Diário de Uberlândia | jornal impresso e online Publicidade 1140x90
13/09/2023 às 09h40min - Atualizada em 13/09/2023 às 09h40min

Registros de crianças sem o nome do pai crescem 10% em Uberlândia

Mais de 300 recém-nascidos neste ano possuem a paternidade ausente na certidão de nascimento

KAUÊ ALTRÃO | DIÁRIO DE UBERLÂNDIA
Índice equivale a quase 5% das 6,1 mil crianças que nasceram no período de 1º de janeiro a 12 setembro | Foto: AGÊNCIA BRASIL

Mais de 300 bebês foram registrados em Uberlândia neste ano sem o nome do pai. Segundo dados do Portal da Transparência do Registro Civil, o número equivale a quase 5% das 6.118 crianças que nasceram no período de 1º de janeiro a 12 setembro. Nos últimos dois anos, o índice de pais ausentes cresceu 10% na cidade.
 
Em 2021, dos 6.286 recém-nascidos entre janeiro e setembro, 273 também não possuíam o reconhecimento do pai. Em 2022, dos 6.180 nascimentos, 276 não constavam o nome paterno, o que representava 4% do total nos dois períodos analisados. Em 2023, já são 303 crianças sem o registro de paternidade, um crescimento de 9,7% em relação ao mesmo intervalo do ano anterior.  
 
Em entrevista ao Diário, a psicóloga Marilda Coelha explicou que os números não refletem somente uma ausência de registro, mas a falta de uma figura que é um espelho essencial no desenvolvimento desses futuros cidadãos. A profissional avalia que a função paterna vai além da presença jurídica e biológica.
 
“Reconhecer que é o pai e quem é seu pai é uma função importante, tanto para o apoio em criar aquele ser para o mundo, como reconhecer que a criança é um ser, é um sujeito, ela tem direitos para com a paternidade. Isso tudo pode implicar no âmbito pessoal, a criança quando maior, por exemplo, pode achar que não é suficientemente boa para ser amada e por isso o pai não está presente, e isso pode ocasionar diversos outros transtornos”, explicou.
 
Há casos em que a ausência afetiva se mostra mais intensa no âmbito sentimental da criança e pode se tornar perceptível, como, por exemplo, momentos em que ela passa a exprimir algumas ações ou alterações no comportamento do dia a dia, segundo a especialista.
 
“Existem dois casos, primeiro: esse indivíduo passa a reportar essa falta em como percebe a família, seja em desenhos, em histórias ou em brincadeiras. Então, ela pode começar a projetar o sentimento dela em relação a essa ausência. Em segundo caso, quando o sentimento não é dito, expressado, o corpo fala, pode-se perceber então algumas alterações nas suas atitudes do dia a dia: insônia, falta de sociabilização, queda no rendimento escolar e até mesmo ansiedade”, detalhou.
 
Ainda conforme a especialista, nesses casos de falta de reconhecimento ou não convívio com a figura paterna, no desenvolvimento infantil, a criança poderá buscar figuras que lhe tragam exemplos para sua formação moral, mesmo que inconscientemente - seja nos avós, tios, amigos da família ou até mesmo em personagens de desenho.
 
Marilda também ressalta que o modo como a questão é tratada com o bebê e a criança nos primeiros anos, até quando ela começa a ser mais racional, é importante. Segundo ela, é essencial não expor o pequenino a ambientes conflitantes entre os pais e evitar falas ofensivas em relação ao pai ou até mesmo a mãe, por mais delicado que a questão seja para os familiares.
 
“Essas situações colocam a criança em um ringue, observando os pais lutarem nessa troca de ofensas. A difamação pelas partes é danosa para o desenvolvimento infantil. Ele tem que saber o pai que ele tem, mas isso na vida adulta, quando os fatos são percebidos por ela mesma. Nessa idade, onde ela ainda é vulnerável, pode fazer com que ela acabe atribuindo para si a negatividade da parentalidade e se culpar”, enfatiza.
 
Como recomendação, a profissional orienta que é essencial que a questão seja trabalhada conforme a realidade: “você tem um pai, ele só não está aqui nesse momento” ou” não o conhecemos”.
 
Por fim, a psicóloga lembra que, nestas situações, é importante trabalhar o melhor cenário para o filho, instigando também a aproximação, se for do desejo de todos os lados e, principalmente, da criança.


• Compartilhe esta notícia no WhatsApp
• Compartilhe esta notícia no Telegram

AUSÊNCIAS PATERNAS
Segundo os dados do Portal da Transparência do Registro Civil, de 2016 a 2023, foram constatados 72.677 registros de nascimento em Uberlândia. Deste total, 2.700 crianças não contavam com o nome do pai na certidão, representando 3,7% do montante.
 
Em 2016, foram constatados 9.741 nascimentos, dos quais 419 tiveram a falta do registro, o que representou 4,3% do total. Em 2017, nasceram 9.981 bebês, dos quais 37 não possuíam o nome do pai na certidão, representando 0,3%.
 
Em 2018, ano com maior número de recém-nascidos, foram constatados 10.057 registros, porém 312 não tiveram o nome paterno, o que indicou 3,1% do total. Em 2019, foram observados 9.960 nascimentos, no entanto, 426 sem registro do pai, o que representou 4,2% em relação ao total.
 
Em 2020, foram verificados 9.242 nascimentos, dos quais 464 não foram registrados pelos pais. Segundo ano com maior índice, além de 2023, marcando também 5% do total.
 
MUTIRÃO AUXILIA FAMÍLIAS
Para auxiliar famílias que buscam resolver esse tipo de situação, a Defensoria Pública de Uberlândia executa, desde 2010, o “Mutirão Direito a Ter Pai”. O serviço possibilita gratuitamente a alteração da certidão de nascimento, fazendo o reconhecimento paterno sem a necessidade de decisão judicial — nos casos em que todas as partes concordam.
 
Segundo o defensor público e coordenador dos mutirões em Uberlândia, Fernando Orlan Pires Resende, além do registro, também são oferecidos diversos outros atendimentos que possam contribuir para com o reconhecimento paterno.
 
“Disponibilizamos serviços como exames de DNA, investigação de paternidade, regulamentação de guarda, revisão de alimentos e convivência. Nossas ações não são somente registrar, mas discutir toda a questão de convivência e integração da criança com a outra família, além das discussões relacionadas a vivência que ela terá com essa atualização no registro de nascimento”, contou.
 
O mutirão, além de auxiliar no reconhecimento em prol do direito da criança, também viabiliza a discussão entre os pais para a guarda ser compartilhada, e também trata, já no local, de discussões referentes a pensão alimentícia e partilha da guarda.
 
Além disso, segundo o promotor, neste ano, há uma novidade: ocorrerá o reconhecimento afetivo de figuras paternas e maternas, casos em que padrastos e madrastas poderão realizar o reconhecimento das crianças com as quais convivem junto a seus cônjuges.
 
O serviço também é ampliado para as pessoas, já maiores de idade, que também desejam realizar o registro do pai na certidão. O serviço segue a mesma lógica, pai e filho podem realizar o reconhecimento espontaneamente ou, em caso de desconhecimento, é realizado a investigação parental.
 
Para participar, é necessário realizar o cadastro no programa na sede do órgão, localizado na Av. Fernando Vilela, n.º 1.313, no bairro Martins, se segunda a sexta-feira, das 8h30 às 11h. As vagas são limitadas. 
O Mutirão do Direito a Ter Pai de 2023 ocorrerá entre os dias 16 a 20 de outubro, sendo que as inscrições estão abertas até o dia 06 de outubro. Porem, segundo Fernando, o serviço gratuito ocorre durante todo o ano, bastando comparecer a defensoria da cidade.
 
Após o cadastro, será feita a notificação de ambas as partes para comparecerem em um dia e horário estabelecido. A pessoa que solicitar o serviço sairá com sua notificação e a outra parte será notificada via carta — em casos de recusa, o reconhecimento será levado a discussão judicial para ser resolvido.


VEJA TAMBÉM:

 


Tags »
Notícias Relacionadas »
Comentários »
Diário de Uberlândia | jornal impresso e online Publicidade 1140x90