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21/03/2019 às 09h30min - Atualizada em 21/03/2019 às 09h30min

​Operários nordestinos foram submetidos a condições análogas à de escravo em Uberlândia, diz MPT

Com dificuldades, eles contaram que acordam tarde por não ter dinheiro para comprar a refeição da manhã; empresa se manifestou sobre o assunto

IGOR MARTINS
Trabalhadores prestaram depoimentos ao procurador na sede do Ministério Público do Trabalho | Foto: Igor Martins
Uma vistoria feita por auditores fiscais do trabalho concluiu que os operários nordestinos contratados no início deste ano para atuarem nas obras de construção do sistema de captação de água Capim Branco, em Uberlândia, foram vítimas de aliciamento. A conclusão foi dita pelo procurador do Trabalho Paulo Veloso que informou, ainda, que o grupo foi submetido a condições análogas à de escravo.

A reportagem do Diário de Uberlândia conversou com três dos trabalhadores que preferiram não ter os nomes divulgados. Após a terceira audiência sobre o assunto realizada nesta quarta-feira (20), na sede do Ministério Público do Trabalho (MPT), eles relataram as dificuldades desde que chegaram a Uberlândia com a promessa de emprego.

Dois deles vieram de São Francisco, no Sergipe, e o terceiro é natural de Paulo Afonso (BA), tendo percorrido quase 2.000 quilômetros em ônibus interestadual clandestino. Os nordestinos chegaram ao Triângulo Mineiro em janeiro. Desde então, afirmaram que têm vivido em péssimas condições em uma casa alugada no bairro Morumbi.

“Estamos aqui há mais de dois meses e até hoje não resolveram nada. Estamos passando por muitas dificuldades, dormindo no chão, sem dinheiro pra comer e nem voltar pra casa”, disse um dos operários.

O sergipano contou ainda que precisou ir a pé do bairro Morumbi até o Ministério Público, no bairro Brasil, porque sequer tem dinheiro para pagar a tarifa do transporte urbano. As vítimas pagaram ainda a passagem para Minas Gerais e estão arcando com aluguel e comida desde então.

Eles relataram também que precisam dormir tarde da noite para acordar próximo ao horário do almoço no dia seguinte. Dessa maneira, eles pulam a primeira refeição do dia para não gastar dinheiro com o café da manhã.

A cada dia, a espera pelo trabalho prometido se torna ainda mais angustiante para aqueles que deixaram as famílias em casa e continuam na incerteza do futuro. “Chegamos em janeiro falando que já estava fechado [a contratação] e até agora nada. E também nem dispensaram a gente, sempre falando que ia fechar e nunca fecha”, completou outro trabalhador.

“Está a maior tristeza. Não dá [empresa] apoio de nada, não dá marmitex pra nós que estamos passando necessidades. Deixamos a família lá preocupada, precisando de dinheiro e estão mandando dinheiro pra gente mesmo sem poder, ao invés da gente mandar”, reiterou o colega.  

MPT concluiu que operários foram vítimas de aliciamento
Segundo o Ministério Público, as denúncias envolvem cerca de 30 trabalhadores que vieram de estados da região Nordeste para trabalharem nas obras do Departamento Municipal de Água e Esgoto de Uberlândia (Dmae) e que ainda não foram contratados.   

O primeiro grupo que chegou a Uberlândia chegou a ser empregado, porém os demais já estão sem trabalho há pelo menos um mês. As investigações da Procuradoria do Trabalho concluíram que os operários foram, de fato, vítimas de aliciamento para trabalho. “[Os trabalhadores] estão em situação degradante, de modo que foram enquadrados em condições de trabalho análogas à de escravo”, acrescentou.

Ainda de acordo com o procurador, a empresa propôs o pagamento de ajuda de custo sem assumir o vínculo empregatício, que não foi aceito pelo órgão. Serão tomadas as devidas providências e a fiscalização do MPT em relação à condição dos trabalhadores continuará.

O OUTRO LADO

Em nota enviada à imprensa, a assessoria jurídica do consórcio BT Convap Completa, constituído para executar as obras do sistema Capim Branco, informou que desde outubro de 2015 o grupo tem executado a referida obra “em completa observância à legislação pátria”, e que foi surpreendido com a intimação para participar de audiência referente ao inquérito que apura possível aliciamento de trabalhadores.

Ao comparecer à audiência, disse desconhecer os fatos e o objeto da investigação, “refutando por completo qualquer responsabilidade quanto aos mesmos”. A nota informa ainda que os trabalhadores citados na investigação “não são empregados do consórcio e que sequer participaram do processo seletivo a que todos os colaboradores devem ser submetidos.”

O consórcio reforça ainda que “cumpre rigorosamente a legislação trabalhista”, que não tolera qualquer prática que, “direta ou indiretamente, configure desrespeito aos direitos ou às condições de trabalho de seus colaboradores” e que está à disposição das autoridades para qualquer esclarecimento.

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