Diário de Uberlândia | jornal impresso e online Publicidade 1140x90
15/10/2022 às 14h00min - Atualizada em 15/10/2022 às 14h00min

Dia do Professor: educadores de Uberlândia relatam experiências, avanços, dificuldades e desvalorização da carreira

Em reportagem especial, Diário conversou com docentes sobre a profissão que desempenha papel fundamental na vida dos cidadãos

IGOR MARTINS | DIÁRIO DE UBERLÂNDIA
Fátima Dezopa, de 59 anos, atua como professora desde 1987 | Foto: Arquivo Pessoal

Comemorado neste sábado (15), o Dia do Professor é uma homenagem à importância dos professores na vida de todos os cidadãos, afinal, antes de existir um médico ou um advogado, houve o papel fundamental do educador dentro da sala de aula. O Diário conversou com profissionais da educação que atuam em Uberlândia, que falaram das experiências, dificuldades, desvalorização e, principalmente, sobre a paixão pelo ato de ensinar. 

A professora de biologia Fátima Dezopa trabalha na área desde 1987. A educadora relata que a vontade de ensinar existe desde que ela era pequena, quando brincava de escolinha com os irmãos e colegas na cidade de Capinópolis (MG). Hoje, aos 59 anos de idade e com muita história para contar, parece que nada mudou.

“Desde pequena a gente tinha aquela história de brincar de escolinha. Teve uma época que eu até pensei em fazer outra coisa, prestei vestibular para o curso de medicina, mas não consegui passar. Sempre fui boa em biologia, e quando comecei a dar aula, percebi que era isso mesmo o que eu queria”, disse.

Atualmente, Fátima atua na Escola Estadual Messias Pedreiro, no bairro Cazeca, mas a mineira já trabalhou até mesmo como professora de matemática no início da carreira. Segundo ela, atuar na área de educação é viver uma vida de altos e baixos. De qualquer forma, Dezopa acredita que muitas mudanças vieram para melhorar a condição dos profissionais do mercado. 

“Ser professor melhorou muito do ponto de vista da dinâmica das escolas. Antes, éramos muito conteudistas, com perfil prioritariamente avaliativo, a formação era medida por uma avaliação escrita e pronto. Hoje, nós temos outras propostas metodológicas como a aferição dessa aprendizagem, é um leque bem mais amplo. Hoje temos um ensino mais diversificado, com mais abordagens de conteúdos”, detalhou.

AVANÇOS
A docente Clarice Carolina Ortiz de Camargo, de 43 anos, também presenciou grandes avanços na educação nos últimos anos. Ela, que atua na Escola de Educação Básica da Universidade Federal de Uberlândia (Eseba/UFU), conta que se tornou professora pela paixão pelo ensino que foi nascendo enquanto ainda era estudante. Segundo ela, na época, não era exigido o ensino superior para atuar na educação básica e infantil. 

“Considero a minha geração extremamente privilegiada, porque a gente pode acompanhar em tempo real uma série de mudanças importantes. Antes, era exigido só o magistério, foi criada uma lei em você tinha um período de 10 anos para concluir seus estudos e então poderia então atuar na educação infantil”, disse.

Para Clarice, que iniciou sua carreira em 1996, as mudanças são essenciais para o avanço do desenvolvimento da educação, do ensino e também das habilidades dos profissionais. “Era necessário que os profissionais acompanhassem, estudassem, aprofundassem seus estudos e suas reflexões para que pudessem oferecer uma educação de qualidade”, frisou. 

A professora também presenciou a inclusão das crianças e adolescentes na participação das aulas, que eram muito engessadas e impositivas. Além disso, Clarice destaca sobre a conquista da Lei de Cotas e das legislações que permitem às pessoas com deficiências terem o direito de estudar. 

“Foram questões muito importantes que marcaram meus 26 anos de carreira.  O debate da educação de inclusão, como fazer, o que fazer, o direito das pessoas com deficiência e ainda a questão das histórias da cultura afrobrasileira no currículo do ensino fundamental e médio, que foi um grande marco. A conquista da lei de cotas, que foi uma grande reparação histórica e vitória da população negra”, complementou. 

Por fim, Clarice ressalta que, apesar das mudanças no campo da produção científica da educação, ainda há muito o que avançar na questão da valorização do profissional e das condições do trabalho. 

“É claro que a produção científica é viva, contínua, processual, então ela acontece e não é estática. Agora, as condições de trabalho nós temos grandes lutas pela frente quanto na valorização, na melhoria de condições estruturais, de trabalho e salariais”, concluiu. 

EDUCAÇÃO INCLUSIVA

Natural de Monte Alegre de Minas, Valdirene Ferreira da Silva atua como profissional de educação há apenas cinco anos, mas a paixão pela área vem de mais de 17 anos. Val, como é conhecida, tem especialização em psicopedagogia, ludopedagogia, educação inclusiva, libras e clínica institucional.

Val deu aulas em Uberlândia por um tempo, mas se mudou para o estado do Rio de Janeiro nesta semana. O amor pelo ensino da educadora virou um espaço online, em que ela cria conteúdos digitais voltados para crianças e adolescentes, incluindo aqueles com autismo e deficiências visuais ou auditivas.

Atualmente, Valdirene tem o @valinterativa no Instagram, Facebook e TikTok. Ela conta que se somadas as três redes sociais, o número de seguidores já ultrapassa os 200 mil. Em entrevista ao Diário, Val disse que tudo começou do amor pela educação e da vontade de ajudar outros professores a ensinar de forma mais inclusiva e lúdica.

“Eu me apaixonei pela área educacional em 2005, quando eu conheci a linguagem de libras. Foi conhecendo a necessidade de ter comunicação e entendimento que eu percebia como era difícil para os alunos aprenderem. Ainda temos poucos profissionais habilitados para isso, então eu entendi a necessidade de que era essencial eu ter uma licenciatura para poder ajudar esse público”, relatou.

Valdirene falou também que o trabalho como professora fez ainda mais sentido durante a pandemia de covid-19. Com a dificuldade de engajar os alunos, ela passou a criar cada vez mais conteúdos educativos para ajudar os pais, que muitas das vezes não conseguem dar a atenção necessária para os pequenos devido a correria do dia a dia.

“Muitos pais ficaram desorientados. Como vou ensinar algo para os meus filhos com autismo, síndrome de down ou com deficiência auditiva e visual? Comecei a elaborar essas atividades gratuitas para ajudar e logo foi expandindo. Eu, como professora, também sei da dificuldade de procurar conteúdo para alunos. Felizmente, recebo muitos elogios de professores, já que essas atividades também otimizam o tempo desses profissionais, que não têm tempo para sentar, criar e elaborar uma atividade”, contou Val.

DESINTERESSE
Um levantamento do movimento Todos pela Educação, com base em dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), aponta que a cada 100 jovens que ingressam nos cursos de pedagogia e licenciatura no país, apenas 51 concluem o curso. Entre os que chegam no final do curso, apenas 27 manifestam interesse em seguir carreira no magistério.

Para a professora de biologia Fátima Dezopa, a desvalorização da carreira é um dos principais motivos pelo qual cada vez menos alunos sigam o caminho de professor. Ela citou o próprio exemplo ao relatar que os profissionais de educação do estado não recebem reajuste salarial há pelo menos quatro anos.

Outro ponto abordado pela professora são os baixos salários praticados no mercado. “A gente sabe que a faixa salarial do professor é baixa, e a gente sabe que isso é um fator preponderante. Muitas pessoas ainda têm visões ruins das escolas públicas, então acabam indo para a particular, então gera um apagão de professores”, argumentou Fátima.

Para a presidente do Todos pela Educação, Priscila Cruz, o Brasil atrai pouca gente principalmente pela desvalorização citada por Fátima. Em sua visão, é preciso criar políticas de atratividade necessárias para aumentar o interesse na profissão, como a melhoria dos salários. Segundo Priscila, atualmente o professor ganha metade do que os profissionais de outras áreas com ensino superior completo.

Priscila destaca ainda que é preciso melhorar as condições de trabalho do professor. A proximidade dos jovens com a profissão faz com que eles vejam de perto a realidade dos professores, que nem sempre é atrativa. “O fato de o jovem verificar no seu dia a dia que os professores não são valorizados, e muitas vezes são atacados pelos próprios jovens, pelas famílias, pela sociedade, pelo governo, isso faz com que o jovem desista da profissão”, lamentou.

HISTÓRICO
O Dia do Professor foi criado para homenagear os profissionais de educação que dedicam suas vidas à transmissão do conhecimento e ao desenvolvimento da educação no nosso país. Trata-se de um feriado escolar e não faz parte do calendário oficial como feriado nacional ou ponto facultativo. Portanto, é prerrogativa das escolas não ofertarem aula neste dia.

A data escolhida para comemorar o Dia do Professor faz referência ao dia 15 de outubro de 1827, quando Dom Pedro I, Imperador do Brasil, decretou uma Lei Imperial responsável pela criação do Ensino Elementar no Brasil, chamada de “Escola de Primeiras Letras”, e através desta norma todas as cidades deveriam ter suas escolas de primeiro grau.

O decreto também continha o salário dos professores, as matérias básicas e até como os professores deveriam ser contratados. A comemoração começou em São Paulo, onde quatro professores tiveram a ideia de organizar um dia de parada para celebrar esta data, e também traçar novos rumos para o próximo ano. A data foi oficializada nacionalmente como feriado escolar através do Decreto Federal nº 52.682, de 14 de outubro de 1963.

• Compartilhe esta notícia no WhatsApp
• Compartilhe esta notícia no Telegram


 
Notícias Relacionadas »
Comentários »
Diário de Uberlândia | jornal impresso e online Publicidade 1140x90