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08/03/2023 às 08h00min - Atualizada em 08/03/2023 às 08h00min

O patrão doméstico é obrigado a ter cartão de ponto?

ALEXANDRE VALADÃO
O trabalhador doméstico sempre foi tratado à margem pela legislação brasileira. Quando a Consolidação das Lei dos Trabalho (CLT) foi promulgada em 1º de maio de 1943, o seu art. 7º, alínea “a”, já previa: “os preceitos constantes da presente Consolidação salvo quando fôr em cada caso, expressamente determinado em contrário, não se aplicam [...] aos empregados domésticos, assim considerados, de um modo geral, os que prestam serviços de natureza não-econômica à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas.”

Ou seja, a grande vitória dos trabalhadores, ao conseguirem uma lei regulamentando o trabalho e definindo vários direitos que antes não tinham, exclui o empregado doméstico.

Mas por quê?

Alguns estudiosos afirmam que o trabalho doméstico derivou do trabalho escravo de outrora, já que, em linhas gerais, a forma da prestação dos serviços é muito parecida, pois o empregado cuida da casa, da alimentação, dos cuidados com os filhos dos patrões (YOSHIKAI, Livia Midori Okino. Análise psicossocial da trabalhadora doméstica através das representações sociais do trabalho. 2009. Dissertação (Mestrado em Psicologia) – Instituto de Psicologia – USP).

Outros estudiosos afirmam que ele é um empregado que presta serviços para outro empregado, já que o patrão do doméstico tem que trabalhar para outro patrão para ter o dinheiro necessário para pagar o salário do doméstico, enquanto este cuida da sua casa. Como o patrão do doméstico não visa lucro direto, ele teria menos obrigações do que o patrão que é dono de uma empresa, por exemplo.

Em 11/12/1972, entrou em vigor a Lei nº 5.859 prevendo alguns direitos para os domésticos, mas ainda assim deixando preceitos básicos de fora, como horas extras, FGTS, etc.

Em 05/10/1988, a Constituição Federal (CF) dedicou um artigo inteiro para definir os direitos dos trabalhadores urbanos e rurais (art. 7º), mas novamente excluiu o doméstico de algumas benesses, pois no parágrafo único desse artigo havia a menção expressa de quais direitos poderiam ser aplicados a essa categoria, e não eram muitos.

A Emenda Constitucional (EC) nº 72, em 02/04/2013, alterou o parágrafo único do art. 7º da CF para estender aos domésticos praticamente todos os direitos dos trabalhadores que não são domésticos, dentre eles o controle de jornada, o que garante o recebimento de horas extras, sobreaviso, adicional noturno, intervalos intra e interjornada, etc.

Para regulamentar esse acréscimo de direitos, em 01/06/2015 foi promulgada a Lei Complementar (LC) nº 150, regulamentando os direitos acrescidos aos trabalhadores domésticos pela EC nº 72.

No art. 12 dessa LC há a previsão expressa de que é “obrigatório o registro do horário de trabalho do empregado doméstico por qualquer meio manual, mecânico ou eletrônico, desde que idôneo.”

Assim, o patrão doméstico deve manter um cartão de ponto para o empregado anotar o horário de entrada e saída, e o horário de intervalo também, se possível. Não precisa ser nada sofisticado como vemos nas empresas, como ponto biométrico ou mecânico, mas pelo menos uma folha de papel em que o empregado possa registrar o início e término da jornada.

Porém, alguns Tribunais, dentre eles o Tribunal Superior do Trabalho (TST), têm entendido que sobre esse assunto a CLT já possui previsão expressa no art. 74, § 2º, em que obriga que, “para os estabelecimentos com mais de 20 (vinte) trabalhadores será obrigatória a anotação da hora de entrada e de saída, em registro manual, mecânico ou eletrônico, [...] permitida a pré-assinalação do período de repouso.”

Assim, o empregador doméstico não seria obrigado a manter cartão de ponto em sua residência, já que não possui mais que vinte empregados.

Atualmente existem julgados para os dois lados e devemos esperar uma definição dos Tribunais sobre o tema. Por enquanto, por via das dúvidas, é prudente que o patrão entregue uma folha para o empregado doméstico anotar, todos os dias, os horários de entrada e saída do trabalho.

Justiça!



*Este conteúdo é de responsabilidade do autor e não representa, necessariamente, a opinião do Diário de Uberlândia.
 
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