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11/11/2018 às 08h03min - Atualizada em 11/11/2018 às 08h03min

Plano Diretor segue desatualizado

Apesar das tentativas de novas versões na atual e na gestão passada, documento vigente é o de 2006; lei prevê revisão a cada 10 anos

CAROLINA PORTILHO
Foto: ViaDrones
Se o Plano Diretor precisa ser revisado a cada 10 anos, conforme prevê o Estatuto das Cidades, o de Uberlândia já está defasado há pelo menos dois anos. A versão em vigor é de 2006 e de lá para cá tentativas de implementar um novo texto foram feitas, mas todas sem sucesso. A primeira delas foi em outubro de 2016, fim da gestão do então prefeito Gilmar Machado e pós-eleição municipal. A proposta chegou a ser levada à Câmara de Vereadores, mas nem sequer entrou em pauta e foi engavetada no fim da legislatura.

Trocou-se o comando da cidade e o atual chefe do Executivo, Odelmo Leão, apresentou a revisão do Plano Diretor da cidade com algumas alterações em relação a versão feita em 2016. Por se tratar de um projeto que exigia quórum por maioria absoluta – 14 votos – a matéria foi reprovada, já que obteve 13 votos a favor, 10 abstenções e três ausências – todas da base aliada.

“A bancada independente e de oposição da Câmara achou por bem se abster ao verificar que as emendas, que eram basicamente as propostas que haviam sido aprovadas no plano do Gilmar Machado, foram retiradas”, disse o vereador Adriano Zago (MDB).

Considerado um instrumento essencial para o planejamento e gestão de uma cidade, o Plano Diretor norteia os passos a serem seguidos na saúde, educação, cultura, uso e ocupação do solo, esporte, meio ambiente, entre outras áreas, no sentido de obter melhoria de qualidade de vida da comunidade local. A falta desse planejamento urbano pode afetar a rotina dos moradores, que são parte essencial na construção de um plano.

O grande questionamento sobre a situação de Uberlândia é, justamente, essa participação popular, tendo ocorrido várias audiências públicas em 2016, e uma única em 2017. É o que consta na representação protocolada pelo vereador Adriano Zago em abril deste ano na 10ª Promotoria Especializada na Habitação e Meio Ambiente, no Ministério Púbico de Minas Gerais (MPMG) em Uberlândia.

De acordo com o documento, “após diversas audiências públicas setoriais [em 2016], o Poder Executivo [atual] alterou – entre quatro paredes – o conteúdo do plano diretor, regredindo a sua versão a um plano de gabinete. E, na tentativa de revesti-lo de alguma legitimidade, realizou uma audiência pública pró-forma e sua apreciação ao Conselho de Plano Diretor composto em sua metade por representantes do próprio poder público. Aliás, esta é uma velha conhecida fórmula da teoria de abuso de poder”.

A representação também destacava que a atual gestão modificou o texto da versão revisada em 2016, somando cerca de 19 supressões “arbitrárias de formulações elaboradas e aprovadas nas audiências públicas de 2016”. Diante dos fatos, o documento protocolado no MP pedia a suspensão da votação do novo Plano Diretor até a realização de Conferência Municipal para aprovação do anteprojeto. Também foi solicitado posicionamento do Legislativo sobre os motivos do plano de 2016, protocolado na Câmara em 18 de outubro do referido ano, não ter sido tramitado na Casa para votação.

“Quando o Odelmo apresentou o plano dele, desconfigurando o anterior, de 2016, ele não atendeu o que determina o Estatuto das Cidades, que são as audiências públicas e a aprovação em Conferência Municipal. Não teve na verdade, participação popular. O Odelmo fez uma reunião na sede do Dmae só para falar que fez. Quando esse plano deu entrada na Câmara, o nosso mandato fez essa representação e o nosso pedido de suspensão da votação foi aceito na Promotoria de Habitação e Meio Ambiente”.

O promotor de Justiça Breno Lintz deu o parecer favorável seis dias após o requerimento ser protocolado. “O estatuto da cidade prevê a revisão do Plano Diretor a cada 10 anos, mas não há sanção, penalidades, caso não ocorra. Em relação ao de 2016, o mesmo não chegou a ser tramitado na Câmara, portanto pode ser considerado morto e enterrado. O pedido da representação do vereador foi para paralisar a tramitação do documento alegando riscos de ser aprovado um projeto que eles entendiam que não teve o envolvimento da comunidade. Acatamos o pedido e recomendamos que o prosseguimento deveria ocorrer até que fossem sanadas as irregularidades no que diz respeito a ausência da participação popular”, disse o promotor.

Para o vereador Zago, “frustrar ou negar vigência à participação popular no processo de revisão do Plano Diretor pode vir a ser reconhecido como ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública”.

O Diário solicitou participação da Prefeitura de Uberlândia para saber sobre a revisão do plano apresentado, sobre as mudanças feitas no documento pela atual gestão, mas o pedido de entrevista foi negado. A única resposta obtida foi por meio de nota, que segue na íntegra: “A Prefeitura de Uberlândia informa que não irá submeter nova versão do Plano Diretor ao Legislativo, uma vez que o documento foi concebido em 2016, revisado e atualizado nesta gestão, sendo inclusive apresentado em audiências públicas. Desse modo, o Município informa ainda que prevalece em vigência o Plano Diretor aprovado em 2006 (lei 432/2006).”


Plano Diretor define os rumos da cidade | Foto: ViaDrones

ENTIDADES
Movimentos sociais questionam atual revisão apresentada


A arquiteta e urbanista Marta Maria da Silva fez parte do processo de revisão do plano de 2016, por meio da Central de Movimentos Populares (CMP), que juntamente com outros 12 movimentos sociais protocolaram em abril deste ano, na presidência da Câmara de Vereadores, emendas à Minuta do Projeto de Lei da Revisão do Plano Diretor de Uberlândia. O documento apresentava uma “breve contextualização do processo de discussão e aprovação da minuta do Projeto no âmbito do Executivo, e consideração da importância desse tema para os cidadãos de Uberlândia, na perspectiva de consolidação de uma lei que garanta conceitos como cidade sustentável, preservação do meio ambiente natural e construído, inclusão social e gestão democrática”.

Esse documento contextualiza a maioria das reinvindicações dos diversos segmentos que participaram da audiência. O Plano Diretor que o Odelmo apresentou este ano tem vários prejuízos à cidade no que diz respeito às diretrizes dos instrumentos. Pegamos as duas revisões, de 2016 e 2018, e comparamos. Na primeira, que teve a participação da comunidade, de entidades, de movimentos sociais e de conselheiros, conseguimos alterar bastante o texto do documento, dando mais clareza às ações, como deve ser implementado, deve ser garantido e promovido e não planejar meios, estudar formas”, exemplifica a arquiteta.

Segundo Marta Maria, o grupo de 2016 trabalhou um ano na revisão do plano, que não foi levada em consideração, e que qualquer alteração precisa ser acionada a comunidade para consulta pública. “A cidade é dinâmica e quem realmente conhece dos problemas não foi consultado. Aliás, até teve um chamamento, mas tímido, convocando por e-mail algumas pessoas em cima da hora. O movimento que participo é contra a revisão apresentada pelo atual prefeito, por inúmeros fatores: deixamos claro que o pedestre precisa ter prioridade; que o transporte público precisa ser mais barato; garantir a preservação da região Sul por conta do Bom Jardim, que abastece Uberlândia e ali já abriram um loteamento; garantir que a população de baixa renda tenha acesso à moradia. Nada disso foi levado em consideração”, citou Marta.

SETOR IMOBILIÁRIO
Categoria defende crescimento por anéis e não por áreas isoladas


Contrário à visão dos movimentos sociais, o CEO da ITV Urbanismo e presidente da Associação das Empresas de Loteamento e Desenvolvimento Urbano do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba (Aelo-TAP), José Eduardo Ferreira, defende a revisão do plano apresentada pela atual gestão e garante que mesmo defasado o texto de 2006 ainda é atual.

“O plano de 2006 ainda se adapta muito bem à realidade de Uberlândia, ele ainda é atualizado e promove o crescimento da cidade. O [plano] de 2016 não achamos prudente a proposta, até porque foi feito dentro de assentamentos sem-terra, além de ter um viés muito político”, diz.
Segundo José Eduardo, a associação apresentou à gestão atual um relatório com sugestões para a elaboração da revisão do Plano Diretor. Entre as propostas está o crescimento da cidade em anéis e não por áreas específicas. “Esses aspectos do avanço da modernidade não foram olhados na proposta feita na gestão de 2016. Para a cidade crescer os investimentos precisam ser em anéis e não de forma isolada.”


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