Diário de Uberlândia | jornal impresso e online Publicidade 1140x90
16/12/2018 às 07h30min - Atualizada em 16/12/2018 às 07h30min

O mirante espelhado do Centro de Uberlândia

Edifício Chams, ainda imponente após quase 40 anos, mudou o modo de consumo da cidade e tinha como projeto original ser um prédio residencial

NÚBIA MOTA
Chams já foi palco de pedidos de casamento, jantares românticos e gravações de clipes, por exemplo | Foto: Jorge Alexandre Araújo
A palavra árabe مس (chams), que em português significa sol, dá nome a um dos prédios mais imponentes de Uberlândia, com um dos mirantes mais procurados, palco de pedidos de casamento, jantares românticos, sessões de foto, gravações de clipes, visitas de estudantes de arquitetura, de onde dá para ver a cidade em um ângulo de 360°. O prédio espelhado, localizado no hipercentro, bem de frente a praça Tubal Vilela, pode até passar desapercebido para quem vai por aqueles lados todos dias, mas é impossível de não chamar atenção de quem vem a Uberlândia a passeio. Além da beleza arquitetônica, o Edifício Chams, inaugurado em dezembro 1981, é um espetáculo à parte para quem o visita e sobe em sua parte mais alta.

A construção do Chams foi ideia de dois libaneses radicados no Brasil. Amin Hussein Abou Said e Nauaf Mohamed El Shariti, sócios da empresa Empreendimentos Imobiliários Chams, eram construtores em Brasília e decidiram expandir os negócios para o Triângulo Mineiro.  Eles então contrataram o colombiano Cesar Barney, arquiteto que trabalhou ao lado de Oscar Niemeyer, durante a construção de Brasília, para colocar a ideia em prática.
“Eles tinham muito dinheiro e queriam construir um prédio residencial, depois mudaram de ideia e o projeto passou a ter salas comerciais. Acho que é porque não teve muita procura. Fui aí várias vezes, acompanhar a obra”, conta Cesar Barney, que aos 84 anos está na ativa, trabalhando ainda em Brasília, e é casado com a uberabense Elvira Ratto de Barney.

Nos jornais da época, diziam que seria uma mansão por andar, com quatro quartos, dois banheiros e duas vagas de garagem, algo inédito para época. Síndico do prédio há 21 anos, Sebastião Rodrigues lembra que surgiu um boato no qual os donos, como eram libaneses e moravam em Brasília, poderiam dar algum tipo de prejuízo aos novos compradores. “Eles fizeram três contratos com fazendeiros da região, mas saiu um boato de que eles poderiam deixar os compradores na mão. Os fazendeiros foram até o seu Amin, que era uma pessoa muito honesta, falar sobre os comentários. E ele disse: ‘Vocês não me pagaram nada ainda e eu também não devo nada pra ninguém. Está desfeito o negócio’. E então rasgou os contratos e ligou para o arquiteto para mudar o projeto’”, disse Sebastião.


Sebastião, síndico do Chams há 21 anos | Foto: Núbia Mota

As obras começaram em 1977, quando foram feitos os primeiros cinco pavimentos para abrigar as Lojas Americanas, inaugurada em 1978 com acesso pela avenida Floriano Peixoto. Desde a base e o primeiro tijolo, lá estava José Onofre de Souza, hoje com 66 anos, primeiro como servente, guincheiro e hoje como zelador do prédio desde a inauguração, em dezembro de 1981. “Conheci os dois libaneses, muito boas pessoas. Uma pena que os dois já se foram. O Amim ajudava a gente na obra, como mestre de obras. Era muito humilde. Aqui era uma barreira danada. Eu trabalhava no barro. Aqui ficava uns casarões e aqui do lado, onde fica o Banco Itaú, ficava a Fábrica de Balas Princesinha. De todo mundo, só restou eu. Isso aqui é minha casa. Construí minha casa e o que pude ajudar, ajudei meus filhos”, disse José, que já é aposentado há 8 anos e tem dois filhos e quatro netos. O zelador conhece o prédio em detalhes e o que mais chama a atenção é que ele nunca usa o elevador e sobe o tempo todo,  do térreo à cobertura, várias vezes no dia, pelas escadas. “Se eu for esperar elevador, eu não trabalho”, disse o zelador.

Hoje, o Chams tem 173 salas comerciais e 18 andares. Como ele foi feito para abrigar um apartamento por andar e houve mudanças de planos, já com o prédio em construção, não foi possível ampliar o número de elevadores e os dois equipamentos que lá existem, não são suficientes para atender o fluxo de pessoas - atualmente apenas 4 salas não estão ocupadas. Os elevadores fazem em média 1.200 viagens por dia e o cabo de aço feito para durar 50 anos, dura apenas 10.
 
TÉRREO
Prédio recebeu a primeira escada rolante da cidade

 

O Edifício Chams em processo de construção

A professora da Faculdade de Arquitetura, Urbanismo e Design da UFU, Maria Eliza Alves Guerra, conta que teve sala no Chams por 11 anos, onde também leva os alunos que iniciam a Faculdade de Arquitetura para ver a cidade de cima e mostrar, além do edifício, outros marcos arquitetônicos, como a praça Tubal Vilela. “Parte do edifício foi inaugurada antes, onde ficam as Lojas Americanas, e teve um impacto muito forte na mudança no modo de consumo da cidade, onde teve a primeira escada rolante (nas Lojas Americanas). O edifício Chams é um marco urbano na cidade. Era o único naquele momento”, disse Maria Eliza.

A parte de lojas referida pela professora foi inaugurada há exatos 40 anos, em dezembro de 1978, já em parceria com o grupo varejista que até hoje ocupa o espaço. No início do funcionamento da loja, segundo o jornalista Neivaldo Honório da Silva, o Magoo, foi colocada uma máquina de cachorro quente, vendido em saquinho de papel manteiga com as iniciais L.A. impressas. Para atrair a garotada, era colocada uma travessa com um molho de pimentão, repolho e cebola que cheirava de longe. “Fazia uma fila enorme para comprar cachorro quente no fim de semana e os pobretões, igual eu, comprava e ia passear pela praça Tubal Vilela, no Cine Bristol, e voltava. Dava uma dentada a cada 3 quarteirões para o cachorro quente render bastante”, disse Magoo.
 
COLOMBIANO
Arquiteto também foi responsável pela Casa da Dinda



 
O arquiteto colombiano Cesar Barney Caldas, natural de Cali, que projetou o edifício Chams,  chegou ao Brasil em 1961 atraído pela recém inaugurada Brasília, onde trabalhou na Companhia Urbanizadora da Nova Capital do Brasil, ao lado de ninguém menos do que Oscar Niemeyer.  O recém formado estudante da Universidade de Ohio, no Estados Unidos, chegou a cargo de chefia, tendo participado, por exemplo, da construção, consultoria e reforma de várias embaixadas, como a da Colômbia, Peru, Alemanha, Canadá, Egito, entre outras.

Mas ele já tinha experiência no Brasil. Por dois anos, Cesar estagiou no Rio de Janeiro, no escritório do renomado paisagista carioca Roberto Burle Marx, que também tem relação com Uberlândia por ter sido responsável pelo projeto original da praça Sérgio Pacheco, inaugurada em 1976.
No fim dos anos 70, Cesar foi contratado para projetar o prédio ovalado e cheio de espelhos que até hoje, quase 40 anos depois, rouba a cena no Centro de Uberlândia.

Cesar se casou com Elvira Ratto de Barney, natural de Uberaba, e disse que sempre passou por Uberlândia para visitar a terra natural da esposa. Outra curiosidade é que ele também é responsável pelo projeto da famosa Casa da Dinda, onde o então presidente Fernando Collor de Melo morou entre 1990 e 1992, abdicando de viver no Palácio da Alvorada, que na época estava em reforma.

Até o momento, tem mais de 450 projetos construídos, entre edifícios de escritórios, apartamentos e casas, dentro e fora do Brasil. Hoje, com 84 anos de vida, ele ainda tem um escritório de arquitetura em Brasília e dá palestras.  “Estou cheio de planos. Tenho 84 anos, mas na verdade, quem me vê trabalhando, acha que tenho 60”, disse o arquiteto com exclusividade ao Diário de Uberlândia.
Tags »
Notícias Relacionadas »
Comentários »
Diário de Uberlândia | jornal impresso e online Publicidade 1140x90