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28/06/2023 às 13h20min - Atualizada em 28/06/2023 às 13h20min

Injúria e ameaça estão entre os principais crimes cometidos contra pessoas LGBTQIAPN+, em Uberlândia

Levantamento revela que, entre 2016 e 2023, 119 denúncias foram registradas após ataques por homo ou transfobia no município

VINÍCIUS LEMOS | DIÁRIO DE UBERLÂNDIA
Mais de 100 tipos de crimes por conta da orientação sexual foram contabilizados na cidade, nos últimos sete anos | Foto: Agência Brasil

Injúria, ameaça e lesão corporal estão entre os principais crimes cometidos contra pessoas LGBTQIAPN+ em Uberlândia. De acordo com um levantamento da Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública de Minas Gerais (Sejusp/MG), de janeiro de 2016 a maio de 2023, 119 vítimas registraram denúncias após sofrerem violência por conta da orientação sexual. Neste 28 de junho, data que marca o Dia Internacional do Orgulho LGBTQIAPN+, o Diário mostra que o preconceito ainda é uma realidade para esta comunidade. 

Ainda de acordo com os dados, o número de vítimas está ligado a mais de 100 tipos de crimes cometidos no município. A maior parte deles é de injúria, com 28 casos. Depois vêm ameaça, com 17 registros, e lesão corporal, cometida 15 vezes desde 2016.

Para a coordenadora do projeto SOMOS, Camila Paiva, os registros computados pelas autoridades não refletem a realidade. A única certeza da advogada do grupo, que oferece defesa jurídica, educação e promoção social da população LGBTQIAP+ em Uberlândia, é que os registros são mais baixos do que o número real de ocorrências. Um dos motivos, segundo ela, é a desconfiança das vítimas, que muitas vezes não acreditam que uma denúncia de violência por causa da orientação sexual será credibilizada como deveria.
 

“Muitas pessoas LGBTQIAPN + não têm confiança na Polícia, no sentido de que alguma providência será tomada e que o seu agressor será responsabilizado. Muitos policiais não sabem preencher corretamente o registro de ocorrência no que diz respeito à orientação sexual e à identidade de gênero da vítima, assim como é comum se ver que os boletins foram registrados sem que fosse colocada a LGBTFobia seja como motivação ou como o crime em si”, defende.


O motivo disso, ainda segundo Camila Paiva, é que LGBTfobia faz parte da estrutura da sociedade. “Advinda do patriarcado, da dominação masculina, branca e heterocisnormativa. Dessa forma, tudo o que foge da forma em que se moldou esse modo de vida é visto com maus olhos, com menosprezo. Começa-se com a injúria, tida como uma piadinha, que, na verdade, desumaniza e legitima outros atos de violência, e escalona para ameaças e suas concretizações, como a lesão corporal e muitos casos de morte, principalmente de mulheres trans e travestis”, explica.

Em junho de 2019, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que, até que o Congresso Nacional edite uma lei específica, as condutas homofóbicas e transfóbicas se enquadram na tipificação da Lei do Racismo.

DENÚNCIA POR PRECONCEITO
No carnaval de 2023, a criadora e gestora de conteúdo Iusley da Mata foi vítima de transfobia e resolveu denunciar. Ela, que é uma mulher trans, conta que quando entrou em um bar no Centro de Uberlândia, ao passar pela revista, uma segurança se recusou a revistá-la inicialmente. 
 

“'Quem tem que te revistar é um homem', me disse a segurança. Eu respondi que não, que era uma mulher trans e que ela deveria olhar minha bolsa”. Mais tarde, ao sair e voltar ao mesmo estabelecimento, um segurança a abordou para uma nova revista. “Quando eu recusei e disse que teria de ser uma mulher a fazer a revista, ele me disse: 'E o que você tem no meio das pernas?'. Fiquei nervosa, porque aquele é um bar que se diz LGBT friendly (que busca manter ambiente confortável a pessoas LGBT)”, contou.

 

Vítima do preconceito, Iusley não apenas registrou o caso por meio de um boletim de ocorrência, como processou o bar por conta dos danos que sofreu naquele dia, que antecedia o aniversário dela.

SEM DENÚNCIA, MAS COM PRECONCEITO
Diferentemente da criadora de conteúdo, o servidor público Davi Camuri Sorna Santos nunca chegou a registrar um crime cometido contra ele por ser homossexual. O que não muda o fato de ele já ter passado por situações que justificariam a busca por punição aos agressores.
 

“Eu namoro há quatro anos e, certa vez, beijei meu namorado na rua e um homem bêbado gritou comigo, dizendo que não deveria fazer aquilo (beijar o namorado) na frente da esposa dele. Em outra vez, estava de mãos dadas com meu namorado na rua e um homem em um carro passou e gritou que deveria ir para casa”, disse.


Davi Santos cita que esses episódios são difíceis de provar, assim como as chamadas microviolências diárias que ele sofre por conta da orientação sexual. “A denúncia acaba acontecendo em casos mais graves. Existe a barreira de experiências ruins que não temos como apontar o motivo real: o preconceito”, explicou. 

NA FAMÍLIA
O ambiente familiar foi a principal fonte de agressão contra pessoas lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros em Uberlândia no ano de 2022. A informação consta em um levantamento divulgado pela Comunidade LGBTQIA+ de Uberlândia, realizado entre maio e julho do ano passado, que ouviu 916 pessoas da comunidade para o censo socioeconômico e demográfico da população LGBT da cidade.

Na sequência, aparecem as escolas e faculdades, seguidas por espaços públicos e do ambiente profissional. Outros itens citados pelas vítimas de agressão envolvem ainda o transporte público, bares e boates, via pública, carro de aplicativo, comércios e igrejas. Em 2020, a LGBTfobia acontecia em espaços públicos na maioria das vezes.

AJUDA
O projeto SOMOS oferece assessoria jurídica gratuita para membros da população LGBTQIAPN+ em situação de vulnerabilidade social, além de disseminar conhecimento para e sobre a comunidade dentro e fora dela. Também, promove eventos e publica mídias informativas nas redes sociais.

Mais informações podem ser obtidas pela equipe de apoio, por meio do telefone (34) 3291-6356 (ligação ou whatsapp) para cadastro e triagem da demanda. Se forem dúvidas simples, redes sociais e e-mail estão disponíveis: @projetosomos.ufu e [email protected]


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