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10/11/2019 às 08h45min - Atualizada em 10/11/2019 às 08h45min

Fruta da temporada, pequi desperta contrastes em Uberlândia

Pesquisas mostram que fruta típica do cerrado traz benefícios ao coração e pode auxiliar em tratamento do lúpus

GIOVANNA TEDESCHI
Barracas com pequis proliferam no Centro de Uberlândia de novembro a fevereiro | Foto: Giovanna Tedeschi
Na Praça Tubal Vilela, entre barraquinhas com roupas, sapatos, artesanato e frutas, como o morango e a jabuticaba, se sente um aroma característico do cerrado. É a fruta de cor laranja, que é aberta com destreza por vendedores e anunciada na promoção. “Pequi! Pequi! Vamos comprar, moça?”.

Antônio de Souza ou Antônio do Pequi, como ele mesmo se identifica, vende o produto na praça há 15 anos. Como o pequizeiro dá frutos de novembro a fevereiro, esta época é crucial. “Novembro e dezembro é quando a gente vende mais. Não só para o pequi, mas acho que para o comércio em geral”, diz.

Os espinhos que acompanham a semente são perigosos, mas não são o principal motivo de muita gente odiar o fruto. O cheiro forte e o sabor cheio de personalidade é o maior responsável por afastar muita gente. Com o pequi é assim, 8 ou 80: tem quem ame e tem quem odeie.

No time dos fãs, há a dentista Adriana Fernandes, que conheceu a fruta durante uma viagem na zona rural de Uberlândia. Não chegou a consumi-lo na infância, já que ninguém da família gostava. “Paramos no meio do caminho, era época de pequi e eles [os colegas de trabalho] colheram na beira da estrada. Chegando, a gente comprou um frango caipira e a cozinheira fez frango com pequi. Eu sempre gostei muito de experimentar. Eu amei”, conta. “Tem muita gente que acha que ele é fedido, mas para mim ele é muito cheiroso. Então, quando eu faço pequi para mim aqui em casa é de portas fechadas.”

Seja no bairro Residencial Pequis, aqui em Uberlândia, na cidade Pequi, perto de Belo Horizonte, ou na Festa Nacional do Pequi, que acontece todos os anos em Montes Claros, percebe-se que a fruta não faz sucesso só em Goiás, mas em diversas regiões de Minas Gerais. E além do sabor típico, grande motivo do consumo, o pequi tem grandes benefícios à saúde.

Uma pesquisa da Universidade de Brasília (Unb) demonstra que o fruto é antioxidante e anti-inflamatório, podendo auxiliar na melhora de problemas cardiovasculares. “Todo mundo tem lipídio no sangue e quando esses lipídios se oxidam, eles podem formar a chamada placa de ateroma, a gordura que condensa no sangue. O pequi protege contra isso”, explica professor Cesar Grisolia, do Departamento de Genética e Morfologia do Instituto de Ciências Biológicas da UnB.

Quem tem lúpus, uma doença autoimune, também pode se beneficiar do consumo do pequi, principalmente de seu óleo. “O lúpus gera radicais em excesso [moléculas instáveis que são produzidas para converter os alimentos em energia]. Isso causa lesões nos tecidos, no DNA. Os pacientes aqui do hospital universitário tiveram tratamento durante 60 dias. Mostrou que ajuda na terapia. O pequi não é o medicamento indicado para lúpus, mas é um coadjuvante. Ele apenas ajuda no tratamento”, diz Grisolia.

Durante a pesquisa, também foram feitos testes com corredores de longa distância “Esta corrida exige um esforço muito grande e, por consequência, causa um stress físico. Aí eles tomavam [o óleo] antes de fazer a maratona e tinha uma eficácia muito boa sobre o organismo deles”, afirma. Proteção de lesões e micro-hemorragias musculares são alguns dos benefícios citados pelo professor.
De acordo com Grisolia, o pequi é mais efetivo quando utilizado em forma de cápsulas de óleo. Por isso, todos os testes realizados utilizaram este formato. O fruto é imerso em água e solta a polpa, que é prensada a frio. Assim o óleo é extraído, centrifugado, filtrado e encapsulado.

Estas cápsulas também auxiliam quem não consegue consumir o pequi do jeito que vem da natureza, por causa do sabor e cheiro fortes. “Quem gosta de pequi, come e está se alimentando de um produto extremamente nutritivo. Quem não gosta, toma as cápsulas com o óleo e aí o paladar não sente. É um óleo que ajuda com o colesterol bom”.
 
ALIMENTAÇÃO
Priscila Rincon é nutricionista da Naiak, uma das empresas que produz cápsulas com óleo e que encomendou o estudo sobre os benefícios da fruta. De acordo com ela, o pequi tem muitas vitaminas e minerais e, por isso, auxilia em inflamações. “O pequi é bem completo. Ele tem proteína, gordura, fibra e carboidrato. Ele tem vários nutrientes, dentre eles carotenoides, vitamina A, magnésio, potássio, fósforo”, afirma. A maneira mais indicada para manter todos os nutrientes do pequi é cozinhá-lo em água. Mesmo que congelado, não se perde muito das propriedades do fruto.

O pequi também é famoso, em algumas regiões, por seu poder afrodisíaco. Isso acontece por causa da grande quantidade de vitamina A, uma substância essencial para formação de hormônios sexuais. “Se o homem estiver com uma deficiência de vitamina A, ele não vai ter essa produção efetiva e não vai ter libido. Além disso, por o pequi ter bastante antioxidante, ele vai proteger as células reprodutivas e o envelhecimento prematuro”, explica a nutricionista. O mesmo é válido para mulheres.
 
IMPACTOS SOCIAIS
Pesquisador Cesar Grisolia, acredita que, ao agregar valor a um produto do cerrado, é possível contribuir para projetos conservacionistas | Foto: Divulgação 


As novas maneiras de produzir pequi e o aumento do consumo pela população não aumentam apenas a saúde, mas valorizam os frutos do cerrado. “Com essa produção do óleo de pequi encapsulado, tem mais empregos. A gente valorizando nosso cerrado com sustentabilidade, além de trazer emprego, ainda vai cuidar do nosso meio ambiente”, diz a nutricionista Rincon.

O pesquisador Cesar Grisolia, acredita que, ao agregar valor a um produto do cerrado, é possível contribuir para projetos conservacionistas, mas ainda assim, o ecossistema está em perigo. “A grande questão no Brasil é que o agronegócio está destruindo todo o cerrado. Só tem pequi onde não se pode plantar cana, soja e milho ou fazer pasto. Aí sim, nas reservas, onde tem solo acidentado, impróprio para agricultura, daí os pequizeiros são preservados”, opina. Ele escolheu estudar o fruto justamente para tentar valorizá-lo aos olhos da população.

Para a professora Bonetti, o cultivo do pequi pode ajudar na produção familiar e assim, gerar impacto social positivo. “Se você melhora a renda familiar, as pessoas podem ter um pouco mais de condição de participar da sociedade em termos de buscar coisas melhores para a família. Tem um impacto de aumentar a renda básica familiar para quem produzir para venda. Esse impacto econômico se reflete depois como impacto social”, afirma.
 
SEM ESPINHO
UFU cria projeto para melhorar fruta geneticamente e torná-la ainda melhor para a saúde | Foto: Milton Santos


Um projeto da Universidade Federal de Uberlândia (UFU) cultiva o pequi sem espinho desde 2005. A fruta, além de menos perigosa para quem come, ainda tem a polpa 35 vezes maior do que a comum. A espécie foi trazida de uma aldeia do Parque Indígena do Xingu, no Mato Grosso e além de mais nutritiva, tem o sabor mais suave.

O estudo continua e agora compara os dois frutos para melhorá-los geneticamente e fazer com que a versão sem espinho se torne ainda melhor para a saúde. “Nós estamos partindo agora para uma análise molecular para identificarmos genes que sejam relacionados a características de valor nutricional para fazermos uma seleção e tornarmos o pequi sem espinho mais nutritivo e produtivo”, explica a professora Ana Maria Bonetti, do Instituto de Biotecnologia da UFU.

O objetivo agora é colocar este pequi no mercado, além de distribuir mudas para a população, em cerca de três anos. “A germinação é lenta, então nós estamos estabelecendo técnicas de cultivo e micropropagação, tanto por semente, quanto in vitro, para gente poder assim, aprofundar e viabilizar a técnica biotecnológica para produção de mudas que tenham valor nutricional mais alto e que tenham resistência a doença”, diz Bonetti.

A professora ainda fala em plantar pequizeiros na rua, para que quem quiser, tenha acesso. Ela fala sobre uma iniciativa do tipo em Palmas (TO). “Tinha até pessoas com sacolinhas. De manhã elas saem, quando o pequi já está bom, pegando para levar para casa. É o que a gente queria fazer também: plantar bastante no Parque do Sabiá, nas ruas, e quando produzisse as pessoas podiam pegar”, planeja.











 

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