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15/06/2021 às 14h15min - Atualizada em 15/06/2021 às 14h15min

Autoridades divergem sobre aborto por telemedicina no HC-UFU

Ministério da Saúde emitiu neste mês documento contrário à realização do procedimento; MPF recomendou pela continuidade dos atendimentos de forma remota

LORENA BARBOSA
Em Uberlândia, atendimento é oferecido pelo Núcleo de Atenção Integral a Vítimas de Agressão Sexual (Nuavidas) em parceria com o HC-UFU I Foto: ARQUIVO DIÁRIO
Desde agosto de 2018, o serviço de aborto legal através da telemedicina é oferecido pelo Núcleo de Atenção Integral a Vítimas de Agressão Sexual (Nuavidas), em parceria com o Hospital de Clínicas da Universidade Federal de Uberlândia (HC-UFU). O trabalho de forma remota foi idealizado pela ginecologista e obstetra, Helena Paro, para que as vítimas de estupro pudessem continuar com o atendimento adequado mesmo com a pandemia do coronavírus.
 
O tema gerou uma nova discussão recente. Isso porque, no último dia 10 deste mês, o Ministério da Saúde emitiu uma nota informativa orientando que o serviço não fosse mais realizado. O documento, assinado por três médicos do Ministério, questiona o fato de o medicamento abortivo ser ministrado fora do hospital, mas não cita nenhuma referência científica como fonte.
 
Atualmente, o procedimento é autorizado em mulheres que sofreram violência sexual, cuja gestação esteja com até nove semanas (63 dias). Isso porque, atualmente, no Brasil o aborto é legalizado em apenas três casos: estupro, anencefalia e risco à vida da mulher.
 
Todas as mulheres que sofrem violência sexual têm direito ao aborto. O procedimento por telemedicina é oferecido somente no HC-UFU. O atendimento começa no Pronto Socorro e em seguida as vítimas são encaminhadas para o Núcleo de Atenção Integral. 
 
De acordo com a psicóloga do Nuavidas, Marisa Elias, em geral, é feita uma consulta presencial onde a paciente é ouvida por uma equipe composta de médicos, psicólogos e assistente social. Confirmada a gestação, a paciente tem três opções: ter a criança e ficar com ela, ter a criança e entregar para adoção, ou optar pelo aborto legal.
 
"Em nenhum momento a mulher fica sem acompanhamento, ela é acompanhada o tempo todo. Não é entregue uma medicação e a paciente é mandada para casa sem referência", destacou a profissional.
 
A psicóloga contou que o núcleo recebeu a nota do Ministério da Saúde com muita tristeza pela falta de conhecimento demonstrada. "Não se informam sobre o procedimento e acabam divulgando ele de forma completamente enganosa", afirmou.
 
Segundo informações do Nuavidas, desde o início dos atendimentos no ano passado foram atendidas dezessete pacientes, e nenhuma intercorrência foi registrada.
 
A nota do Ministério Público tem caráter informativo e não normativo, ou seja, não é uma regra. Portanto o protocolo continua sendo realizado normalmente no HC-UFU.
 
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
O Ministério Público Federal recomendou que o aborto por telemedicina continue sendo realizado normalmente no HC-UFU. O procurador do MPF, Leonardo Andrade, explicou que em agosto do ano passado, houve o parecer favorável pela comissão de ética do Hospital de Clínicas, e que diante de toda a análise jurídica, foi recomendado que o protocolo fosse implementado. Desde então, nenhum caso atendido apresentou problemas.
 
Diante do posicionamento do Ministério da Saúde, o MPF achou melhor emitir a recomendação para que não haja dúvidas quando à legalidade do procedimento.
 
Andrade explicou ainda que o aborto por telemedicina é uma das opções que as mulheres têm, mas, caso prefira, a paciente pode permanecer internada durante todo o atendimento. "O protocolo é uma alternativa a mais que a mulher tem de fazer o procedimento em casa. Sem correr o risco de contaminação, sem correr o risco de olhares incriminatórios. Quem decide em última instância é a mulher", destacou o procurador.
 
CRIANÇAS E ADOLESCENTES
A psicóloga Marisa Elias ressaltou que no período de reclusão da pandemia, as denúncias de violência contra crianças e adolescentes que chegaram ao Nuavidas aumentaram consideravelmente. "Meninas de 11, 12 anos, que às vezes são violentadas em festas clandestinas ou por parentes próximos que acabam engravidando", disse.
 
Em casos de violência que não geraram uma gestação, as consultas também são feitas por vídeo- chamada. "Todos os pacientes são acompanhados por psicólogos durante um tempo porque é uma agressão muito forte", explicou a profissional.
 
CARTILHA
O chamado aborto por telemedicina gerou polêmica recente na Câmara Municipal. No início do mês, os vereadores de Uberlândia discutiram uma Moção de Repúdio em relação a uma cartilha desenvolvida pela médica ginecologista Helena Paro em conjunto com o Instituto de Bioética Anis e a Rede Médica Pelo Direito de Decidir (Global Doctors for Choice Brasil).
 
A cartilha intitulada de “Aborto legal via telessaúde” traz orientações para os serviços de saúde sobre este procedimento. O documento, que teve a ginecologista Helena Paro como uma das coordenadoras, foi elaborada pelo Nuavidas. O material indica como recomendações ao serviço de saúde realizar o procedimento de admissão da paciente para teleconsulta de maneira integralmente remota, incluindo todas as fases de atendimento por equipe multiprofissional.
 
Também indica avaliar a paciente clinicamente pelos meios digitais disponíveis - seja por avaliação de exame laboratorial ou ultrassonografia previamente realizados, todos devidamente registrados no prontuário eletrônico. Caso constatada a elegibilidade para o procedimento de aborto legal e as condições clínicas favoráveis para o aborto farmacológico com acompanhamento em telessaúde, a paciente deveria enviar os medicamentos para entrega em domicílio.
 
Após muita discussão entre os parlamentares da Câmara, a Moção de Repúdio foi rejeitada.


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