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02/12/2018 às 09h33min - Atualizada em 02/12/2018 às 09h33min

Muito além da alimentação saudável

Produção agroecológica tenta rever métodos de cultivo, sem uso de insumos tóxicos e de forma sustentável

CAROLINA PORTILHO
Assim como os orgânicos, alimentos agroecológicos dispensam uso de defensivos, agrotóxicos e compostos químicos | Foto: Cleiton Borges/Secom/PMU
O hábito de saber a procedência dos alimentos consumidos tem se tornado mais frequente na vida das pessoas. Esse interesse não está ligado somente à qualidade do produto que vai à mesa dos brasileiros, mas engloba também saber como ele foi produzido, levando em consideração cada fase desse processo, até as condições de utilização do solo e dos trabalhadores do campo. A soma desse conjunto de fatores é o que norteia a chamada produção agroecológica, prática de agricultura que incorpora as questões sociais, políticas, culturais, ambientais, energéticas e éticas.

A proposta da agroecologia é rever os métodos convencionais de cultivo da terra em grande escala. Sua produção é totalmente isenta de insumos químicos nocivos tanto para o meio ambiente, quanto para o ser humano. “É tentar recriar métodos harmônicos utilizando técnicas semelhantes às naturais dentro dos ciclos dos nutrientes, como da água, do ar, da própria natureza. É uma produção sem qualquer insumo que tenha alguma toxicidade. Privilegiamos o uso de insumos orgânicos, de fato, que são elementos químicos que têm uma reatividade na natureza que de maneira alguma geraria algum dano, alguma degradação”, disse o biólogo agroflorestor bioconstrutor Vinício Oliveira Coeli.

Esse universo de alimentos sem agrotóxicos, sem defensivos e sem composto químico na terra também é compartilhado no mundo orgânico. A diferença entre os dois métodos é que a agroecologia propõe uma diversidade na produção - como se fosse uma floresta -, que faz com que o solo se enriqueça sozinho, protegendo os produtos das pragas e mantendo o ambiente em harmonia.

“A agroecologia é focada não só na produção de alimentos orgânicos saudáveis e sem produtos químicos, mas também em manter o meio ambiente em um sistema que seja sustentável e coerente com o crescimento da população e do mundo. Quem tem mais contato com a agroecologia acaba se apaixonando porque vê que dá certo, que tem rendimento muito bacana e que realmente cuida do meio ambiente da melhor maneira possível”, disse Natasha Marina Melo Grzybowski, secretária da Rede Brota Cerrado de Cultura e Agroecologia, rede que emite a certificação de produtos orgânicos e agroecológicos.

A etnobotânica, bióloga, herborista, terapeuta floral e educadora Shizue Tamaki, de 38 anos, cultiva plantas e flores medicinais orgânicas, área em que atua há quase 20 anos. Ela e sua filha Ágata Marinho Tamaki, 4 anos, se alimentam de produtos naturais baseados em um cardápio exclusivo com ervas medicinais para equilibrar as emoções. Baseada na frase de Hipócrates, “Que seu remédio seja seu alimento e que seu alimento seja seu remédio", Shizue está encerrando sua produção agora em dezembro para iniciar um novo ciclo em abril do próximo ano.

“Nossa produção é pequena, temos uma variedade de 37 espécies medicinais, inclusive brasileiras. Montei uma escola de botânica para crianças e como estou entregando o imóvel, vamos dar sequência ao plantio em alguma área rural. Busco por alimentos que sejam cultivamos de forma orgânica e que têm representação de vitalidade, bem-estar e felicidade. Minha empresa tem simbologia e acredito que desta forma possamos ter mais qualidade de vida. Me sinto feliz em me alimentar com produtos naturais e principalmente de pequenos produtores, pois dessa forma fortalecemos uma economia solidária e colaborativa”, disse.

VALIDAÇÃO

A garantia de que o consumidor está realmente comprando um produto agroecológico ou até mesmo orgânico é dada por meio da certificação, que permite ao produtor vender seu produto em feiras (direto para o consumidor), ou para supermercados, lojas, restaurantes, hotéis, indústrias, entre outros.

“Não é apenas olhando que se identifica um produto sem agrotóxico. A garantia que você realmente está levando para casa esse tipo de produto é a certificação, que existem em duas formas: por auditoria, que é mais cara e permite a venda dos itens a partir de terceiros, como supermercados; e a participativa que é baseada em princípios de confiança, trabalho em rede e troca de saberes. É criada uma rede de contato de produtores que se visitam para conferir se realmente a produção é orgânica”, destacou Natasha, que diz que a Rede Brota Cerrado de Cultura & Agroecologia emite a certificação do tipo participativa.

QUEM SÃO?
Perfil de produtores e consumidores é variado


O biólogo agroflorestor bioconstrutor Vinício Oliveira Coeli Vinício diz que, em Uberlândia, em grande maioria, os produtores envolvidos com o método agroecológico são assentados da Agricultura Familiar e da Reforma Agrária, mas também há instituições e empresas que promovem essa produção em escala menor. “Existem produtores rurais que não são necessariamente da Agricultura Familiar, mas são independentes. Então, existem vários tipos de produtores que atuam nessa frente, mas em grande maioria eles são assentados.”

Na contramão desse perfil de produtores está o agrônomo Guilherme Lazzarini, que há quase 10 anos se dedica à produção orgânica e agroecológica. Certificado desde 2010 para a venda dos produtos, ele diz que mesmo com os poucos investimentos e treinamentos pelos órgãos responsáveis, o interesse pela produção já é uma realidade hoje. Sua produção de hortaliças, legumes, verduras e frutas é vendida em feiras livres e entregue nos domicílios dos clientes.

“No meu caso, há três públicos consumidores desses produtos. Os que são esclarecidos sobre o tema e não questionam preço por entenderem dos benefícios não só para a saúde física, mas também para o solo. Tem ainda os que estão com câncer, por exemplo, que procuram por alimentos mais saudáveis em busca da cura da doença e, por fim, as mães que estão inserindo esse tipo de alimentação nos filhos ainda novinhos”, disse Guilherme, que para o ano que vem está otimista com a continuidade da sua produção e com a loja de orgânicos que abrirá em um novo shopping da cidade.

Em relação aos consumidores, Vinício destaca que o universo é grande e diversificado, sendo representado por uma grade parcela por pessoas interessadas em uma alimentação mais saudável. Segundo ele, não é possível moldar um perfil exato, justamente por abranger desde crianças a idosos. 

“Tem pessoas com problemas de saúde, como o câncer e doenças que exigem uma restrição alimentar maior, que optam pelos produtos agroecológicos para buscar uma cura. Além dos entusiastas por uma questão da alimentação saudável e de um desenvolvimento sustentável, porque além de tudo, o processo agroecológico busca um estabelecimento em harmonia com os processos naturais, a preservação, uma restauração, além do controle biológico que tem uma grande influência sobre a produção.”


Produção do Guilherme Lazzarini fica em um sítio situado na saída de Prata
Foto: Arquivo Pessoal

NOVO AGRO
Programa de incentivo municipal completa 1 ano


A agroecologia é um dos pilares do Programa de Desenvolvimento de Novos Negócios Rurais – Novo Agro, promovido pela Prefeitura de Uberlândia, que completou no último dia 26 um ano de atuação. De acordo com a secretaria municipal de Agropecuária, Abastecimento e Distritos, Walkiria Naves, um dos focos dessa proposta é incentivar e agregar valor à produção rural. 

Além disso, ela destaca as formas dessa produção visando a sustentabilidade do solo e, por fim, o intuído de suprir a demanda do consumidor com uma distribuição maior de alimentos naturais.

“Queremos que o produtor aumente sua produção e que essa produção seja harmônica e diversificada, sem danificar a terra. Quando falamos sobre isso com os produtores eles têm percebido essa importância e estão vendo de forma positiva esse tipo de plantio. Na natureza tudo é dinâmico, tudo volta para a terra. Quando o produtor percebe que a estrutura do seu solo começa a melhorar, ele dá valor na produção dos alimentos, que têm um sabor diferenciado”, disse.

A secretária afirmou que só neste ano foram doados aos produtores 400 metros cúbicos de massa verde e 382 metros cúbicos de palha de arroz, com o objetivo de fomentar suas atividades. “Para o próximo ano, estamos planejando mais oficinas com os produtores. Pretendemos levar esses profissionais para conhecerem experiências já funcionando em unidades demonstrativas para ensiná-los sobre o processo todo. Vamos continuar focados nessa cultura do alimento mais saudável.”


Feira voltada inteiramente para produtos agroecológicos realizada toda terça no Parque do Sabiá | Foto: Cleiton Borges/Secom/PMU
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