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20/09/2022 às 10h30min - Atualizada em 20/09/2022 às 10h30min

Suspensão do piso da enfermagem afeta mais de 10 mil profissionais da área em Uberlândia

STF confirmou decisão na última semana; profissionais da cidade devem realizar nova manifestação nesta quarta (21)

IGOR MARTINS I DIÁRIO DE UBERLÂNDIA
Enfermeiros reivindicam piso proposto em lei, além de melhores condições de trabalho I FOTO: DIVULGAÇÃO
O Supremo Tribunal Federal (STF) confirmou, na última semana, a suspensão do piso salarial da enfermagem por sete votos a quatro. A decisão da Corte vai contra a adequação de rendimentos para a categoria, aprovada em julho no Congresso Nacional e sancionada pela Presidência da República em agosto. A determinação deve impactar, somente em Uberlândia, mais de 10 mil profissionais que atuam nas redes pública e privada.
 
O impasse teve início no início do mês, quando o ministro Luís Roberto Barroso suspendeu a aplicação do piso salarial da enfermagem em todo o país. Em reportagem noticiada pelo Diário, a Prefeitura de Uberlândia informou que
já havia se programado para iniciar os pagamentos, mas suspendeu a medida após a liminar do STF.
 
De acordo com a lei, os enfermeiros deveriam receber pelo menos R$ 4.750 por mês, enquanto técnicos de enfermagem devem ser pagos com no mínimo 70% do valor. O rendimento de auxiliares de enfermagem e parteiras foi estabelecido com pelo menos 50% do piso máximo.
 
Além de Barroso, votaram pela suspensão os ministros Ricardo Lewandowski, Alexandre de Moraes, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Luiz Fux. Já os ministros André Mendonça, Nunes Marques, Edson Fachin e Rosa Weber foram a favor da medida.
 
MANIFESTAÇÕES
A determinação adotada pelo STF gerou repercussão negativa da categoria em Uberlândia. Graduado em enfermagem pela UFU em 2011, o professor e profissional da área, Conrado Augusto, lamentou a decisão. Em entrevista ao Diário, Conrado afirmou que a categoria tem se mobilizado para cobrar as autoridades e garantir mais dignidade e condições de trabalho para enfermeiros de todo o país.
 
Na semana passada, o professor liderou um movimento em Uberlândia que contou com a presença de profissionais da área, reivindicando a aplicação do piso. Os manifestantes se reuniram na Praça Clarimundo Carneiro e marcharam até a Praça Tubal Vilela com faixas e cartazes.
 
“Essa movimentação não aconteceu só em Uberlândia, mas em todo o Brasil. Nós expomos tudo o que achamos, em uma tentativa de mostrar para o Supremo a importância do nosso trabalho. A gente espera e cobra que a Câmara e o Senado apontem as fontes que vão ajudar as empresas públicas e os órgãos a financiarem esse piso”, disse.
 
Augusto conta que a suspensão já era esperada pela classe e foi uma “ducha de água fria”, mas que a luta da categoria não deve parar por aí. Nesta quarta-feira (21), a cidade deve receber uma nova manifestação de profissionais de enfermagem para reivindicar melhorias nas condições de trabalho dos profissionais que, na visão dele, foram um dos que mais sofreram durante a pandemia.
 
“Essa luta ganhou muita força há dois anos, por causa da covid-19. A pandemia mostrou para o mundo os enfermeiros sem equipamentos de proteção. Só no Brasil tivemos quase mil enfermeiros e técnicos de enfermagem que morreram por causa do vírus. Somos um dos países que mais perdemos profissionais. Isso tudo chama muita atenção e é por isso que essa luta se tornou mais latente. É bom ver que muitas pessoas estão do nosso lado”, afirmou Conrado.
 
AMOR À PROFISSÃO
Quem também lamentou a suspensão do piso foi a enfermeira Evelise Pereira Motta, que atualmente trabalha na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) Neonatal de um hospital privado de Uberlândia.
 
Segundo ela, a decisão do STF afeta diretamente os profissionais da área que, na visão dela, foram um dos que mais batalharam durante a pandemia. “A gente se doa muito pela profissão. Eu fiquei muito triste quando soube da suspensão do piso. Tivemos um período muito estressante durante a pandemia, foi bem difícil para a gente. Muitas pessoas perderam colegas para o vírus, e no meu caso tive que separar crianças das mães que estavam contaminadas”, relatou.


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ESPECIALISTA EXPLICA
A implementação do piso salarial foi barrada no Supremo após questionamentos feitos pela Confederação Nacional de Saúde, Hospitais e Estabelecimentos e Serviços (CNSaúde) a respeito do impacto financeiro da legislação.
 
O cientista político e mestre em direito público, Alexandre Walmott Borges, explica que como a medida prevê a aplicação do piso salarial para profissionais das redes pública e particular, diversas empresas do ramo privado afirmaram que a determinação poderia causar um efeito nefasto nas instituições de saúde, contrariando as regras do mercado.
 
“Essas empresas basicamente afirmaram que o mercado é quem definiria quando os profissionais receberiam mais ou menos. Estes estabelecimentos trouxeram ligações de riscos de demissões, impactos financeiros na saúde dos hospitais. Neste momento, a decisão está pautada nesse efeito no setor privado”, detalhou Walmott.
 
Além de poder afetar o ramo particular, o professor da Universidade Federal de Uberlândia (UFU) explica que a decisão do STF também revela uma preocupação com a destinação de verbas no setor público. Como os gastos precisam ter previsão clara em lei, o Supremo Tribunal Federal informou que não foi possível identificar como o piso salarial da enfermagem seria custeado em um primeiro momento.
 
Outro ponto abordado pelo professor da UFU é com relação à autonomia dos Estados e Municípios, uma vez que a medida é válida para os governos federal, estadual e municipal. O assunto chegou a ser citado por Rosa Weber durante sua decisão, ao descartar o risco de lesão às unidades da federação.
 
"O diploma legislativo impugnado, editado pela União no exercício de sua competência constitucional, apenas institui o parâmetro remuneratório mínimo, cabendo a cada um dos demais entes da federação definir, no âmbito do próprio território, o quantum remuneratório a ser pago a seus respectivos servidores públicos", informou a ministra.
 
Para Weber, as argumentações dos impactos financeiros informados pela CNSaúde também foram avaliadas pelos parlamentares, durante a tramitação da matéria no Congresso Nacional.  "A avaliação de riscos e impactos negativos produzida unilateralmente pela entidade autora não pode prevalecer, ao menos em juízo delibatório, sobre as conclusões formuladas pelo Congresso Nacional com base em estudos e relatórios elaborados em conjunto com os representantes dos setores público e privado, inclusive com órgãos e entidades da sociedade civil organizada", afirmou.
 
Ainda de acordo com Alexandre Walmott Borges, o ideal é que o projeto de lei seja repensado e novamente discutido na Câmara dos Deputados. “Não há dúvidas de que a lei é mal redigida. Isso talvez devesse voltar para a casa política para ser melhor discutida, e não o Supremo ficar definindo”, relatou o jurista.
 
POSICIONAMENTO
O Diário entrou em contato com o Conselho Regional de Enfermagem de Minas Gerais (Coren/MG), que informou, através da presidente em exercício Maria do Socorro Pena, que não aceitará outra situação que não seja a vitória dos profissionais da categoria frente à aplicação do piso salarial.
 
De acordo com Maria, a enfermagem brasileira se coloca em posição de alerta após a decisão do Supremo. Em comunicado, ela confirmou a realização de atos pelo Estado na quarta-feira em forma de paralisação, “mostrando ao STF e ao Brasil que não aceitaremos retroceder diante da constitucionalidade do piso”.
 
“Nesse momento, também convocamos o Congresso e a União para se posicionar com relação às fontes de custeio do piso salarial, para que assim possamos levar justiça e dignidade até os contracheques dos profissionais de enfermagem”, disse.

O Diário de Uberlândia também procurou a Prefeitura para obter um posicionamento do Município diante da nova decisão do STF. Por meio de nota, o Executivo informou que, conforme já autorizado pelo prefeito Odelmo Leão, havia programado recursos para iniciar o pagamento do novo piso nacional de enfermagem aos profissionais que atuam na rede municipal de Saúde. Entretanto, em virtude da decisão judicial que suspendeu a lei de criação do piso, o Município não poderá efetivar a medida e terá de aguardar novas definições do Supremo Tribunal Federal (STF) para adotar providências.


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