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01/03/2023 às 08h00min - Atualizada em 01/03/2023 às 08h00min

Então um devedor pode ficar proibido de dirigir?

ALEXANDRE VALADÃO
Imagine que você emprestou vinte mil reais para um amigo, para um investimento que ele te convenceu que era muito rentável, e depois de algum tempo essa mágica não acontece, e quando você foi cobrá-lo a te devolver a quantia investida ele não tem mais o dinheiro.

O desespero bate.

Afinal, são vinte mil reais!

Você ameaça seu amigo (agora, ex-amigo). Diz que “vai pra Justiça”, vai procurar um advogado, vai na polícia, vai na imprensa, vai onde puder ir, mas nada faz com que seu amigo devolva seu dinheiro.

Então o que lhe resta mesmo é procurar o caminho que pode ser o mais demorado, mas que é o único legitimamente constituído a obrigar alguém a fazer algo na nossa sociedade: o Poder Judiciário.

Você procura um advogado, entrega a ele o documento que comprova o empréstimo, bem como todas as provas que você cobrou e o devedor simplesmente alegou que não tem com o quê pagar. O famoso “devo, não nego; pago quando puder.”

O advogado elabora o documento e ingressa com a ação judicial, pedindo ao juiz que intime o devedor a pagar, provar que pagou ou apresentar meios hábeis para o pagamento.

O devedor é intimado, deixa vencer o prazo concedido pelo juiz e não faz nada. Então é determinada a penhora de bens do devedor, mas, pesquisando contas bancárias, veículos, imóveis, realmente o caloteiro não tem nada.

O advogado requer ao juiz que o nome e CPF do devedor sejam inscritos nos cadastros de inadimplentes, como Serviço de Proteção ao Crédito (SPC) e Serasa Experian, além de protesto em cartório, o que é permitido e realizado. Mas, ainda assim, o endividado permanece inerte.

O advogado te liga e te dá essa infeliz notícia: ele não pagou e não tem bem nenhum pra ser penhorado.

E agora, o que fazer?

A legislação brasileira, cada vez mais, tem tentado apertar o cerco contra o devedor, buscando dar mais efetividade para os processos judiciais que buscam o recebimento de dívidas, mas sem tirar a dignidade do endividado.

Aqui é que reside a discussão: até onde você pode ir para cobrar sua dívida sem se exceder e ser responsabilizado por desrespeitar os direitos básicos do devedor?

Posso ir no trabalho dele fazer um escândalo? Posso contar pra todo mundo que ele é caloteiro? Posso ameaçar, perseguir, incomodar a família? Posso limitar direitos dele?

A solução do momento é a suspensão do direito do devedor de dirigir e de se locomover para fora do país.

O Supremo Tribunal Federal (STF), em julgamento de um caso concreto no último dia 09/02/2023, autorizou a apreensão da CNH do devedor, declarando constitucional o art. 139, inciso IV, do Código de Processo Civil (CPC), que prevê: “O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe: [...] determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária.”

A suspensão da CNH e do passaporte do devedor, portanto, são medidas que foram declaradas como legítimas e constitucionais pelo Tribunal hierarquicamente mais superior do nosso Poder Judiciário.

Essa medida tem o objetivo de pressionar quem está com o nome sujo na praça a quitar a dívida, além de, em muitos casos, evitar que o devedor continue gastando deliberadamente.

Para isso, somente em casos específicos essa medida poderá ser adotada, como devedor que realmente não tem meios para pagar a dívida, e nem se mostra disposto a isso, não utiliza a CNH para fins profissionais, como o motorista de aplicativo, por exemplo, sobretudo quando o credor observa que o devedor leva um estilo de vida inadequado para quem tem pendências financeiras. Ademais, tudo depende da análise do Magistrado.

Enfim, preocupado que pode ter sua CNH suspensa por ter dívida? Sim, essa hipótese existe, mas não em qualquer caso. O melhor é sempre tentar cumprir as obrigações a tempo e modo, e procurar um advogado em caso de dúvida.

Justiça!


*Este conteúdo é de responsabilidade do autor e não representa, necessariamente, a opinião do Diário de Uberlândia.
 
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