas a sensação compensa e faz esquecer a água gelada.
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