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14/08/2022 às 13h00min - Atualizada em 14/08/2022 às 13h00min

Cirurgias para diagnóstico de endometriose crescem quase 250% em Uberlândia

Doença inflamatória causa dores incapacitantes em mulheres, além de poder ocasionar infertilidade; especialista orienta sobre sintomas e tratamento

IGOR MARTINS I DIÁRIO DE UBERLÂNDIA
O número de procedimentos cirúrgicos para o diagnóstico da endometriose teve um crescimento de quase 250% neste ano em Uberlândia. De acordo com dados do Ministério da Saúde (MS), somente em 2022, 132 exames de laparoscopia e videolaparoscopia, utilizados para o rastreamento da doença, já foram realizados na cidade. Em 2021, 38 mulheres passaram por pelo menos um dos dois procedimentos.   
 
Os dois exames são a base para o diagnóstico da doença. Segundo o MS, desde 2019, 12 procedimentos de laparoscopia e 358 cirurgias de videolaparoscopia foram realizados no Município. De acordo com a ginecologista e oncologista Mileide Sousa, que tem especialidade na área, as duas técnicas são consideradas procedimentos pouco invasivos e apresentam menor trauma cirúrgico, além de menor dor pós-operatória com recuperação mais rápida das pacientes.
 
“O diagnóstico se baseia no histórico clínico da paciente, sempre é individualizado. É preciso entender o ciclo menstrual, entender se a paciente tem sintomas, se a dor é algo típico. Os exames de imagens são utilizados para avaliação e diagnóstico da extensão das lesões”, disse a ginecologista.
 
Com relação ao tratamento, há a possibilidade de intervenções cirúrgicas e reposições ou bloqueios hormonais. Além disso, a mudança de hábitos é recomendada, com a realização de dietas e fisioterapia para melhorar a estrutura pélvica.
 
“Baseado na qualidade de vida da paciente, é possível definir o tratamento. Uma dieta anti-inflamatória sem glúten, acupuntura, fisioterapia e medicações para aliviar os sintomas são recomendados. São várias estratégias que podem ser associadas a cada paciente”, explicou Mileide Sousa.


 
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO
Segundo o MS, 70 mulheres passaram por internação causada pela endometriose em Uberlândia, desde 2019. Em Minas Gerais, no mesmo período, foram registradas mais de 31 mil internações de pacientes que precisaram de atendimento médico devido a complicações da doença.
 
Apesar de existir há décadas, a endometriose foi amplamente discutida nos últimos meses, após a cantora Anitta passar por uma cirurgia para tratar da enfermidade. De acordo com a ginecologista Mileide Sousa, a doença é causada por uma inflamação das células endometriais fora do útero da mulher.
 
Ela explica que a endometriose não tem cura, mas é possível controlar a doença com tratamentos medicinais e cirúrgicos. Geralmente, a condição acontece quando ocorre um crescimento das células do endométrio em regiões do abdômen, podendo acontecer na bexiga e no intestino.
 
“Quando nós menstruamos, o que sai são as células endometriais. Na endometriose, essas células que estão dentro da cavidade abdominal também sangram e isso gera um processo inflamatório que causa os principais sintomas da endometriose, como a cólica menstrual intensa e incapacitante. É uma dor tão grande que você toma analgésicos e não melhora, muitas vezes é necessário ir a um pronto socorro para melhorar a dor”, explicou.
 
Segundo a especialista, além da cólica menstrual intensa e incapacitante a mulher também pode sentir dores na relação sexual e até mesmo sintomas urinários, como sangramento. Outro fator clássico da doença são as dores para evacuar, podendo também ter sangramento e intestino preso, dependendo de cada caso.
 
De acordo com a médica, muitas pacientes ainda são pouco sintomáticas com relação à endometriose, o que pode dificultar o diagnóstico e confusão com os sintomas normais da enfermidade. “Em várias ocasiões, a mulher acha que ela tem outra coisa, e investiga uma possível infecção urinária, alguma questão urinária e acaba descobrindo que está, na realidade, com endometriose”, disse.


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GRAVIDEZ
Uma das principais complicações causadas pela endometriose é a dificuldade de engravidar. Segundo a especialista ouvida pelo Diário, cerca de 30% a 50% das mulheres diagnosticadas com a doença têm problemas gestacionais. A infertilidade acontece devido ao próprio processo inflamatório da enfermidade, podendo provocar aderências pélvicas e distorções na anatomia da pelve.
 
“Sempre que acontece essa distorção na pelve, também ocorre distorção no ovário da trompa. Isso dificulta o encontro do espermatozoide com o óvulo. O endométrio que vai receber o neném também tem algumas particularidades que dificultam a implantação do embrião. Felizmente, várias pacientes engravidam e apesar das dificuldades, o tratamento pode melhorar a chance de gravidez através de técnicas de reprodução assistida, que ajudam no desejo gestacional”, disse Mileide.
 
A ginecologista afirma que mesmo com o alto índice de mulheres com endometriose, ainda não se sabe exatamente o que leva a uma paciente desenvolver a enfermidade. “A doença aparece em algumas mulheres, mas outras não. Não é possível saber o mecanismo disso, são coisas que a gente ainda está descobrindo”.
 
A especialista orienta que a qualquer sintoma de cólica menstrual intensa, é importante consultar um médico ginecologista. Segundo ela, quanto mais cedo o diagnóstico, melhor e mais rápido é o tratamento. “Muitas vezes os sintomas da endometriose são menosprezados. Muitas mulheres são vistas como fracas, mas isso não é normal e precisa ser investigado. Se o diagnóstico for tardio, o tratamento vai ser mais demorado”, detalhou Mileide.
 
VÁLVULA DE ESCAPE
A pedagoga Leda Gonzaga Alves, de 55 anos, convive com a endometriose há 23 anos. Em conversa com o Diário, ela conta que sempre teve cólicas menstruais fortes desde quando era adolescente, mas o diagnóstico demorou. Apesar de a doença não ter atrapalhado seu desejo gestacional, ela disse que sofreu por um longo tempo com os sintomas da patologia.
 
“Eu sofria muito com cólicas na adolescência, mas na época era tudo normal para a gente. A endometriose chega a um ponto que te incapacita, ataca várias regiões e vai tirando pedaços da gente. Com 32 anos eu já não conseguia fazer muita coisa, fiz uma cirurgia de remoção de útero, fiz tratamento, mas não adiantou completamente”, disse Leda.
 
Leda disse que já passou por uma série de tratamentos e cirurgias. A paixão pela literatura e a escrita a motivaram a escrever um livro para contar suas dores e angústias o que, segundo ela, melhorou e muito sua qualidade de vida, sendo uma verdadeira válvula de escape. A obra, “Endometriose – O silêncio e a dor da alma”, foi lançado em 2014 e alerta as mulheres sobre a doença.
 
“Eu sempre gostei muito de escrever. Eu comecei a pesquisar mais sobre o assunto e colhi depoimentos de outras mulheres, foi aí que eu comecei a ver que eu era igual a elas. Nós publicamos o livro e eu posso dizer que a literatura me salvou, me deu uma qualidade de vida melhor. Eu busquei preencher minha cabeça com outra coisa”, relatou ela, que adiantou à reportagem que o livro deve ser relançado ainda neste ano.


 
ESTÁGIO INICIAL
Com apenas 19 anos de idade, a estudante Maria Eduarda Marrama Luques foi diagnosticada com a endometriose. Após sentir dores intensas de cólicas, ela passou pelo procedimento de laparoscopia, que apontou a doença em seus estágios mais iniciais. Em seguida, já começou o tratamento e relata que as dores ainda continuam, mas em menor intensidade.
 
Além da endometriose, Maria Eduarda também tem a síndrome dos ovários policísticos, um distúrbio hormonal caracterizado pela presença de cistos no órgão. Dessa forma, ela explica que o diagnóstico da endometriose poderia ter vindo até mesmo com mais antecedência, visto que os dois problemas geralmente eram confundidos após exames.
 
“Eu tinha muitas dores, dores de cabeça e o meu corpo sofria bastante. O tratamento tem surtido bastante efeito. Comecei a tomar medicamentos junto com o anticoncepcional e já melhorou muito os sintomas. Não resolveu totalmente, ainda sinto dores, mas é bem menos do que antes”, disse.
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