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04/01/2020 às 09h32min - Atualizada em 04/01/2020 às 09h32min

Práticas ilícitas para levar vantagem fazem parte das ações cotidianas

Historiadora explica por que comportamento não se restringe apenas ao meio político; PM relata tentativas de suborno durante blitzen em Uberlândia

IGOR MARTINS
Pesquisa aponta que pagamento de propina a policiais é comum | Foto: Arquivo/Diário de Uberlândia
Os recentes escândalos de corrupção no âmbito governamental acenderam o alarme das autoridades e despertaram o ódio e a indignação de milhares de pessoas. Desde que grandes esquemas têm sido revelados, a palavra “corrupção” tem ganhado cada vez mais espaço no vocabulário e nas discussões dos brasileiros.

O grande problema é que a corrupção não está restrita apenas à esfera política, e também não diz respeito apenas a atos escusos de agentes públicos. Dicionários, por exemplo, definem a corrupção como a utilização de meios ilegais para obter algo em benefício próprio ou em nome de uma outra pessoa. Qualquer pessoa. É a ação de corromper ou adulterar o conteúdo original de algo por meio da depravação de hábitos e costumes existentes em uma pessoa.

Uma pesquisa da Transparência Internacional (TI), realizada entre janeiro e março de 2019, mostrou que, para a maioria dos brasileiros, as práticas corruptas aumentaram nos últimos anos em solo brasileiro. Cerca de 90% dos entrevistados afirmaram à entidade que acreditam que a imoralidade no meio político representa um grande problema para o Brasil, sendo que políticos de alto escalão apareceram entre os mais citados nas respostas, incluindo o presidente, juízes e magistrados, deputados, senadores, banqueiros, líderes religiosos, policiais e jornalistas.

Por outro lado, 11% dos brasileiros que participaram do levantamento disseram ainda que pagaram suborno nos últimos anos no País. A Polícia Militar (PM) apareceu na primeira colocação dentre os mais citados, em 12% dos casos. Os serviços públicos básicos também figuram entre os mais apontados, com 8%. Os hospitais públicos e centros de saúde, por exemplo, representam aproximadamente 5% nas menções.

Um policial militar, que preferiu não se identificar, contou à reportagem do Diário de Uberlândia sobre uma das vezes que sofreu tentativa de suborno após uma abordagem a um advogado durante uma blitz na cidade. Na ocasião, o veículo do homem estava com um problema de documentação e teria que ser guinchado, seguindo a lei de trânsito.

“Quando eu comuniquei que o carro precisava ser guinchado, ele disse que queria resolver a situação de uma outra maneira, mas eu não dei abertura e cortei rapidamente. Infelizmente a gente sabe que este tipo de coisa acontece em todo lugar, mas nós sempre tentamos ser íntegros neste sentido”, disse.

No linguajar popular, esta corrupção do dia a dia, a tal ação imoral para obter vantagens próprias, é comumente referida como “jeitinho brasileiro”. Por mais que, de certa maneira, o “jeitinho” esteja relacionado à corrupção, ambos termos possuem suas diferenças e devem ser melhor explicados, já que o último também pode ter uma conotação que não é negativa, de acordo com a historiadora Aida Cruz.

A mistura cultural existente no Brasil sempre fez com que o povo brasileiro visse as coisas sob uma perspectiva diferente, de um jeito mais fácil, segundo Cruz. Para ela, a conotação do nosso jeitinho é positiva quando falamos nas relações pessoais, e negativa quando ela é ligada às práticas corruptas.

“O brasileiro é muito acolhedor e muito cordial, esse é o nosso jeitinho e deve ser visto como algo bom. Mas existe, claro, o lado negativo do jeitinho brasileiro, que é quando começamos a ter atitudes que significam uma corrupção até mesmo de valores”, disse.

Graduada na Universidade Federal de Uberlândia (UFU), a araxaense de 56 anos afirma ainda que é uma característica inata do homem se corromper, indo de acordo com o pensamento do teórico político suíço Jean-Jacques Rousseau. O precursor do romantismo e um dos maiores filósofos do iluminismo afirmava que “o homem nasce bom, mas a sociedade o corrompe”. Aida Cruz, entretanto, acredita que isso não deve justificar os comportamentos corruptos existentes na sociedade atual. “Se uma sociedade me dá boas condições de crescimento e oportunidades para praticar boas atitudes, não tem como eu culpar essa sociedade. Temos o livre-arbítrio e devemos utilizá-lo.”

Na opinião de Cruz, o brasileiro ainda vive e viverá com o pensamento de “Se todo mundo faz, por que eu não faço?”. Isso vem de valores culturais desde os primórdios da história do Brasil e possui um referencial histórico de casos de corrupção existentes na Península Ibérica. A historiadora acredita que o brasileiro continuará agindo desta maneira por vários anos, a não ser que medidas sejam tomadas para combater os atos corruptos do dia a dia.

“Para o brasileiro, a lei é feita para todos, menos para ele. Por mais que as leis punam e castiguem alguns atos de corrupção, não acredito que ela resolverá esse problema. O Brasil precisa aprender e isso é possível por meio de ações, reflexões e valores ensinados dentro de casa, com a família e por meio de instituições, como a escola, a igreja e o governo”, finalizou a historiadora.







 

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