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11/06/2019 às 14h17min - Atualizada em 11/06/2019 às 14h17min

Núcleo de amparo a vítimas de estupro já fez 163 atendimentos em Uberlândia

Diário de Uberlândia esclarece quando o procedimento é permitido por lei; em abril adolescente abusada sexualmente teve autorização judicial para abortar

MARIELY DALMÔNICA
O debate sobre a legalização e a criminalização do aborto está mais presente do que nunca. O assunto, que também vem sendo abordado periodicamente no âmbito judiciário e no legislativo, além de gerar uma ampla discussão, também é acompanhado de dúvidas, principalmente quando se refere à realização do procedimento em casos previstos por lei. Em Uberlândia, um núcleo de apoio a vítimas de violência sexual já realizou mais de 100 procedimentos.

Em abril deste ano, o Judiciário autorizou que uma criança de 11 anos, abusada sexualmente pelo padrasto, abortasse o feto com 18 semanas de gravidez. O procedimento foi realizado no Hospital de Clínicas da Universidade Federal de Uberlândia (HC-UFU) e a vítima corria risco de perder a vida. Por causa de circunstâncias assim, o Diário de Uberlândia buscou esclarecer quando o procedimento é permitido realizar o aborto legal.

Em casos de anencefalia, a gestação pode ser interrompida a qualquer momento, porque o sistema nervoso central não é formado para que o feto tenha consciência e sensações. Já quando ocorre estupro e há risco à vida da gestante, o aborto legal pode ser realizado até 20 semanas de gestação, podendo ser estendido para 22.

Delegada Ana Cristina alerta sobre aviso falso de estupro | Foto: Mariely Dalmônica


Ou seja, por volta dos cinco meses de gravidez, quando o feto tem cerca de 500 gramas. Desde 2015, a lei que permite aborto em casos de estupro foi regulamentada e não exige a apresentação de Boletim de Ocorrência para a realização do procedimento médico.

Quando a gestação é resultante de violência sexual, a mulher pode ser encaminhada ou procurar diretamente o Hospital de Clínicas de Uberlândia, que é o centro de referência para a realização do procedimento. “A vítima tem que ter uma certa responsabilidade e não denunciar um estupro falso”, afirmou a delegada Ana Cristina Marques Bernardes, da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher.

NUAVIDAS
Desde o ano passado, o HC tem um centro de apoio que presta atendimento multiprofissional a pessoas vítimas de violência sexual. O Núcleo de Atenção Integral à Vítimas de Agressão Sexual (Nuavidas) é formado por ginecologista, pediatra, psiquiatra, psicólogas, assistente social, enfermeira e advogadas.

Segundo Helena Borges Martins da Silva Paro, ginecologista e coordenadora-geral do Nuavidas, os primeiros atendimentos foram se concretizando antes mesmo do nascimento do núcleo, em março de 2017. Hoje, o atendimento acontece dentro do hospital nas sextas-feiras pela manhã.

De acordo com dados do Nuavidas, de janeiro a dezembro do ano passado, 163 pessoas foram atendidas pelo núcleo, entre elas crianças, adolescentes e mulheres vítimas de violência sexual. Segundo números divulgados pelo governo de Minas Gerais, apenas 64 estupros consumados foram relatados em 2018 em Uberlândia. Ou seja, nem todos os casos de violência sexual são denunciados e registrados em boletim.

“Não é obrigatório que a mulher leve um acompanhante, e muitas não contam para ninguém da violência que sofreram. Mas a gente pede que tenha alguém, porque é um momento de muita sensibilidade”, afirmou a ginecologista.

Segundo a médica, não é necessária uma autorização judicial para a realização do aborto, apenas em casos de menores de 18 anos em que há divergência entre os pais e a vítima de estupro. “A mulher faz um relato do que aconteceu e assina um termo de compromisso. Existe um laudo médico que atesta a compatibilidade do tempo de gravidez com a data da violência”, disse Paro.

Núcleo
é formado por equipe multidisciplinar de médicos, assistente social e advogadas | Foto: Nuavidas/Divulgação

O procedimento pode ser realizado de duas formas sendo o aborto medicamentoso e o cirúrgico, que só é feito nos primeiros três meses de gravidez. “A recuperação é imediata, é um procedimento muito simples e muito seguro. Mas se ela [a mulher] sentir a necessidade de repousar, é recomendado.”

Mesmo com as mudanças na lei, alguns médicos podem se recusar a realizar o abortamento. De acordo com a ginecologista, isso se chama objeção de consciência e é um direito que os profissionais de saúde têm conforme o código de ética que rege a profissão.

O médico pode se recusar por conta de valores morais e religiosos, por exemplo. “Essa objeção tem limitações dentro dos próprios códigos de ética, ela pode acontecer desde que isso não traga prejuízos para saúde física e emocional da mulher”, explicou a coordenadora.

Quando um médico recusa, o hospital deve conseguir outro profissional para realizar o procedimento imediatamente. “Existe esse direito, mas é um direito muito limitado. Eu acredito que existe muita objeção de consciência que é um medo por conta da criminalização do aborto no Brasil”, finalizou a médica.
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