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11/08/2019 às 10h07min - Atualizada em 11/08/2019 às 10h07min

Marcos Piangers conta como trabalha o desenvolvimento das filhas a partir de atividades lúdicas

Piangers falou ao Diário de Uberlândia os desafios da paternidade em plena era da tecnologia

SÍLVIO AZEVEDO
Para Marcos Piangers, crianças precisam desenvolver capacidades cognitivas antes de se envolverem com aparelhos eletrônicos | Foto: Lauro Maeda
O jornalista e escritor Marcos Piangers falou com o Diário de Uberlândia sobre formas de educar os filhos nessa era da tecnologia. Pai de duas meninas, Piangers explica como faz para trabalhar o desenvolvimento das filhas através de atividades lúdicas e educativas. Aparelhos tecnológicos fazem parte do dia a dia da família, mas sem abusos e somente com conteúdo pedagógico e que acrescenta na formação psicossocial das meninas. Confira a entrevista na íntegra abaixo. 
 
Diário - Como você enxerga a figura do pai no desenvolvimento de uma criança?
Marcos Piangers - Do ponto de vista cientifico, o pai tem uma importância fundamental. Enquanto a mãe tem uma ligação fisiológica, alimentação, colo, o pai tem a representação da figura que vai mostrar para a criança que ela não está colada com a mãe, uma coisa só com a mãe. O pai é a primeira figura de confronto, de apresentação do mundo para o filho. E esse filho vai explorar o mundo, entender como as coisas funcionam e vai descobrir na figura do pai esse companheiro que vai ajudá-lo a entender como o mundo funciona. É claro que o pai pode maternar, ser muito carinhoso, afetuoso, dar colo, beijo, carinho e a mãe pode paternar, como minha mãe me paternou, foi meu pai me empurrando para o mundo, me oferecendo limites e ao mesmo tempo empurrando para que eu explorasse meus limites em potencial. Então a figura do pai, no mais especificamente o paternar, no ponto de vista na criação do filho é importante, fundamental. Além disso, ser pai é uma missão, um compromisso. Eu não tive pai. Minha mãe foi abandonada pelo meu pai biológico, mas é importante lembrar que uma pessoa que abandona seus filhos é uma pessoa que não pode reclamar do estado das coisas, de como está a sociedade. A gente tem no Brasil [a situação de que] 42% dos partos dos SUS são de mães solteiras. Temos algumas cidades, como Manaus, em que 70% dos partos são de mães solteiras. Então a gente começa a ver os resultados e fica assustado com o impacto que isso vai causar. Porque o que acontece, no momento que um menino não tem um pai, ele perde o referencial do que é ser homem, não recebe valores de fato, desse lado da família. Certamente, ou muito provavelmente, essa criança vai crescer revoltada, ou buscando o pai, ou revoltada com figuras de autoridade, né? Então, como ele não teve aquele primeiro encontro de confronto com o pai dentro de casa, ele vai confrontar um professor, um policial e pode ocorrer de seguir por caminhos que não são positivos. Claro que uma mãe pode segurar uma barra toda sozinha, mas acho que é injusto a gente esperar que a mãe consiga suprir todas as necessidades educacionais, saúde, educação e valores, além das econômicas. Então, é muito importante o pai entender como um responsável pela sociedade como um todo. O pai entender que o que ele está vivendo agora é uma missão, um compromisso por um mundo melhor, uma sociedade melhor, mais honesta, mais gentil e mais humana através da participação dele na passagem de valores para o filho.
 
Como deve ser a adaptação da educação com a modernidade, tendo em vista que muitas vezes a tecnologia acaba afastando essa relação pai/filho?
A Sociedade Brasileira de Pediatria não recomenda nenhum tipo de tela para crianças menores de dois anos, nem televisão, nem tablets e nem smartfones. Infelizmente a gente vê famílias no mundo todo colocando crianças expostas a telas muito cedo, com dias, meses de idade. Antes de interagir com um tablet, a criança tem que desenvolver algumas capacidades, habilidades, como empatia, olho no olho, paciência, capacidade de conexão, ler emoções no rosto da mãe e do pai, das pessoas que a rodeiam. Com a exposição a uma tela, a criança não desenvolve características importantes e ela pode desenvolver uma impaciência, irritabilidade, dificuldade do sono, obesidade e um problema grave que é levar as crianças para um ambiente de dificuldade de aprendizado e deficiência cognitiva. Então se você quer cuidar do seu filho mesmo, seja uma pessoa completa, deve desenvolver nele, primeiro, as características humanas para depois passar para a tecnologia. Depois dos dois anos vale a pena brincar um pouquinho com o celular, joguinhos educativos, tablets, televisão, com desenhos educativos e coisas que sejam mais calmos para não atrapalhar no sono. Nos tablets e celular, joguinhos educativos onde ele pode aprender letrinhas, cores, som dos animais. Minha filha mais nova, por exemplo, tem o seu aplicativo favorito no meu celular que é duo língua, onde ela aprende a falar inglês. Esses dias estava curioso por outros idiomas e nós dois estudávamos juntos o italiano. Então existem aplicativos positivos para seus filhos, mas existem outros, redes sociais, joguinhos, aplicativos que farão mal. Algumas pesquisas estão mostrando também que os adolescentes estão sofrendo muito com a exposição nas redes sociais. Eles se comparam muito com a vida dos outros, por isso hoje temos a geração mais deprimida, solitária e mais suicida da história da humanidade. É muito importante que a gente cuide dessas crianças com atenção e não terceirize esse cuidado para os tablets e celulares.

 
 
Como adaptou a realidade após se tornar pai?
Fui ajeitando minha vida. Por muito tempo trabalhei demais. Uma vez minha mulher puxou minha orelha. Minha própria filha puxou minha orelha “você está trabalhando demais. A gente quer você mais em casa”. Ouvir essas demandas da família foi decisivo para que eu hoje pudesse me organizar e ter uma vida muito mais equilibrada, com muito menos consumo e, consequentemente ganhar menos dinheiro, pois nosso consumo diminuiu. Dessa forma eu consigo equilibrar contas e quantidade de tempo perto delas, levá-las para a escola, aproveitar finais de semana e estar sempre por perto.
Se quer uma dica para organizar seu tempo, que eu digo sempre é o seguinte: em primeiro lugar é apagar do seu celular todos os aplicativos que tiram seu tempo, como joguinhos e redes sociais. Segundo é avisar no escritório que você tem uma coisa maravilhosa para cuidar. Uma vida de tesouro. Então, lá no seu trabalho vai dizer “oh, eu tenho que sair às 18h porque eu vou pegar meu filho na creche e tenho compromissos com ele. Se alguém marcou uma reunião e não aparecer não é só o meu tempo que está sendo desrespeitado, é o tempo do meu filho. Se alguém marca uma reunião e ela demora demais e não chega a lugar nenhum, de novo, não é o meu tempo que está sendo desperdiçado, é o do meu filho”. Então é importante você priorizar, ser mais assertivo, mais focado, para ser produtivo no trabalho e não perder tempo.
 
Então você tem história interessante com suas filhas.
Várias. Uma das que mais gostei foi que a Aurora esses dias, a gente estava na rua e veio uma mãe solteira, me abraçou e disse: “poxa, cara, você é um consolo para mim. Sei que através dos seus livros e vídeos que meu filho pode ser uma boa pessoa apesar de tudo, apesar da situação que a gente tá vivendo”. A Aurora ficou olhando aquilo e depois ela veio me dizer que o sonho dela um dia é poder inspirar outras pessoas, outras famílias também a serem melhores. O sonho dela é fazer o trabalho que eu faço. Aí falei para ela: “Aurora você não percebeu que está fazendo esse trabalho? Porque eu nunca escreveria um livro sobre ser pai se você não tivesse chegado. Se você e a Anita não tivessem aparecido na minha vida”. Ela ficou me olhando com os olhinhos brilhando de perceber que ela também faz parte dessa transformação, dessa busca por um mundo mais igual e por uma aproximação de pais e filhos. E uma inspiração, que acho que é o meu trabalho, inspirar o melhor pai que existe dentro das pessoas.
 
Como moldou o estilo de educação que dá às suas filhas?
Com muita leitura, bibliografias com muita pesquisa cientifica eu fui percebendo que é necessário um controle de tecnologia. Lá em casa a gente não tem tablet, a pequena não tem celular, a mais velha tem tempo limitado no celular. A gente interage muito mais entre a gente, fazendo nossos próprios jogos de tabuleiro com papel e caneta, ou então brincando de dominó, quebra-cabeça, ou brincadeiras mais físicas, brincando na cama, ou então nossos labirintos de fita crepe, onde a gente joga de um lado para o outro no corredor e tem que passar para o outro lado rastejando, elas adoram. A gente cria nossas brincadeiras, patina com meias de lã na sala. Então essa é uma educação que vai nos unindo, nos despertando a aproximação, afeto e capacidade de conversa. Nas nossas refeições não pode ficar vendo televisão nem celular, nem porque não pode, acabou se tornando natural a gente comer sempre conversando e no final da refeição, quando tem sobremesa, a gente brinca que para poder pegar a sobremesa tem que contar uma história. Pode ser história nova, antiga, às vezes a gente inventa um tema. Tem jogos muito interessantes que pode fazer com que cada casa do tabuleiro você tem que falar de um sentimento que você teve, ou elogiar o irmão ou a pessoa que está do seu lado, porque esse tipo de jogo vai fazendo uma espécie de terapia de família. Além disso, tem a educação formal, a escola. A gente optou por uma escola bem divertida para criança pequena. Minha mais nova, a Aurora de 7 anos, estuda numa escola que é muito solta, tem muita brincadeira, tem meditação, tem capoeira, tem circo, tem teatro. Ela adora isso. A mais velha está no 9º ano e foi para uma escola bilíngue e que tem todas as matérias misturadas. Então ela escolhe as trilhas de aprendizado com base naquilo que ela mais gosta. Nesse trimestre está estudando numa trilha sobre música, se chama Spotify. Aprende sobre física, ondas sonoras, um pouco de biologia, como funcionam essas ondas sonoras batendo no seu ouvido e tudo mais, mas no fim das contas tudo tem uma relação com música.
 
O que dizer para os pais que têm dificuldade para educar os filhos?
Todo mundo tem dificuldade para educar os folhos. Ninguém considera fácil. É difícil para todo mundo. Mas é importante que a gente entenda isso como uma responsabilidade, uma missão. Algo que a gente faz para transformar o mundo em um lugar realmente melhor, que de fato a gente inspire uma nova geração. Amar é dar afeto, carinho e limites. Os limites são muito importantes numa época em que os pais só dizem sim. Dão presentes em todas épocas do ano, presentes caros muitas vezes, e aceitam crianças mimadas que muitas vezes são pequenos ditadores. Se você ama seu filho de verdade você deve enchê-lo de afeto e de limites, porque o afeto é o respeito que você tem por ele, e o limite é o respeito que você tem pelos outros, e as duas coisas são importantes para ensinar para uma criança.

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