Fernando Pimentel durante evento realizado ontem, em Pirajuba | Foto: Gil Leonardo/Imprensa MG A falta de dinheiro para investir em saúde, educação, segurança e grandes obras tem levado o governador Fernando Pimentel (PT) a usar boa parte de sua agenda pública em cerimônias de entrega de viaturas, ambulâncias e ônibus escolares. O governador é esperado em dois eventos que serão realizados hoje (15) em Uberlândia. A primeira solenidade, agendada para as 9h, marca o início das ações de eletrificação da ocupação do Glória, enquanto a segunda, às 11h, corresponde à entrega de uma usina fotovoltaica.
Em dez dias do mês de fevereiro do ano passado, o governador chegou a visitar Uberaba, Uberlândia, Patrocínio, Pouso Alegre, Lavras, Divinópolis e Sete Lagoas, em um total de oito solenidades de entregas de chaves, incluindo uma na capital mineira.
Em 2017, Pimentel participou de 23 eventos do tipo, com a entrega de 2.026 viaturas para as Polícias Civil e Militar.
"Como o governo não paga o básico, fica entregando viatura", diz Julvan Lacerda, presidente da Associação Mineira de Municípios (AMM).
Em meio à situação delicada, o governador optou por pequenos gestos, rebate o líder do governo na Assembleia Legislativa, deputado estadual Durval Ângelo (PT).
A política de "entregar para governar" é velha conhecida de estados em crise. Diante de um espaço de manobra bastante limitado, ela serve para mostrar alguma reação e aproximar o chefe do Executivo de prefeitos insatisfeitos com a falta de recursos.
No caso de Minas, o estratagema tem sido crucial para a sobrevivência de uma gestão que busca a reeleição.
O estado exibe uma situação fiscal das mais desafiadoras do país, e o próprio governo reconhece isso. As discordâncias repousam apenas sobre as causas do problema. "A crise é real. A calamidade financeira, reconhecida pela Assembleia, também é. Ignorar os fatos não vai melhorar o cenário, o trabalho é que tem potencial de alterar a realidade", diz o governo, em nota.
QUEDA DO PIB O dissabor dos prefeitos e da população em geral pode ser traduzido em números.
Em 2017, os investimentos do governo mineiro caíram R$ 2,5 bilhões ante 2014. A queda foi de 35% ao ano, o quinto pior desempenho entre as 27 unidades da Federação, segundo a Instituição Fiscal Independente (IFI), do Senado.
Minas enfrenta três anos consecutivos de queda do PIB. Em 2017, enquanto o país cresceu 1%, a economia do estado ainda teve leve queda de 0,2%, segundo o Itaú Unibanco.
O estado também vem perdendo símbolos. A empresa de energia Cemig foi obrigada a vender quatro usinas, e a Fiat, um orgulho local, escolheu Pernambuco para abrir uma fábrica de modelos de Jeep (a marca é hoje parte do grupo italiano).
Grandes obras empacaram. A duplicação da BR-381, chamada rodovia da morte, que depende de articulação política com o governo federal, está parada. Fora o caso emblemático da mineradora Samarco, que deixou um rastro de destruição e desamparo.
Sem recursos, o governo está às voltas com o parcelamento de salários dos servidores de áreas como saúde, segurança e educação.
Afetada pelos atrasos, a enfermeira Cíntia Ribeiro calcula ter uma dívida de R$ 7.000. "Carro, casa, tudo que é meu financiado daqui a pouco vai estar confiscado."
Os atrasos vêm desde 2016 e, com o tempo, a primeira parcela dos salários ficou cada vez mais distante do quinto dia útil. Neste mês, ela havia sido anunciada para o dia 16 -após o Dia das Mães, o que deixou muita gente bastante frustrada-, mas pode atrasar ainda mais.
Os serviços também são afetados pela crise. No hospital do IPSEMG, que atende somente servidores, faltam medicamentos e funcionários enquanto pacientes esperam dias por leitos de internação.
"Aumentou a nossa demanda porque antes havia convênio com outros hospitais e agora eles não aceitam mais porque o governo não paga", diz o técnico de enfermagem Sérgio Rocha.
IMPEACHMENT O parcelamento e o atraso de salários de servidores são argumentos de um pedido de impeachment apresentado contra Pimentel e aceito pela Assembleia em 26 de abril. O pedido inclui ainda atraso nos repasses à Assembleia, ao Judiciário e às prefeituras.
Diante da ameaça, embora a tramitação do impeachment esteja parada e seja motivada pelo desgaste da aliança com o MDB, o governo fez um pagamento à Assembleia.
Também na semana passada, repassou R$ 713,2 milhões de IPVA aos municípios, mas a AMM ainda afirma que há uma dívida de R$ 5,2 bilhões em atrasos de repasses.
O governo de Minas diz que a situação de calamidade financeira, agravada pelo déficit de R$ 8 bilhões deixado pelos governos anteriores, explica a grave situação das contas. Os tucanos Aécio Neves e Antonio Anastasia governaram o estado entre 2003 e 2014.
Bernardo Campolina, professor de ciências econômicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), diz que é possível questionar a gestão de Pimentel, mas que não dá debitar todos os problemas na conta do governo atual.
Campolina tem a avaliação de que, no período de bonança, foram feitas opções equivocadas, como a construção da Cidade Administrativa. Com projeto de Oscar Niemeyer, a sede do governo do estado inaugurada por Aécio em 2010 custou R$ 1,3 bilhão -ou o equivalente a 35% do que os municípios mineiros alegam que o estado deve em repasses na área de saúde.