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28/07/2022 às 14h38min - Atualizada em 28/07/2022 às 14h38min

Fechamento do Centro de Saúde Jaraguá, em Uberlândia, dificulta acesso à saúde dos moradores da região

Unidade está fechada há quase 11 meses após a Vigilância Sanitária apontar irregularidades; população de baixa renda reclama da falta de assistência médica no bairro

IGOR MARTINS I DIÁRIO DE UBERLÂNDIA
Manifestação de moradores do Jaraguá pediu a retomada das atividades na unidade I Foto: Arquivo Pessoal

O Centro de Saúde Escola Jaraguá (CEJAR), da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), está há quase 11 meses com os serviços interrompidos. A unidade foi fechada em setembro de 2021 para o cumprimento da sentença judicial de uma ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal (MPF) que comprovou várias irregularidades no local. A situação tem causado transtornos aos moradores do bairro, que sofrem com a falta de acompanhamento médico gratuito na região.

Moradora do bairro Jaraguá há mais de 12 anos, Alexia Dias relatou as dificuldades vivenciadas pela população local em conseguir consultas médicas nas redondezas. Desde o fechamento, todos os atendimentos realizados no CEJAR foram transferidos para as Unidades de Atendimento Integrado (UAI) dos bairros Planalto e Luizote de Freitas. “Estamos muito preocupados com a falta do posto de saúde devido à covid-19, sarampo e dengue. Temos muitos idosos e crianças que precisam de atendimento. Além do prejuízo à saúde, nós também temos que lidar agora com o prejuízo financeiro, porque para garantirmos um atendimento médico, precisamos nos deslocar até unidades de outros bairros”, destacou.

De acordo com a uberlandense, a ida do Centro de Saúde até a UAI Planalto totaliza aproximadamente 2km. A situação é ainda mais complicada caso o paciente queira atendimento na unidade do Luizote, já que a distância estimada é de quase 5km. Outra possibilidade é ir até a Unidade Básica de Saúde (UBS) Dona Zulmira, a 3km do local. “A pessoa precisa pagar R$ 4,50 no ônibus para ir e para voltar, já dá quase R$ 10. Se pedir uma corrida de aplicativo, fica mais de R$ 20. Isso faz falta no final do mês, no orçamento das pessoas. O que queremos é que as autoridades tomem uma providência para ajudar na reabertura do centro de saúde”, disse Alexia.

Na última semana, vários moradores do bairro Jaraguá se reuniram na porta do CEJAR para cobrar a reabertura imediata da unidade de saúde. Os manifestantes levaram faixas e panelas com os dizeres “saúde é um direito de todos” e “juntos pelo retorno do postinho do bairro Jaraguá”. “Nós fizemos barulho para cobrar a reabertura dessa unidade de saúde, porque realmente nós precisamos disso. O Jaraguá é o único bairro de Uberlândia que não tem uma unidade de saúde e isso nos preocupa. Estamos acionando a Justiça, pedindo que eles tomem um posicionamento para que as autarquias reabram o CEJAR”, falou a uberlandense de 36 anos.

Outra dificuldade relatada por Dias é com relação ao atendimento nas UAIs, já que as unidades atendem casos de urgência e emergência. Em sua visão, um paciente que precisa de atendimento básico dificilmente consegue ser atendido com a mesma exatidão e rapidez como era no Centro de Saúde do Jaraguá.

“Uma pessoa que precisa de um psicólogo, assistente social ou dentista demora muito tempo na UAI, porque não são necessariamente casos graves. Nas UAIs, o atendimento segue o sistema de cores, a vermelha, a amarela e depois a verde. Uma consulta que demoraria 40 minutos no CEJAR demora várias horas, isso toma tempo. Queremos que esse impasse termine”.

ACOMPANHAMENTO MÉDICO
Aos 57 anos, Cássia Gomes já sofreu dois infartos e sofre diariamente com a pressão alta. A recomendação é de que ela faça acompanhamento médico de seis em seis meses, mas o fechamento do CEJAR prejudicou o planejamento. Como não tem carro e possui baixa renda, ela conta que, quando precisa de uma consulta, vai a uma UAI a pé. Cássia também tem problemas de coluna e joelho e relatou que quebrou a mão em junho. Com fortes dores, ela conta que não consegue mais fechar o membro e que precisa de fisioterapia, mas a ida a uma unidade de saúde fica complicada devido à distância.

“Tem 43 anos que moro aqui e nunca tive problema com isso. Quando preciso de atendimento médico, preciso ir a pé e gasto mais de uma hora. É complicado por causa do meu problema no joelho, não consigo andar rápido. A gente precisa muito que o centro de saúde volte aqui para o nosso bairro”, afirmou Cássia Gomes.

Além das questões da uberlandense, o marido também tem problemas de saúde e a neta, de apenas 13 anos, precisa de acompanhamento psicológico. “Minha neta faz esse acompanhamento porque perdeu a mãe, mas hoje em dia ela não consegue. A gente liga na UAI para marcar, mas não consegue”, disse.

ACAMADA
A aposentada Adenir Lazara de Siqueira também tem tido transtornos com o não funcionamento do Centro de Saúde Escola Jaraguá. Atualmente, a uberlandense tem 70 anos de idade e a locomoção já não é mais a mesma de outros tempos. A questão fica ainda mais complicada com sua mãe, de 87 anos, que é acamada.

Adenir conta que, antigamente, era mais fácil se deslocar até o CEJAR devido à proximidade. Com a transferência dos atendimentos para as UAIs Planalto e Luizote de Freitas, conseguir atendimento médico se tornou uma tarefa árdua.

“Eu tenho problemas nos rins e pressão alta, e preciso de atendimento. Minha mãe é acamada e anda só um pouquinho. Eles mandam a gente ir nas UAIs, mas é difícil sair daqui e pegar dois ônibus. Quando minha mãe precisa, a gente tem que pedir uma corrida de aplicativo. Eu não acho justo, o posto de saúde precisa voltar, tem sido muito difícil o deslocamento”, contou.

ENTENDA O CASO
Desde setembro de 2021, o CEJAR está fechado em razão de uma ação do MPF, que apontou várias irregularidades detectadas pela Vigilância Sanitária nos últimos dez anos. A sentença judicial concedeu um prazo para regularização das pendências que ia até dezembro do mesmo ano, mas o posto de saúde continua fechado até então.

A ação civil pública foi ajuizada pelo procurador geral da República, Cléber Eustáquio Neves, em 2016. No documento, ele solicitava que fossem sanadas uma série de inconformidades apresentadas na unidade de saúde, listada em diversos relatórios de inspeção sanitária das vigilâncias municipal e estadual. Entre as irregularidades, foram citadas a área física, recursos humanos, segregação de resíduos, ausência de projeto arquitetônico e sala de espera com área útil inadequada.

Nas vistorias foram detectadas ainda a inexistência de sanitários, de sala exclusiva para a guarda de medicamentos e de ambiente adequado para a paramentação dos funcionários. O local para depósito de material de limpeza da unidade também foi considerado inadequado, além da falta de armários e sala de triagem. Ainda segundo a ação, o Centro de Saúde foi considerado insalubre e coloca em risco a vida e a saúde de pacientes.

As irregularidades eram percebidas desde 2009. Ao longo de mais de 10 anos foram realizadas sete inspeções sanitárias. A última vistoria citada no processo foi em outubro de 2020. Nela, os agentes sanitários concluíram que não foram feitas adequações da maioria das não conformidades citadas no relatório anterior, além de apresentar novas irregularidades que precisam ser corrigidas para garantir a manutenção da qualidade da assistência.

POSICIONAMENTOS

UFU
Por meio de nota, a Administração Superior da Universidade Federal de Uberlândia (UFU) informou que as não conformidades detectadas pela Vigilância Sanitária no Centro de Saúde Escola Jaraguá (Cejar) indicadas em relatórios de inspeção sanitária foram sanadas, em acordo com a sentença judicial exarada nos autos de uma Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público Federal em dezembro de 2021.

A partir das adequações, a retomada das atividades assistenciais, de ensino, pesquisa e extensão poderia ter ocorrido desde janeiro de 2022. No entanto, o financiamento do Cejar, antes vinculado ao Hospital de Clínicas (HC-UFU), foi impossibilitado a partir da transição da gestão desta unidade de saúde para a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh). A reabertura do Cejar pressupõe convênio com a Secretaria Municipal de Saúde de Uberlândia, que é a unidade gestora local do SUS e a responsável pela atenção primária à saúde no município. O referido convênio ainda se encontra em apreciação pela Prefeitura Municipal de Uberlândia.

“Ressaltamos que o Cejar sempre representou um espaço de formação de profissionais de saúde, em termos de ensino, pesquisa e extensão, dos graduandos dos cursos de Enfermagem, Medicina e Nutrição e residentes dos Programas de Residência Multiprofissional e Residência em Medicina de Família e Comunidade da Faculdade de Medicina (Famed/UFU), da Faculdade de Odontologia (FOUFU) e também de outras Unidades Acadêmicas com cursos na área de Saúde. No ano de 2019, por exemplo, 633 estudantes e 27 docentes desenvolveram atividades no local.

O Cejar compreende, ainda, o cuidado à saúde, em nível de atenção primária, a uma população estimada de 15 mil habitantes, residentes nos bairros Jaraguá e Tubalina. A valorização e a importância do Cejar para a UFU se refletem nos esforços envidados pela Administração Superior para a adequação do centro e para que as atividades assistenciais e de ensino possam ser retomadas”, consta a nota.

EBSERH
A Ebserh disse que o Centro de Saúde Escola Jaraguá não é administrado pela estatal. Por tal razão, nenhum contrato administrativo firmado pelo Hospital de Clínicas/Ebserh contempla a estrutura do Jaraguá.


MUNICÍPIO
Por sua vez, a Secretaria Municipal de Saúde informou que o convênio entre a Universidade Federal de Uberlândia (UFU) e a Prefeitura de Uberlândia  ainda segue em análise, pois está sendo acompanhado pelo Ministério Público Federal (MPF). Ressaltou ainda que todos os atendimentos que eram realizados no local pela equipe da UFU foram remanejados para as unidades de saúde próximas ao local. Nos casos em que o ambulatório da Unidade de Atendimento Integrado (UAI) Planalto não ofereça alguma especialidade, a consulta é marcada para uma unidade mais próxima que ofereça o atendimento.

A secretaria reitera que o Município já está dando assistência à comunidade atendida neste setor, sendo que a decisão de reabertura cabe, agora, exclusivamente à UFU, independentemente de convênio, por se tratar de uma unidade com finalidade de ensino.
 
MPF
Já o MPF informou que não há, por parte do órgão, impedimento algum para que o Centro de Saúde Escola Jaraguá (CEJAR) possa funcionar, pois as questões suscitadas na ação civil pública já foram sanadas. “Para que o centro volte a funcionar é necessário que a UFU, através de seu reitor, celebre um contrato de comodato com a Prefeitura Municipal de Uberlândia, para cessão do local.

Inclusive o MPF já enviou ofício à UFU, no dia 14 de julho, solicitando que seja feito esse contrato. No ofício encaminhado ao reitor da UFU, é requerido ainda que seja assegurado nesse contrato a participação, obrigatória, de alunos dos cursos de Medicina e de outras áreas da Saúde da universidade, oportunizando-lhes o acesso, ao atendimento de pacientes do SUS, tanto na Atenção Básica como na Atenção Secundária”, disse o órgão.

*Matéria atualizada às 18h54 do dia 29/07/2022 para acréscimo de informações.

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