25/11/2021 às 18h47min - Atualizada em 25/11/2021 às 18h47min
Empreendimento imobiliário na região sul de Uberlândia pode colocar fim a mais de 3,2 mil árvores em área do Córrego Mogi
Mata nativa com 82,2 mil m² dará lugar a 693 apartamentos; projeto deve ser votado pelo Codema na próxima semana
SÍLVIO AZEVEDO
Região tem 265 caracterizadas como imunes de corte, ou seja, protegidas de qualquer intervenção | Foto: Angá/Divulgação A construção de um empreendimento imobiliário pode colocar fim a uma área de preservação do cerrado com mais de 82,2 mil m², que fica próxima ao Córrego Mogi, na região sul de Uberlândia. O Diário teve acesso ao relatório de análise do projeto feito pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Serviços Urbanos. O documento revela que a construção implicará na supressão de 3.255 árvores, dessas, 265 caracterizadas como imunes de corte, ou seja, protegidas de qualquer intervenção, sendo 259 pequizeiros e seis ipês-amarelos.
Em setembro, a reportagem do jornal trouxe uma matéria sobre o assunto noticiando a preocupação de moradores do Setor Sul com o possível desmatamento da grande área de cerrado que existe entorno do Córrego Mogi para construção de empreendimentos imobiliários. Outro impacto causado pela obra está na necessidade de extensão de vias de acesso e construção de sistema de água e esgoto, que passará próximo a uma das margens do Córrego Mogi.
Após a reportagem feita pelo Diário, o Ministério Público Estadual (MPE), através do promotor de Justiça de Defesa do Meio Ambiente, Breno Linhares Lintz, enviou uma recomendação à Prefeitura de Uberlândia solicitando a paralisação dos processos, entre outras ações a serem adotadas por empresas que solicitarem construções em glebas da região do Mogi.
No documento, além da paralisação de análise dos processos, o MP exige que seja feito um Estudo de Impacto Ambiental (EIA) para qualquer empreendimento inserido na região do Córrego Mogi e em seu entorno, definido por um grupo de trabalho constituído no âmbito do Conselho Municipal de Desenvolvimento Ambiental (Codema), além da realização de audiências públicas quando houver implantação de projetos imobiliários.
A reportagem fez contato com promotor Breno Lintz para buscar mais informações sobre o andamento do caso. Em resposta, o promotor informou que a construção do empreendimento deve ser liberada, pois a empresa está com os procedimentos em dia. “Ela [a Prefeitura] respondeu que havia um procedimento, de imediato, para ser liberado, pois já tinha cumprido todas as etapas anteriores do processo, e que outros estão sendo protocolados. Ela respeitaria a resolução a partir desse que estava terminando”, disse.
O Diário solicitou um posicionamento da Prefeitura a respeito da recomendação. Por meio de nota, o Município informou que os assuntos em relação às áreas em torno do Córrego Mogi estão sendo tratados junto ao Ministério Público, sem deixar claro se cumpriu ou não o que foi recomendado.
EMPREENDIMENTO
A construção do empreendimento deve ser um dos assuntos a serem discutidos em uma reunião do Conselho Municipal de Desenvolvimento Ambiental (Codema), que será realizada na próxima semana.
O empreendimento deve abrigar 693 apartamentos e área de lazer. Entre as medidas compensatórias propostas pelo parecer técnico da Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Serviços Urbanos está a doação de 62,98 m³ de concreto para serem utilizados na execução de calçadas, de áreas verdes e recreação.
O acordo também contempla a realização do conserto e manutenção do micro trator e carreta do Horto Municipal, a doação de 12,5 mil m² de grama, que será utilizada em projetos paisagísticos de áreas públicas, além de 1,4 mil mudas de arbóreos para plantio no Projeto de Arborização Urbana.
O parecer também solicita a doação de insumos de pintura para a revitalização dos equipamentos implantados nas áreas dos Parques Municipais Victório Siquieroli, Santa Luzia e Gávea e o plantio de 12 ipês- amarelos e 650 pequizeiros.
IMPORTÂNCIA DO MOGI
O arquiteto e urbanista Júlio Cesar Lavrador Andréo, que é morador da região afetada e defende a preservação da área, argumenta que além de ter um grande potencial como um possível equipamento urbano de lazer, a região pode ser encarada como um "alívio" ambiental em se falando de zonas urbanas de calor por ajudar na infiltração de águas das chuvas, diminuindo os impactos com inundações e enchentes.
“É de conhecimento comum dos problemas que a cidade tem com as enchentes nas regiões da Av. Rondon Pacheco e nas imediações do Camaru, da Av. Ver. Carlito Cordeiro até a Av. Getúlio Vargas e sucessivamente. É um problema resultante da impermeabilização urbana, sem controle, das regiões de contribuição dos ‘vales’ onde os córregos se encontram. Quanto maior a impermeabilização maior serão as enchentes e prejuízos urbanos e sociais. A área do Córrego Mogi contribui pouco, por não estar impermeabilizada, não gerando assim prejuízo. Ela é responsável pela drenagem eficiente de água pluvial, diminuindo o peso e a velocidade que tanto assolam o sistema nas outras áreas citadas”, disse.
Já bióloga Bianca Bonami Rosa reforça a importância do Córrego Mogi, que, apesar de ser uma bacia menor dentre as várias em Uberlândia, apresenta algumas funções que não podem ser ignoradas.
“Ele serve de refúgio de fauna e flora nativas no meio da cidade, onde as opções de dispersão e alimento são limitadas, regula temperatura e umidade no setor sul do município, sendo um grande fator no conforto dos cidadãos que residem nos bairros próximos, além da beleza e lazer que a área pode propiciar e é um dos rios que alimentam o Rio Uberabinha”, destaca.
O local também abriga algumas espécies de animais e plantas que são ameaçadas de extinção. “As mais marcantes são a ave Mutum-de-penacho e a planta Palmito-juçara, ambas muito visadas pelo potencial alimentar, e provavelmente não são as únicas. Além dessas espécies ameaçadas, foram encontradas na área espécies que são protegidas por lei no estado de Minas Gerais, dentre elas o Pequizeiro, o Buriti e várias espécies que se enquadram dentro da definição de Ipê-amarelo”, informou a bióloga.
A especialista ouvida pelo Diário também defende a criação de um parque municipal, ou extensão da área de preservação em torno do Mogi. “Acredito que a criação de um parque ou área de conservação nas áreas que circundam o curso d’água, tanto a mata de galeria quanto o Cerrado típico, seria uma obra muito mais interessante para a sociedade, pois seria algo que todos poderiam visitar e apreciar. Isso sem falar o quanto uma área assim embelezaria nosso município, que já é tão carente de áreas verdes”.