Diário de Uberlândia | jornal impresso e online Publicidade 1140x90
21/07/2019 às 12h04min - Atualizada em 21/07/2019 às 12h04min

Casas de repouso e hotéis geriátricos são cada vez mais comuns em Uberlândia

Foco está no conforto e na assistência a idosos; mercado para cuidadores também cresce

GIOVANNA TEDESCHI
Idosas fazem atividade recreativa em casa de repouso no bairro Cazeca, na região central | Foto: Giovanna Tedeschi

Dona Odete Guarato é uma senhora de sorriso fácil que faz questão de se levantar para cumprimentar quem chega, mesmo aos 92 anos. Palmeirense fanática e dedicada ao tricô e ao crochê, ela vive em um hotel geriátrico, localizado no bairro Cazeca, em Uberlândia, há cinco anos.

“Gosto demais daqui, amo essa família”, afirma, com os olhos brilhando por trás dos óculos escuros. “Eu estava fazendo uma caminhadinha em casa, caí e quebrei o fêmur. Há mais de 20 anos eu também quebrei o ombro. Eu tenho três parafusos em cada lugar”, conta, quando perguntada sobre o motivo de morar no local. Em 2014, ela não conseguia andar.

Dona Francisca Rosa Barbosa, de 85 primaveras, vive no mesmo hotel, onde está há dois anos e meio. Aposentada há 30 anos, trabalhou na Universidade Federal de Uberlândia (UFU) em serviços de limpeza e em cantinas. Ela foi morar no local depois de ter caído em seu apartamento e ficado internada por 15 dias. Ela diz não se lembrar do tempo em que esteve no hospital.

“Eu não sou muito de ficar no meio do povo, não. Sou mais de ficar sozinha. Eu gosto de bordar, eu gosto de desenhar. Quando eu estou trabalhando, eu não gosto de conversar”, afirma, sobre sua rotina. No hotel, ela ainda faz atividades como fisioterapia e outros exercícios.

Casas de repouso e hotéis geriátricos, além da contratação de cuidadores independentes, são negócios cada vez mais comuns em Uberlândia. Com o envelhecimento da população e a existência de doenças como o Alzheimer, muitas famílias têm necessidade de pessoas que possam se dedicar ao cuidado dos idosos.

No hotel geriátrico no Cazeca, por exemplo, há três modalidades de estada: a longa permanência, em que o idoso mora no local; o hotel-dia, em que ele fica enquanto a família está fora, geralmente das 7h às 19h; e a temporada, quando os familiares precisam fazer uma viagem ou ficar fora por alguns dias. Os valores de cada estada dependem do nível de dependência do idoso, mas costumam ser de, em média, R$ 4 mil mensais para a moradia e R$ 2 mil mensais para passar o dia. Os valores da temporada são contados por diárias, que custam cerca de R$ 150.

Egigliene Brandão, ou Gigi, como é chamada por moradores e profissionais do hotel, é a mente por trás do negócio. Enfermeira, trabalhou por dois anos em uma casa de repouso em Uberaba porque não conseguia emprego na área hospitalar, que era a que tinha mais interesse. “Logo me apaixonei. Foi entrando nessa casa, quando comecei a trabalhar, que tive uma noção do que eram os cuidados com os idosos”.

 

Foi assim que decidiu abrir a casa em Uberlândia. A mudança de cidade, segundo Brandão, foi para não abrir concorrência com o ex-patrão, por quem nutre consideração. “Como eu tinha parentes aqui em Uberlândia, vi uma oportunidade de mudar para cá com minha família e abrir meu negócio aqui. Eu sou apaixonada pelos idosos, não sei fazer outra coisa”, relata. O hotel existe desde 2014 e tem capacidade para 25 leitos. Uma média de 35 pacientes frequenta o local todos os dias. “Cada idoso tem um cardápio especial. Tem uns que não podem com lactose. Tem uns que são diabéticos. Tem que ter todo cuidado nesse sentido”, diz Lucileia Carvalho, uma das profissionais que trabalha na casa. 

Sua função é na cozinha, de acordo com as recomendações de uma nutricionista. Carvalho já teve o próprio restaurante e tem uma ligação direta com Brandão: é sua mãe.

Técnica em enfermagem, Daiany Rosa trabalha no hotel há um ano. Suas atividades se dividem entre checar os sinais vitais dos idosos, auxiliá-los em atividades básicas, como no banho, e escrever relatórios sobre o estado de saúde de cada um. “A gente se torna outra família deles, assim como eles se tornam a minha segunda família também”, afirma.

Brandão, dona do local, traz à tona a questão de falecimentos: apesar de esperados, costumam abalar bastante os moradores e colaboradores do local. “Como eles têm afinidade, os idosos ficam bem abalados porque eles se veem no lugar daquela pessoa que faleceu”, diz.
 
EM DOMICÍLIO
Lúcia Marques tem 58 anos e é cuidadora de idosos há 10. Ela diz ter começado na área por amor. “Eu cuidei de uma pessoa que necessitava muito e não tinha como pagar e eu fazia alguns serviços voluntários”, afirma. Segundo ela, a procura por seus serviços aumentou nos últimos anos. O salário de um cuidador costuma variar entre R$ 998 e R$ 1.170, de acordo com informações do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) do Ministério do Trabalho.

A enfermeira Eliane Fernanda, de 42 anos, trabalha na área desde 2012, quando se formou. Ela atende a mesma paciente desde então. “Quando criança, eu sempre falava que queria ser enfermeira. Minha irmã é técnica de enfermagem aposentada, o que muito me incentivou a realizar este sonho”, conta. Ela também afirma que a área tem crescido muito, tanto para enfermeiras, quanto para técnicos e cuidadores. O salário de enfermeiros costuma variar entre R$ 2,2 mil e R$ 4 mil, segundo Fernanda.

Na opinião da cuidadora Marques, a escolha por um cuidador domiciliar ou uma clínica tem relação com a proximidade com a família. “Eles [os idosos] gostam muito do próprio lar, mas eu conheço clínicas em que o idoso tem muito conforto, ele se sente bem também. Acho que o ideal seria uma clínica quando eles não estão muito próximos da família”, diz.
 
 
Envelhecimento da população traz mudanças ao mercado
Economista e pesquisador do Centro de Estudos, Pesquisas e Projeto Econômico-Sociais (Cepes) da Universidade Federal de Uberlãndia (UFU), Luiz Bertolucci diz que, mesmo sem dados concretos, é possível perceber o crescimento do mercado direcionado à terceira idade.

 

“Mesmo as construções recentes, prédios de apartamentos, por exemplo, estão considerando a inclusão de elevadores e outras facilidades requeridas pelos idosos. Fica evidente o aumento de ações e negócios voltados às pessoas idosas, particularmente em Uberlândia, cidade que recebe migrantes vindos de outras regiões para fixarem residência aqui em busca de amenidades, tratamento em saúde e outros recursos relativos às idades mais avançadas”, afirma.


De acordo com a professora Verônica Freitas de Paula, da Faculdade de Gestão e Negócios (Fagen) da UFU, o envelhecimento da população traz mudanças para o mercado como um todo. “Com as mudanças nas características e perfil do mercado consumidor, novas oportunidades de negócios surgem a todo momento. O aumento da população acima de 60 anos impacta nas demandas por serviços e bens diferenciados”, explica.

Bertolucci diz também que a população precisa envelhecer bem para trazer impactos positivos na economia. “É necessário que ao longo de seu ciclo de vida ativo, entre 20 e 60 anos, esta população tenha acessado educação de alto nível, principalmente em nível superior de qualidade; que a população de jovens adultos tenha encontrado emprego formal adequado a fim de que tenha renda para viver bem, formar sua família e ainda acumular alguma poupança para o futuro”, diz.

Em Uberlândia, apesar da existência de diversas casas de repouso e clínicas para idosos, há poucos comércios destinados exclusivamente a este público. Uma loja localizada no bairro Umuarama oferece produtos para quem precisa de acessibilidade. O público se divide entre idosos (40%), empresas (15%) e deficientes/outros (45%).

No local, são vendidos produtos como cadeiras de rodas, barras de apoio, andadores, muletas e plataformas para acessibilidade (os elevadores que vemos em escadas, por exemplo). “Grande parte do nosso público são os idosos. Indiretamente os que mais utilizam, pois quando um comerciante compra uma barra de apoio para seu estabelecimento, esta barra não será utilizada somente por um deficiente, um idoso também irá usar”, afirma a gerente da loja, Flávia Oliveira.

Para quem tem interesse em empreender na área, a professora Verônica de Paula aconselha conhecer a fundo as demandas e necessidades do público. “Manter proximidade, atendimento diferenciado, valor agregado, melhor custo benefício, exclusividade e buscar formas de customizar a oferta para as necessidades de segmentos diferentes é essencial para o sucesso do negócio”, especifica. Outra dica é manter-se atualizado, com inovações que atendam o novo perfil do consumidor.


Tags »
Notícias Relacionadas »
Comentários »
Diário de Uberlândia | jornal impresso e online Publicidade 1140x90